O impacto da estratégia “farm to fork” no mercado de fertilizantes em Portugal

De acordo com o novo Pacto Ecológico Europeu, a Comissão Europeia pretende reduzir até 2030 o uso de fertilizantes e pesticidas na agricultura. Nesse âmbito a Comissão Europeia apresentou recentemente a estratégia “farm to fork”1 que propõe as seguintes metas:

  1. conversão de 25% da superfície agrícola utilizada (SAU) para o modo de produção biológico (MPB);
  2. redução de 50% no uso de pesticidas;
  3. redução de 20% no uso de fertilizantes de síntese;
  4. redução de 50% nas perdas de nutrientes;

Na perspetiva do novo ‘Green Deal’ (Pacto Ecológico Europeu) e da estratégia ‘farm to fork’, a utilização de fertilizantes minerais de síntese deverá reduzir-se pelo menos em 20% até 2030, na UE. No entanto, segundo o Instituto Nacional de Estatística2, a utilização de fertilizantes de síntese (azotados e fosfatados) em Portugal reduziu-se nos últimos 20 anos a uma taxa 3,6 vezes superior à registada na UE, estabilizando-se durante os últimos 5 anos o padrão de consumo nacional. Portugal apresenta atualmente o menor consumo de fertilizantes de síntese por hectare de superfície agrícola utilizada (SAU) da UE27, correspondendo a menos de 50% do valor médio registado para o mesmo conjunto de Estados-Membros.

O mercado de fertilizantes em Portugal, no âmbito das novas estratégias europeias, poderá assim evoluir de forma substancialmente diferente com respeito ao que se prevê a nível europeu. Nesse sentido, a ANPIFERT – Associação Nacional de Produtores e Importadores de Fertilizantes identificou a necessidade de se projetar a sua evolução durante os próximos 10 anos e promoveu, recentemente, o desenvolvimento de um estudo estratégico executado pela AGRO.GES que procurou responder às seguintes questões:

  1. Identificação dos pressupostos para estabelecimento de cenários, de forma a garantir o cumprimento a nível nacional das determinações do ‘farm to fork’;
  2. Avaliação de cenários de evolução das áreas de diferentes tipos de culturas agrícolas durante os próximos 10 anos;
  3. Evolução das necessidades de fertilizantes com base nas necessidades médias nutritivas das culturas e projeção da evolução de áreas em Modo de Produção Biológico;
  4. Evolução dos níveis de produtividade primária esperada durante os próximos 10 anos e análise do impacto económico estimado para as principais culturas agrícolas em Portugal.
  5. Análise da manutenção da viabilidade económica das explorações tipo de cada uma das culturas selecionadas.

O estudo realizado pela AGRO.GES, que pode ser consultado na íntegra no site da ANPIFERT3, teve como base três componentes principais:

  1. Realização de uma consulta bibliográfica e consulta de material informativo disponibilizado pela Comissão Europeia, INE, IFAP, GPP (i.e., evolução das áreas em MPB na Europa e a nível nacional, por cultura e por região). Identificação das duas tipologias de fileiras/culturas agrícolas de interesse:
    1. Culturas tipo-1, considerando a forte prevalência de áreas em MPB;
    2. Culturas tipo-2, considerando a % que ocupam actualmente no mercado nacional e com base nas necessidades nutricionais médias das culturas, função da produtividade média e da área total a nível nacional;
  2. Identificação dos pressupostos para estabelecimento de cenários, de forma a garantir o cumprimento a nível nacional das determinações do ‘farm to fork’;
  3. Análise do impacto económico nas explorações agrícolas: impactos estimados para as culturas em estudo para cada um dos cenários e análise da manutenção da viabilidade económica das explorações de cada uma das culturas.

A nível nacional, foram identificadas 19 potenciais culturas de interesse (Tabela 1): quatro culturas correspondem à primeira tipologia e as restantes 15 correspondem à segunda tipologia. De acordo com a % ocupada de SAU total nacional, e considerando a importância de cada cultura no que se refere à área certificada como MPB, as culturas tipo-1 selecionadas foram as seguintes: pastagens, culturas forrageiras, olival tradicional ou de baixa-densidade (TBD) e pinhal manso para produção de pinhão. Por aplicação do mesmo conjunto de critérios e considerando a importância de cada cultura no mercado nacional de fertilizantes, as culturas tipo-2 selecionadas foram as seguintes: olival moderno, vinha para produção de vinho, tomate indústria, amendoal moderno, citrinos (laranja), milho (de grão e forrageiro), arroz, cereais praganosos de outono inverno (trigo, aveia, cevada), batata, couve (i.e., couve-brócolo e couve-repolho), pêra-rocha e maçã. A seleção das distintas tipologias de interesse procurou representar todas as regiões agrícolas portuguesas que apresentam importância no contexto do mercado de fertilizantes nacional4.

2 INE. (2021). Estatísticas Agrícolas 2020: A agricultura nacional no contexto do Green Deal: menos fertilizantes minerais, mas mais pesticidas face à média da UE – 2020. Instituto Nacional de Estatística – informação à comunicação social. 22 julho 2021

3 http://anpifert.pt/

4 A Região Autónoma da Madeira não foi considerada pois apresenta um nível de consumo de fertilizantes inferior a 1% do valor total nacional.

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Tomás Roquette Tenreiro
ENG.º AGRÓNOMO, INVESTIGADOR NO IAS-CSIC E CONSULTOR INDEPENDENTE INTEGRADO NA EQUIPA AGROGES/ANPIFERT

Gonçalo Vale
ENG.º AGRÓNOMO E COLABORADOR TÉCNICO AGROGES

Miguel Vieira Lopes
ENG.º AGRÓNOMO E COLABORADOR TÉCNICO AGROGES

O artigo foi publicado originalmente em AGRO.GES.


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