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Programa Promove 2022 financia novos bioprodutos da floresta

Duas dezenas de projetos e nove ideias inovadoras foram distinguidas, em 2022, pelo Programa Promove. Cerca de metade estão relacionados com a valorização de recursos e resíduos naturais (florestais e agroflorestais) em novos bioprodutos, assim como com a prevenção de riscos, incluindo os que advêm dos efeitos das alterações climáticas.

O Programa Promove apoiou, com 3,6 milhões de euros, um conjunto de 29 iniciativas de estudantes, academia, empresas e organizações sem fins lucrativos que querem contribuir para o desenvolvimento sustentável do interior de Portugal.

Lançado em 2018, este programa é promovido pela Fundação “la Caixa”, em colaboração com o BPI e em parceria com a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). Em 2022, distinguiu três tipos de iniciativas: “Projetos de inovação e desenvolvimento mobilizadores” vindos de instituições de investigação de referência; “Projetos-piloto inovadores” nascidos pela mão da academia, empresas e entidades sem fins lucrativos e “Ideias com potencial” propostas por estudantes e investigadores no âmbito de mestrados ou doutoramentos.

Nestas três tipologias premeiam-se projetos e ideias em domínios estratégicos como a redução de riscos biológicos e a promoção/valorização de novas culturas e produtos naturais. Estas duas temáticas tiveram grande representatividade entre os projetos financiados em 2022, muitos dos quais centrados em desenvolver novas soluções de proteção e novas aplicações de matérias-primas naturais com origem nas florestas, sistemas agroflorestais e matos portugueses.

Projetos e ideias para a conservação, prevenção e resiliência

Entre os projetos e ideias que se destinam a proteger e promover a resiliência de recursos naturais, salientam-se, por exemplo, as “Seedballs”, uma “Ideia com potencial” desenvolvida na Universidade de Évora, no âmbito dos doutoramentos de Erika Almeida e Cristina Baião e do mestrado de João Marques.

As “Seedballs” propostas são esferas que juntam argila, sementes e compostos orgânicos e a ideia é que sejam utilizadas para sementeira de espécies florestais e agroflorestais portuguesas. As sementes em causa têm proveniência assegurada, ou seja, estão bem-adaptadas ao solo, clima e relevo das regiões onde serão depositadas – neste caso, à região do Alentejo –, assegurando a identidade genética das espécies.

O seu formato torna mais fácil usar estas sementes em ações de florestação e reflorestação, em particular em zonas de mais difícil acesso, onde as máquinas florestais não chegam. Ao mesmo tempo, a esfera protege a semente de predadores e condições desfavoráveis à germinação, salienta Erika Almeida, que coordena o projeto, sublinhando que estas condições se tornam mais críticas face aos efeitos das alterações climáticas.

Com o atual financiamento do Programa Promove, a equipa de investigadores quer concretizar a ideia, o que implica a produção destas esferas em quantidades capazes de dar resposta à procura que tem vindo a crescer com as também crescentes preocupações com a conservação e restauro de habitats, e a multiplicação de iniciativas de florestação e reflorestação. O modelo poderá ser ampliado a mais sementes e espécies adaptadas a novas regiões do país, mas os desafios inerentes ao aumento da escala produtiva e comercialização destas “esferas de sementes” necessitará de mais investimento e do envolvimento de parceiros de negócio.

Vários outros projetos foram distinguidos em temáticas que, embora diferentes da anterior, procuram também a conservação, prevenção de riscos e resiliência das florestas e dos recursos com elas relacionados:

  • CC&Nuts: o “projeto de I&D mobilizador” é promovido pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto – Centro de investigação GreenUPorto e foca-se no desenvolvimento de estratégias que aumentem a tolerância do castanheiro às alterações climáticas. Serão selecionadas e desenvolvidas variedades de castanheiro mais resilientes, com resultados relevantes em termos biológicos e também comercial (no que respeita às castanhas). Dirige-se ao município de Bragança.
  • OleaPrime: este “projeto-piloto inovador” quer proteger e valorizar oliveiras centenárias, criando uma rede de produtores e um olival de genótipos a partir destas velhas árvores, avaliando o seu comportamento face às alterações climáticas. A atração turística é outra das vertentes deste projeto promovido pela Trás-os-Montes Prime que será implementado no concelho de Mirandela.
  • MeliSafe: proteger ativamente as colmeias das abelhas-europeias (Apis mellifera) dos ataques da Vespa velutina (vespa-asiática) é o objetivo deste “projeto-piloto inovador”, que vai recorrer a métodos e sistemas não invasivos (sensores e sistemas dissuasores, entre outros) para afastar as vespas das colmeias na zona de Castelo Branco.
  • ForestVISION: o projeto “projeto-piloto inovador” proposto pela empresa Estrela Sustentável tem por objetivo desenvolver uma plataforma online, com recurso à inteligência artificial, para monitorização, medição, análise e avaliação inteligente de grandes manchas florestais. O objetivo é apoiar o alerta precoce, o acompanhamento, o planeamento e a gestão sustentável da floresta ibérica.

Programa promove novas bioaplicações de materiais vegetais

Mais representativos entre os projetos e ideias apoiados são aqueles que procuram desenvolver novas aplicações e produtos com base em materiais vegetais, desde cardos a bolotas, muitos deles endógenos das regiões interiores que se pretendem dinamizar.

O Pharmastar é um deles. Trata-se de um “projeto de I&D mobilizador” que se propõe desenvolver, a partir de matérias-primas naturais endógenas do Parque Nacional da Serra Estrela (PNSE), novas formulações farmacêuticas, suplementação alimentar e sistemas inovadores de entrega de fármacos para prevenir e tratar a diabetes.

“A diversidade botânica do PNSE ainda está pouco estudada”, afirma o investigador responsável pelo projeto, do Instituto Politécnico da Guarda, Luís da Silva, sendo este “um ecossistema natural rico em compostos bioativos com elevado potencial antidiabético”.

Desse ecossistema destacam-se as bolotas do carvalho, do sobreiro e da azinheira e o própolis (substância produzida pelas abelhas e que reveste os favos) como alguns exemplos de matérias-primas cujos princípios bioativos apresentam potencial antidiabético.

Depois do mapeamento e recolha das plantas terão início os ensaios, analisando os compostos bioativos das plantas para identificar os que apresentem maior potencial antidiabético. Após esta etapa, serão desenvolvidas as fórmulas sólidas. Por fim, decorrem os ensaios: além de ensaios in silico, isto é, através de simulação em computador, também será feita a avaliação em humanos, com a colaboração da Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal (APDP), que comprovarão a viabilidade das formulações criadas.

Este projeto nasce do Centro de Potencial e Inovação de Recursos Naturais (CPIRN) do Instituto Politécnico da Guarda e foi proposto ao programa Promove pelo parceiro Centro de Recursos Naturais e Ambiente (CERENA), do Instituto Superior Técnico (IST). O projeto Pharmastar envolve também a colaboração do iMed – Research Institute for Medicines da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa (FFUL).

Além deste projeto, outros partem igualmente do potencial dos recursos naturais do país para encontrar soluções para questões em áreas que vão da saúde à indústria têxtil, passando pela alimentar:

  • Plants4Aging: centra-se na criação de um produto baseado em plantas aromáticas e medicinais que contribua para mitigar o envelhecimento cardiovascular. O “projeto de I&D mobilizador” é do Center for Innovative Biomedicine and Biotechnology (CIBB), da Universidade de Coimbra, e dirige-se à região de Castelo Branco.
  • ChestFilm: quer valorizar os resíduos sólidos do processamento das castanhas, através do respetivo fracionamento e caracterização de compostos, para extração de biopolímeros e preparação de películas biodegradáveis. O “projeto de I&D mobilizador” é do Laboratório Associado para a Química Verde – Tecnologias e Processos Limpos (LAQV-REQUIMTE) e dirige-se ao município de Bragança.
  • TRAMONTE: quer desenvolver novas soluções para nutrição animal, assim como fitofármacos e agrofármacos verdes, a partir da espécie Sorbus aucuparia, mais conhecida como tramazeira e abundante na região transmontana. Este é um “projeto de I&D mobilizador” do Instituto Superior Técnico – Instituto de Bioengenharia e Biociências (IBB) que quer beneficiar o município de Bragança.
  • Forest2Fabric – o “projeto-piloto inovador” quer valorizar a bolota como agente antimicrobiano de aplicação na indústria têxtil, apoiando a sustentabilidade florestal e a dinâmica económica da região de Trás-os-Montes. A proposta é da Célula Peculiar.
  • Nature4Food: a “ideia com potencial” nasceu pela mão de investigadores do Instituto Politécnico de Bragança e passa pela avaliação de extratos de plantas locais para aplicação em produtos alimentares, como corantes e conservantes naturais e funcionais.
  • DIAMA – também no âmbito de projetos de investigação de alunos do Instituto Politécnico de Bragança está a ser prosseguida a “ideia com potencial” de valorizar diferentes partes da exótica amaranto (um cereal sem glúten) como ingredientes para incorporação em novos produtos alimentares naturais.
  • SweetProBeira: alunos da Universidade da Beira Interior tiveram a “ideia com potencial” de desenvolver um novo protetor solar de base natural a partir de resíduos de várias culturas comuns nas Beiras e Serra da Estrela, como a cereja, a amêndoa e a azeitona.
  • CYN.BIO-SE: a utilização das flores dos cardos como coagulantes na produção de queijos e o aproveitamento do caule destas plantas para a produção de papel e cartão são duas faces da “ideia com potencial” proposta por estudantes da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro.

Tecnologias avançadas são transversais a múltiplos projetos e ideias

A grande maioria dos projetos financiados pelo Programa Promove 2022 vai munir-se de conhecimentos e tecnologias avançados, desde a genética à inteligência artificial. A digitalização está igualmente presente quando o objetivo é a decisão informada ou a valorização de recursos, mesmo quando as soluções se dirigem a zonas remotas, que ainda vivem sem internet.

O projeto Montanha Viva é disso exemplo. Promovido pelo Centre for Mechanical Aerospace Science and Technologies, da Universidade da Beira Interior, propõe-se desenvolver um sistema de apoio à decisão para apoiar a exploração económica de plantas silvestres de montanha. O propósito é fazê-lo em zonas que ainda não têm ligação à internet e estão, por isso, menos apoiadas por soluções que permitam a decisão informada e em tempo real. O objetivo é contribuir para melhor conciliar sustentabilidade económica e ecológica, neste caso em zonas remotas do Centro do país.

Numa outra perspetiva, a de criar escala para a valorização da bolota, a LandraTech está a desenvolver um mercado digital para interligar os diferentes elos da cadeia de valor, ligando produção, transformação e potenciais compradores. A empresa, que já atua na comercialização desta semente e seus derivados e subprodutos, procura com este Marketplace apoiar a dinâmica e valor de um produto com vasta tradição e novo potencial.

Para conhecer todos os projetos apoiados em 2022, consulte aqui a página do Programa Promove.

O artigo foi publicado originalmente em Florestas.pt.


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