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Ex-gestor florestal defende “tropa especializada” para combater incêndios

O engenheiro Rui Gonçalves, demitido pelo Governo da presidência da empresa pública de gestão florestal FlorestGal em outubro, defendeu hoje, no parlamento, a criação de uma “tropa especializada para defender a floresta contra os incêndios”.

Ouvido esta tarde pela Comissão parlamentar de Agricultura e Pescas, a requerimento do PSD, o presidente do conselho de administração da FlorestGal entre agosto de 2021 e outubro de 2022 defende que há que “saber separar” a proteção de pessoas e casas e a defesa da floresta em si mesma.

“Gastámos milhões de euros todos os anos a defender o edificado e não a floresta”, apontou, pedindo à Assembleia da República para “ajudar a resolver a questão”.

Reconhecendo que “ainda é preciso fazer muita coisa na floresta portuguesa”, o ex-gestor respondeu às perguntas dos deputados sobre o conteúdo de um artigo de opinião acerca do incêndio que afetou a serra da Estrela em agosto (afetando 25% do Parque Natural), sublinhando que aquilo que quis dizer é que “a prevenção estrutural não foi eficazmente utilizada no combate ao incêndio”.

Na opinião do engenheiro, deve continuar-se a investir na prevenção estrutural, mas assegurando que seja “bem aproveitada”.

O Ministério do Ambiente não justificou a demissão de Rui Gonçalves, em 12 de outubro, nomeadamente se esta se deveu ao artigo de opinião publicado no jornal Público no final de setembro.

No artigo, Rui Gonçalves teceu várias críticas ao sistema, apontando para a “inutilidade” que a prevenção estrutural assumiu nesse fogo e para problemas de descoordenação no combate ao incêndio, com “demasiados agentes” no terreno.

“As políticas públicas que existem neste momento para o desenvolvimento da floresta são corretas, o meu desconforto é com a execução atempada dessas políticas”, explicitou no parlamento.

O que mais lhe “doeu” no incêndio na serra da Estrela foi ver que “aquilo que é aprovado não é executado”, situação que o fez recorrer ao termo “irresponsabilidade organizada”, que disse ser um recado para todos e para ninguém em particular.

“Houve descoordenação no terreno. É preciso evitar que volte a acontecer”, sublinhou o segundo presidente da FlorestGal, criada em 2018, na sequência dos dramáticos incêndios de 2017 em Pedrógão Grande.

“Temos todos os planos, todas as leis, todos os relatórios… Não é um problema deste Governo ou do anterior, é a dificuldade que as leis têm de passar dos corredores da Assembleia para o terreno”, assinalou.

“Não podemos continuar a fazer o que sempre se fez quando o que sempre se fez não é o mais adequado”, notou. “Temos dos melhores engenheiros florestais do mundo”, salientou, descartando a necessidade de mandar vir especialistas do estrangeiro.

“Temos de ultrapassar certos atavismos, certos poderes instalados, certas coisas que não se mexem”, considera.

Assumindo “descontentamento e tristeza”, Rui Gonçalves apelou à Assembleia da República para que recupere o Observatório Técnico Independente que “deixou extinguir”.

Questionado pelos deputados sobre a sua demissão, Rui Gonçalves disse: “Saí porque o senhor ministro do Ambiente [Duarte Cordeiro] achou que eu não devia continuar”.

Recordando que é “um servidor público”, o ex-gestor acrescentou: “Também só o fiz [sair], porque a lei o prescreve, mas acho que a lei está errada”.

E, perante os deputados, leu o Estatuto do Gestor Público sobre as razões que justificam uma demissão, não tidas em conta devido a um artigo que admite ser-se “livremente demitido” por “mera conveniência”.

“Isto não me prejudica a mim, prejudica a gestão pública de uma forma geral, porque os gestores públicos não têm estabilidade nas suas funções”, criticou, convidando o parlamento a debruçar-se sobre esta questão, que “é importante para o desenvolvimento do país”.

As empresas públicas precisam de “estabilidade e previsibilidade” e a ausência destas explica “por que é que às vezes é difícil encontrar gestores públicos”, assinalou.


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