A domesticação das videiras selvagens, que não davam as uvas de mesa ou de vinho que agora temos, terá ocorrido, ao mesmo tempo, em dois locais distintos do planeta – uma surpresa para os cientistas.
A história do vinho começa com a uva – até aqui é simples. Mas até chegarmos ao vinho há uma série de interrogações sobre o percurso das uvas, ou melhor, das videiras que lhes dão origem. Até agora, a ideia é que estas videiras, para passarem do estado selvagem ao cultivo pelos humanos, teriam sido domesticadas na região da Arménia, Azerbaijão e Geórgia (no Cáucaso, Europa Oriental). A trama é mais complexa do que isso. Além da região do Cáucaso, afinal há ainda um outro centro de domesticação na zona do Iraque, Jordânia ou Síria (no Sudoeste Asiático).
Estas duas regiões distam entre si mais de mil quilómetros, o equivalente a ir e vir do Minho ao Algarve. E apesar disso, os dois momentos de domesticação parecem estar sintonizados, ocorrendo em simultâneo há cerca de 11 mil anos, como escreve na revista Science uma equipa internacional de mais de 80 cientistas, na qual se incluem dois portugueses.
Para construir este retrato histórico das videiras, esta equipa utilizou a sequenciação genómica para olhar para o ADN das videiras. De Portugal, saíram 180 das mais de 3500 variedades de videiras cultivadas e selvagens que compuseram este retrato, explica Jorge Cunha, cientista do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV) que participou neste estudo. Além de Jorge Cunha, de Portugal participou José Eiras Dias, também do INIAV.
A história não fica por aqui. Esta separação entre as duas regiões onde viriam a ser domesticadas as videiras silvestres será consequência do último período glacial (ou Idade do Gelo), que começou há cerca de cem mil anos e motivou o cultivo destas plantas em dois locais diferentes. Combinada com a incorporação da agricultura no trabalho dos humanos, a domesticação das videiras silvestres terá ocorrido há 11 mil anos em duas regiões: o Cáucaso e o Sudoeste Asiático. Alguns estudos anteriores colocavam a domesticação das videiras num período mais tardio, há cerca de sete mil anos.
Uvas chegaram à Península Ibérica com a agricultura
E, depois, há o período de expansão. As videiras já domesticadas, transportadas em estacas […]