Vinhos: acreditar na calmaria do Alentejo, e naqueles que também precisam de descanso – João Paulo Martins

João Paulo Martins revela semanalmente o melhor do mundo dos vinhos

Creio que existe na tertúlia de enófilos a ideia generalizada de que os vinhos do Alentejo devem ser bebidos novos. As razões que se aduzem são de tipo variado e começam logo pelo facto de a região ser uma zona tendencialmente muito quente, com calores abrasadores no verão. Desses calores temos duas consequências mais ou menos inevitáveis: a subida dos açúcares nos bagos por via desse calor leva depois a vinhos mais alcoólicos e o calor estival faz diminuir a acidez e a consequente frescura dos mostos, obrigando os técnicos a corrigir a acidez para que o resultado final seja equilibrado. Este quadro, esquemático e algo simplista, teve a sua razão de ser e o seu tempo. Até aos anos 80 as adegas cooperativas eram praticamente os únicos operadores, e os sócios tendiam a vindimar uvas brancas e tintas em simultâneo. As brancas, vindimadas mais tarde do que deviam, geravam vinhos algo pesados, com fruta demasiado madura e alcoólicos; os tintos, até pelo peso do álcool, eram vinhos gordos, muito macios e ao gosto de muitos consumidores.

Muita da fama dos vinhos tintos alentejanos vem desse lado cheio e envolvente que depois se ligava muito bem com a gastronomia local. O surgimento de novas regiões na moda, como Douro, o Dão ou mesmo Bairrada e Lisboa, nunca ofuscou esse apreço do consumidor — que se mantém até hoje — pelos vinhos da planície. A verdade é que atualmente o modus operandi se alterou substancialmente e a primeira grande inovação foi a separação das vindimas. As uvas brancas passaram a ser vindimadas muito mais cedo, quando as uvas apresentam menos potencial alcoólico e mais acidez. O resultado foi o esperado: vinhos mais frescos, com muito maior expressão de fruta, menos peso e maior elegância. […]

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