agricultura biológica

“A agricultura biológica é uma cultura de escritório”. David e Anna querem mudar o Alentejo (e o mundo) com um novo modelo: o regenerativo

No Alandroal, no Alentejo, há um casal a desenvolver uma modelo de agricultura diferente, um “regresso às origens”, que ao mesmo tempo que procura contrariar a erosão dos solos, tenta contrariar a desertificação em territórios cada vez mais entregues a si próprios: a agricultura regenerativa.

Eles conheceram-se por “acaso” em Lisboa, mas foi em Berlim que assentaram as suas vidas. Anna de Brito geria uma aplicação que permitia aos restaurantes de topo ocupar as mesas com reservas canceladas em cima da hora. David dividia-se entre múltiplos projetos de consultoria que o obrigavam a fazer mais de 120 voos por ano. Até que decidiu sentir terra firme.

O casal voltou a Portugal, visitou terrenos à venda de norte a sul, até que a freguesia de Rosário, no Alandroal, não os deixou sair mais. Mais de 560 hectares de campos. E uma vista privilegiada para o Alqueva, com Espanha do outro lado da água. Em 2018 começavam a aventura de uma vida.

Começaram um projeto de agricultura regenerativa a que chamaram Terramay com o apoio do sócio suíço (e amigo) Thomas Sterchi. Uma quinta que produz legumes sazonais na sua horta biológica, carne de bovino e de porco preto nas vastas pastagens, assim como ovos, mel, compotas ou azeite, vendidos a restaurantes ou a famílias em cabazes. Recentemente inauguraram um restaurante próprio que convida a desfrutar da paisagem. E tencionam ainda abrir um projeto hoteleiro para inspirar outros para este modelo de produção.

Mas, afinal, em que consiste a agricultura regenerativa? “Tentamos trabalhar a terra de forma a que ela se consiga regenerar”. O conceito, apesar de não ser novo, recuando à década de 1980, gera curiosidade. Uma das principais ideias é de que o solo não saia estragado depois de dar ao homem o alimento de que ele precisa. E há muitas formas de conseguir o objetivo: rotação de culturas, partilha do mesmo terreno por diferentes culturas, pastagem de gado num sistema rotativo assim como a não utilização de arados ou outras máquinas que contribuam para a erosão do solo. Sempre sem a presença de organismos geneticamente modificados no cultivo e na alimentação dos animais.

“Entendo a agricultura regenerativa no sentido de que ela tem o papel de regenerar ou melhorar os ecossistemas. Tem de melhorar a qualidade dos solos, a biodiversidade e tem também uma componente social e económica. É uma agricultura que tem um impacto positivo. Em Portugal, é algo que está a iniciar. É um processo que os agricultores estão a procurar cada vez mais”, explica à CNN Portugal Denis Kern Hickel, consultor na área da agricultura e fundador do projeto Hortas da Rainha, em Torres Novas, assente também no modelo regenerativo.

Agricultura biológica vs regenerativa
Quem se cruza com a história da família De Brito, tem quase sempre uma pergunta para fazer: o que distingue a agricultura regenerativa da agricultura biológica, que ganhou adeptos ao longo dos últimos anos, preocupados com o sabor e a qualidade dos produtos? A resposta parece ser uma: burocracia.

“A agricultura biológica é uma agricultura de escritório, que cumpre as regras impostas pela União Europeia e que, muitas vezes, é usada pelos produtores para valorizar os seus produtos, podendo estes continuar a ser monoculturas ou nocivos para a saúde humana, dos solos e dos aquíferos”, argumenta David de Brito, lembrando as críticas cada vez mais comuns a este modelo de produção. Na agricultura regenerativa procura-se outra coisa: “dar mais à terra do que se tira”. Como? Com a introdução de uma “policultura animal e vegetal”, que procura recriar os padrões da natureza, combater a desertificação e contribuir para a neutralidade carbónica.

“A agricultura biológica está enterrada nos seus processos burocráticos. A produção biológica é cada vez mais frustrante. Até posso deixar de usar processos químicos, mas os processos agrícolas podem continuar a ser os da agricultura convencional. Sem rotação de culturas, por exemplo. A legislação da agricultura biológica tem que ver sobretudo com a questão dos químicos. Não vai olhar para a minha terra para ver se estou a fazer lavouras contínuas ou uma correta rotação de culturas”, reforça Denis Kern Hickel.

Trata-se de respeitar o ritmo da terra, para melhorar os solos, sem esquecer o uso eficiente da água, imprescindível na agricultura. Para que a terra, quando estiver pronta, volte a dar alimento. Toda a produção é sazonal. Transformam-se depois alguns produtos em compotas ou conservas, por exemplo, para os restantes meses do ano em que eles não crescem. O casal De Brito não tem dúvidas: “é um regressar às origens”.

Soluções naturais
Cada terra é diferente. Cada uma tem a sua textura, os seus humores, o seu tempo. Uma cenoura, por exemplo, cresce melhor num solo mais arenoso. É preciso avaliar como está o solo antes de plantar seja o que for. Tudo é pensado, planeado. Mesmo que a terra esteja habituada a partilhar diferentes culturas. Mesmo que os resultados dessa partilha possam ser imprevisíveis.

“Há […]

Veja a reportagem em CNN Portugal.


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