Mais habitação, sim, mas não a qualquer custo. É essa a mensagem que passa no manifesto “Em defesa da Reserva Agrícola Nacional [RAN] e da Reserva Ecológica Nacional [REN]”, assinada por dez associações, que “repudiam as intenções do Governo de facilitar a edificação em RAN”.
Os signatários, que incluem as maiores organizações não governamentais de Ambiente em Portugal, dizem estar unidos “em apoio à habitação pública em zonas urbanas consolidadas, à reabilitação de imóveis devolutos e à reconversão de edifícios de escritórios também desocupados, para habitação a custos controlados”, apoiando, em simultâneo, “a defesa e preservação dos solos de RAN e REN”, “contra uma agenda de promotores imobiliários e de negócios em torno de mais construção”.
O manifesto lembra que “tanto a Habitação como o Ambiente e qualidade de vida são direitos consagrados na Constituição”, critica os “discursos de autarcas que procuram criar uma falsa dicotomia entre o direito à habitação digna e o direito a um ambiente sadio” e contesta “que a crise da habitação se resolva com a desafetação de solos de RAN, tendo em conta que apenas 4% do território nacional é ocupado por solos muito férteis”.
À VISÃO, Carla Castelo, presidente da Associação Evoluir Oeiras, de quem partiu a iniciativa, explica que o manifesto é a resposta a “uma campanha do presidente da Câmara de Oeiras para desafetação da RAN”. “Isaltino Morais diz que não é possível resolver a crise da habitação sem os terrenos da RAN. E depois de tanta campanha nos órgãos de comunicação parece ter convencido o Governo, que agora já propõe a facilitação de construção em terrenos de RAN.”
Carla Castelo, também vereadora da câmara de Oeiras, aponta as mudanças ao programa do Governo “Mais Habitação”, noticiadas pelo Expresso na semana passada, que alteram a Lei de Bases de Uso do Solo, permitindo aos municípios classificarem terrenos RAN como urbanizáveis.
Em março, Isaltino defendeu, no 45º congresso da Associação Internacional para o Desenvolvimento Urbano, uma alteração “radical” à lei, de modo a permitir desafetar áreas de RAN, apontando o preço dos terrenos como “maior fator de encarecimento das casas”.
“Não são os instrumentos de gestão do território que estão a inflacionar o preço das casas”, garante Carla Castelo. “É um problema de empolamento dos preços, que não se resolve à custa da destruição dos solos. É fundamental esta reserva de solos agrícolas para termos segurança alimentar e uma série de serviços que os ecossistemas nos prestam. Não só em Oeiras, mas em todo o País, agora que outros municípios já equacionam desafetar RAN para construir habitação. Não podemos continuar a expandir áreas urbanas para zonas sensíveis a pretexto de não haver terrenos para construir. Há muitos terrenos urbanos e imóveis que podem ser usados para habitação. Queremos habitação pública, mas em zonas urbanas consolidadas.”
A presidente da associação diz estar “apreensiva com a possibilidade de o governo abrir esta porta”, sublinhando a especulação e a corrupção que pode gerar. “Quem é dono de um terreno rústico que passa a urbano fica, de um momento para o outro, milionário.”
O manifesto é assinado pela Associação Evoluir Oeiras, ANP|WWF, Zero, Geota, LPN, Quercus, SPEA, FAPAS, Campo Aberto e SOS Quinta dos Ingleses. As associações pretendem avançar, ainda, com uma petição contra a desafetação de RAN e REN.
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