Por estes dias assistia ao jornal da noite, que no verão se limita a dar os incêndios e as urgências que fecharam, e ouço que a tragédia do incendio na serra da estrela libertou energia equivalente a 25 bombas atómicas. Tinha o referido incendio quando ainda ia só nos 14 mil hectares, já vai em 25 mil a hora que escrevo isto, libertado qualquer coisa como 766 terajoules de energia, sendo uma bomba atómica liberta, fiquei a saber, cerca de 30.
Não tenho noção do que representa isto em termos de libertação de gases de efeito de estufa, mas suponho que seja bastante. Tudo isto se resolvia, em grande parte, com ocupação do território, limpeza das florestas e pastoreio. Há uma razão para o Alentejo não arder, as terras estão, na sua grande maioria, trabalhadas e exploradas. Contra a vontade de certas franjas da população e perante uma tutela que até a data ainda não deu um cêntimo para fazermos face ao brutal aumento de custos e a maior seca dos últimos 50 anos. Mesmo assim o agricultor alentejano insiste e cria gado, explora o montado, limpa matos, poda as arvores, semeia cereais e fenos e teima em trazer bem cuidado um território onde não há água nem soluções para o resolver, onde a autoridade praticamente desapareceu e os montes estão a saque, onde fecham hospitais, escolas, centros de saúde, correios, bancos, serviços, etc.
O que esperamos é ser respeitados. Nada mais. Honestidade intelectual quando somos acusados de sermos os causadores do aquecimento global quando esses perigosos poluidores impedem que ardam dezenas de milhares hectares ano. Atacar as culturas permanentes que trouxeram prosperidade e um desenvolvimento económico à região nunca antes visto, ao mesmo tempo que se come bifes de soja que tem de atravessar meio mundo para chegar a Portugal, produzida em latitudes em que as normas em termos de produtos passiveis de serem utilizados deixam muito a desejar. Vivemos numa época em que os “sound bytes” das redes sociais transformam toda a gente em especialista. No que quer que seja. Temos depois de ser atacados e ofendidos por estes doutores das redes que insistem que o sistema agrosilvopastoril mediterrâneo que existe há mais de mil de anos está a destruir o planeta. O tofu produzido na outra ponta do planeta com recurso a toda a espécie de pesticidas e herbicidas e com uma enorme pegada de carbono para cá chegar está a salvá-lo.
Não há sistemas perfeitos nem soluções milagrosas. Entre esconder a cabeça na areia e dizer que está tudo bem e culpar cada vitelo que nasce pelas alterações climáticas há todo um oceano de soluções e de possibilidades a explorar que podem e devem ser implementadas. Mas para isso temos de criar na sociedade condições o que se adivinha cada vez mais difícil. Como em todas as discussões ouvem-se mais os que gritam mais alto e radicalizam mais o discurso sem nunca apresentar opções. Quem propõem soluções equilibradas e viáveis não tem palco nem interessa ouvir. No mundo em que vivemos tudo serve de arma de arremesso e tudo se mede em “likes “nas redes sociais e em estudos de opinião. As soluções ficam na gaveta porque não dão votos custam dinheiro e não produzem retorno no tempo em que tudo se mede em politica: os 4 anos de uma legislatura. Não temos uma visão a longo prazo, não a queremos ter e quando alguém tenta implementar uma os senhores que se seguem tratam de a desmontar. Quando ouvimos uma governante dizer na televisão que a época de incêndios até está a correr bem porque só ardeu 70% da área que o algoritmo (saberá ela como se constrói um algoritmo?) previu a esperança de se resolver o que quer que seja desaparece.
Não estamos a fazer um favor a ninguém, tirando a nós próprios. Adiamos a resolução do problema porque é difícil e não vamos tirar dividendos empurrando a procura de soluções para a próxima geração. Estamos a ser cobardes e vamos ser acusados disso. A história vai-se encarregar de fazer essa justiça, mas o problema da justiça histórica é que vem sempre tarde demais.
Diogo Costa Freitas Pestana de Vasconcelos
Agricultor