“Enquanto andarmos a falar de fogos e combustíveis e necessidades de gestão com utopias de rendimento e não pensarmos na questão da água e da erosão e da criação de solo, promovendo uma floresta de baixa exigência, continuamos nisto. Sempre com putativos lucros privados e “nacionalização” dos custos e dos prejuízos, directos e difusos, como gostam os apóstolos do profeta Friedman ..
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“nacionalizados”são os custos e prejuízos, os custos de combate a incêndios, por exemplo.
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na equação os putativos, prometidos, lucros são privados e, nessa equação, não entram os custos e riscos gerais. Não entram os custos com o combate a incêndios, não entram os custos com a diminuição da recarga de aquíferos, etc, etc. Esses são suportados pela sociedade. O ponto é que não há sustentabilidade sem inserir essas questões na equação e sem regulamentar devidamente. Pagando, por exemplo, a quem implemente uma floresta com menores riscos e mais capaz de promover a recarga de aquíferos, a formação de solo, a manutenção de humidade. Uma floresta que não seja tão exigente em manutenção e vigilância, o que até diminui os custos de exploração.
Ou então não, e continuamos a fazer mais do mesmo à espera que os resultados sejam diferentes …
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O neo-liberalismo econômico é muito lindo porque tem sempre a sociedade através do estado a limpar os estragos que faz … A área máxima de monocultura de eucalipto sustentável, a meu ver, é bem menor do que aquela que existe.”
As citações são comentários a um post fofinho sobre eucaliptos e a necessidade de equilibrar todos os interesses em presença.
Não são de uma pessoa que nunca ouviu falar do assunto, são de uma pessoa com décadas de experiência em conservação da natureza, e anos de dirigente da administração pública nesse domínio.
O que me interessa aqui não é a constatação da quantidade de afirmações sem qualquer base factual ou científica, o que me interessa aqui é a repetição da ideia de que fazer gestão com retorno é inegavelmente uma utopia, mas enunciar amanhãs que cantam, pagando a quem faz o que se pretende, sem explicar como se lá chega, com que instrumentos, não é uma utopia, é uma evidência.
Já agora, com que gestão ou ausência dela, se chega onde se quer? E por que razão se critica a situação actual, como filha do liberalismo económico, quando se está a falar de um sector pesadamente regulamentado como um todo e, sobretudo, pesadamente regulamentado no que diz respeito à produção de eucalipto?
Ninguém consegue explicar como este discurso mágico penetra tão fácil e profundamente nas elites do país, apesar das evidências que o contrariam, sistematicamente atiradas para o caixote do lixo pela mais difundidas das teorias de conspiração: “os interesses económicos controlam isto tudo, eles é que nos têm na mão, apesar dos governantes serem escolhidos por nós”.
O artigo foi publicado originalmente em Corta-fitas.