Setor agrícola lança a semente da digitalização e abraça conceitos como “agricultura de precisão”, com drones em ação e uma revolução nos campos à espera do 5G.
Lá para meados de setembro, quando faltar mês e meio para o início da apanha da azeitona, José Maria Falcão vai entrar no olival com o determinador automático do rendimento de azeite. É um aparelho que reúne amostras de várias árvores e variedades de azeitona, habilitado a determinar quando é que cada parcela atinge a produtividade máxima.
“Esta ferramenta mede o teor de gordura da azeitona, permite-nos ver a curva de elaboração de azeite e quando está na máxima produtividade pode ser apanhada. Evitamos que a azeitona fique tempo desnecessário na árvore”, descreve o empresário, detentor de 500 hectares de terra, onde produz olival, amendoal e romeiral, no concelho de Monforte.
O determinador do rendimento de azeite é apenas um exemplo da aposta na “agricultura inteligente” que por aqui tem conquistado o seu espaço, à boleia da tecnologia que tem caminhado de braço dado com a chamada “agricultura de precisão” na herdade da Torre das Figueiras.
“Se queremos ser eficientes, temos de aproveitar estas ferramentas”, sustenta José Maria Falcão, que há vários anos assumiu a transformação digital da agricultura como um passo incontornável para o aumento das necessidades de produção face à pressão gerada pelo crescimento económico e populacional no mundo.
Na Torre das Figueiras a necessidade de ser “eficiente” ganha maior expressão perante a falta de água que por aqui marca as décadas, enquanto se espera pela barragem do Pisão (Crato), incluída no plano de rega do Alentejo, elaborado em 1957, mas que ainda não passou do papel.
“Aprendi muito cedo a poupar água, ainda com o meu pai”, relata, mostrando como aos dias de hoje gere recursos hídricos no campo à base de sondas de medição da humidade, que permitem saber onde está a pôr a água e a que profundidade. “Tudo rigoroso para que nada se perca, garantindo aproveitamento para as plantas”, diz, apontando as “muitas vezes” que junta adubo à água, junto às raízes. “Se pomos mais para baixo, a planta já o não usa.”
Também a medição do potencial com que a água está ser retida na folha das oliveiras, amendoeiras e romeiras passou a ser tarefa prioritária por aqui. É o método mais eficaz para aferir se as árvores estão em conforto ou em stress. “É importante saber até que ponto posso ir com esse stress sem diminuir a produção”, diz, alertando para a importância do dendrómetro, que mede a oscilação do tronco das árvores, que aumenta e diminuiu diariamente.
Sempre sob o signo da escassez de água, o empresário assume que nunca vai conseguir apostar em produções de 100% do potencial do campo. “Trabalho dentro um patamar muito mais restrito em que vou subindo as quantidades de água até um certo ponto, para não pôr em causa a rega, mas que permita produções na casa dos 70%”, revela, enquanto exibe outro exemplo dos novos caminhos agrícolas que já chegam à pecuária.
Vai para sete anos que a sua sociedade agrícola investiu no ecógrafo para determinar a fertilidade do gado bovino. “Dantes tínhamos de esperar que a vaca chegasse ao fim do período de gestação para vermos se paria, mas agora conseguimos saber isso ao fim de três meses”, sublinha, revelando que esta informação aumenta a rentabilidade. “Uma vaca que não é fértil perde valor comercial e vai para refugo [abate]”, justifica José Maria Falcão.
O empresário ressalva que a tecnologia está hoje ao serviço da agricultura, numa altura, diz, em que ainda nem todos os agricultores a sabem aproveitar. “Tenho três técnicos permanentes para ajudar nesta tarefa de fazer mais com menos recursos e é preciso andar sempre a viajar, a conhecer e a experimentar.”
Como um drone ajuda a combater infestantes
É por isso que o produtor José Palha aponta a vantagem de ligar “agricultor, universidade e empresas”, para garantir o máximo rendimento das novas tecnologias que estão a chegar aos campos. “Hoje temos centenas de startups a inventar coisas que tenho aproveitado”, diz o empresário com explorações no concelho de Benavente e na região do Alentejo, para quem os drones são uma das mais-valias à mão da lavoura.
Isto numa altura em que, segundo diz, os satélites ainda têm uma definição baixa. “Faço voos todos os meses para perceber onde estão as manchas infestantes e consigo localizar o foco da doença nos cereais, a chamada ferrugem amarela”, exemplifica, admitindo que era impossível ter essa informação a olho nu e a partir do chão.
“Este dado permite intervir localmente, evitando que o problema se espalhe ao resto da produção”, atesta, destacando ainda o privilégio dos novos tempos de conhecer a “condutividade elétrica do solo”.
É por aqui que se reúne conhecimento sobre quais as parcelas de terra mais arenosas ou argilosas, a par das diferentes manchas de terra. Segue-se a análise dos micro e macronutrientes. “Toda a vida se fez isto, mas agora fazemos análises nas diferentes manchas para conseguirmos fazer uma data de coisas diferenciáveis”, explica ao DN.
Já no terreno são tratores equipados com sistemas GPS e georreferenciadores que puxam as alfaias agrícolas. De espalhadores de adubos a semeadores, passando por pulverizadores. “Podem pôr mais ou menos adubo de acordo com a necessidade da mancha específica em cada uma das parcelas, conseguindo poupanças e melhor aproveitamento dos solos”, relata José Palha, destacando ainda o auxílio traduzido pela ceifeira-debulhadora.
Este equipamento exibe agora um mapa de produtividade que passou a entrar nas contas do agricultor como uma tecnologia que ajudou a mudar paradigmas. “Vai colhendo e vai pintando um mapa que mostra onde é que o campo produz mais e menos, o que também permite fazer correções localizadas de drenagem ou falta de nutrientes”, esclarece, retratando situações em que a falta de água se resolve com recurso ao pivô a regar em “fatias de queijo”, diz. Significa que gira mais devagar ou mais depressa consoante a necessidade de água das plantas de cada parcela.
Revolução nos campos à espera do 5G
José Palha fala de uma “revolução” nos campos agrícolas potenciada pelas novas tecnologias, que já exibem preços atraentes para os investidores – depois de terem surgido a preços proibitivos no mercado – mas diz que o grande impacto está ainda para chegar, com a tecnologia 5G.
“Isso vai aumentar a definição das imagens de satélite. O que faço hoje com o drone vai ser fácil de fazer com satélite e aí vamos agir eficazmente em tempo útil”, vaticina, admitindo que o setor agrícola vai sofrer uma mudança para melhor. “Com margens de negócio tão curtas temos de ser eficientes e combater a ideia de que a agricultura é poluidora”, conclui José Palha.
O artigo foi publicado originalmente em DN.