A Direcção da CNA, reunida em Coimbra no domingo, 24 de Outubro, analisou a situação da Agricultura e manifestou grande preocupação face a um conjunto de problemas que tem degradado os rendimentos dos Agricultores, com destaque para o enorme aumento dos custos dos factores de produção, de transformação e comercialização.
Este agravamento, com a subida brutal do preço dos combustíveis, da electricidade e também dos fertilizantes e da alimentação animal, tem efeitos directos na competitividade do sector e impactos desastrosos no rendimento dos Agricultores que já antes era de cerca de metade do rendimento dos demais cidadãos.
Depois das dificuldades com a pandemia de COVID-19, a escalada dos preços dos factores de produção poderá forçar mais Agricultores a reduzir ou a abandonar a produção, fazendo aumentar a dependência alimentar do país em produtos essenciais para a população, tais como os cereais.
A Direcção da CNA receia que a situação possa ter consequências nos preços ao consumidor, mas frisa que possíveis aumentos podem não vir a compensar os Agricultores, que continuam quase a ter que pagar para produzir. Não será de mais lembrar como se distribui, em média, o valor ao longo da cadeia de abastecimento agroalimentar: por cada 100 € pagos pelo consumidor, 50 € vão para a distribuição, 30 € correspondem à transformação e apenas 20 € vão para o Agricultor (e destes 75% eram custos de produção).[1]
No que respeita aos combustíveis, constatando o aumento dos preços na origem e nas margens praticadas, a CNA reclama que o Governo adopte medidas para minimizar os efeitos na produção, por exemplo, através do aumento do desconto nos impostos em vigor para o gasóleo agrícola. Seria incompreensível que a actividade agrícola fosse a única a não ser alvo de um apoio neste momento tão difícil.
A CNA constata, ainda, com preocupação, que na proposta de Orçamento do Estado para 2022 não está inscrita a verba necessária para a concretização da medida da “Electricidade Verde” aprovada pela Assembleia da República, situação que tem de ser corrigida.
A par de medidas que actuem directamente sobre o preço dos factores de produção, a CNA mantém a exigência da necessidade de implementação de medidas de regulação do mercado, que proíbam, por exemplo, que se pague aos Agricultores pelos seus produtos abaixo do custo de produção, e que regulem a especulação com o preço dos alimentos e dos factores de produção.
Torna-se cada vez mais premente a necessidade de alcançar a Soberania Alimentar do País, mas só será possível fazê-lo com a Agricultura Familiar e com muitos Agricultores e Agricultoras, a produzirem os alimentos necessários para a população, com rendimentos justos para quem produz e preços acessíveis para os consumidores. Para tal, é fundamental encurtar distâncias entre produção e consumo, dinamizar mercados de proximidade e abastecer as cantinas públicas com produtos locais.
A Direcção da CNA assinala também que, a par das mais recentes dificuldades, mantém-se sem resposta eficaz os prejuízos causados nas culturas por javalis e outros animais selvagens ou as dificuldades dos apicultores face ao avanço da vespa velutina.
A concentração e a pressão sobre o preço (e acesso) da terra, por culturas super-intensivas para o grande agro-negócio ou para produção de energia, desviando-a da sua função social da produção de alimentos num contexto de Soberania Alimentar, preocupa os directores da CNA que, em diversas regiões do País, veem o território a ficar cada vez mais árido de agro-bidiversidade e de gente.
A Agricultura Familiar na resposta às Alterações Climáticas
Na data em que se assinalou o Dia Internacional Contra as Alterações Climáticas (24 de Outubro), declarado pelas Nações Unidas, e rumo à 26 Conferência das Partes da ONU (COP 26), a Direcção da CNA reafirmou a necessidade de se investir em modelos de organização agrícola que privilegiam práticas produtivas mais sustentáveis, assim como na relocalização do consumo, de forma a garantir a justiça social, económica e climática para Portugal e para o Mundo.
De notar que, entre outras questões, esta Conferência focar-se-á na mobilização de financiamento para investimentos verdes. A CNA reafirma as preocupações que elencou na COP 25, Madrid, rejeitando as falsas soluções, como os mercados de carbono, mecanismos de greenwashing (marketing verde) e outras que permitam a subjugação de uns Povos por outros e pelo grande poder económico e financeiro, e rejeita as “soluções” que em nada respondem às necessidades das populações, de quem vive da terra e do próprio planeta.
Coimbra, 25 de Outubro de 2021
[1] Gabinete de Planeamento, Políticas e Administração Geral, CULTIVAR: Cadernos de Análise e Prospectiva n.º 3 (Lisboa: GPP, Março de 2016)