Agricultura e Coesão – Editorial de Teresa Silveira + Suplemento Agrovida

Ainda que torturados, os números não mentem. E as estatísticas dizem que, apesar de 22 anos de integração na UE, vivemos um crescente despovoamento, envelhecimento e empobrecimento do interior, que os milhares de milhões de euros dos sucessivos quadros comunitários (ainda) não fizeram inverter. E as regiões ditas de baixa densidade – há quem lhes chame territórios de elevado potencial, embora nas últimas décadas esse potencial se tenha confinado a extensos relatórios guardados na gaveta – representam 2/3 de Portugal.

Ao invés de chamar os representantes do Poder ao interior, o Movimento pelo Interior foi a Lisboa traçar o diagnóstico ao Poder. Lembrou-lhe, ao Poder, que a densidade populacional média do interior é hoje de 0,28 hab/Km2, enquanto o mesmo indicador para o litoral é de 104,2 hab/km2, sendo que, nas áreas metropolitanas de Lisboa (2,8 milhões) e do Porto (1,8 milhões) está concentrada cerca de 45% da população total do continente. Aliás, entre 1960 e 2016 a população residente no litoral aumentou em 52,08%, enquanto no interior diminuiu em 37,48%. Veremos se as propostas levadas à capital, mormente as de natureza fiscal, não caem em saco roto.

No Programa Nacional para a Coesão Territorial apresentado pelo Governo, diz-se que “é urgente afirmar pela positiva o interior do país” e “promover e valorizar os recursos endógenos, identificar e estimular projetos estruturantes, alinhar competências e investimentos, apostar no desenvolvimento económico inteligente e no reforço das atividades em rede, no país e entre Portugal e Espanha”. Esperamos (sentados?) para ver.

Mas é preciso ver além deste retângulo, porque o problema da coesão não é só português. Foi, aliás, em nome desse conceito que se construiu o projeto europeu. E ninguém ousa questionar que a agricultura – que representa 1,5% do PIB da União – dá um contributo decisivo nesse domínio, não só produzindo alimentos e contribuindo para a soberania alimentar de cada Estado-membro, mas como fator de fixação demográfica e de ocupação do território, assim como elemento de agregação económica, social e, até, cultural.

Conhecida a proposta de orçamento europeu para o período 2021-2027, que privilegia as dotações para as migrações ou o sistema europeu de defesa, em detrimento da agricultura e da coesão – para a Política Agrícola Comum apenas destina 365 mil milhões de euros face aos 408,31 mil milhões disponíveis no atual quadro –, só me ocorre uma palavra: desilusão.

Partilho, pois, das palavras do presidente do Governo Regional dos Açores, Vasco Cordeiro, e do professor do ISA Francisco Gomes da Silva neste “Agrovida”: este é “um jogo perigoso”. E “um péssimo sinal político que a Europa dá aos cidadãos”.

→Descarregue aqui o suplemento Agrovida de Junho 2018←


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