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Agricultura Familiar em Portugal: Plano de Acção nacional para o período de 2022-2028 abre consulta pública

A ACTUAR, a CNA, a DGADR e a ESAV/IPV concluíram a proposta de “PLANO DE ACÇÃO DA DÉCADA DA AGRCULTURA FAMILIAR” e submetem-na a consulta pública durante o mês de Junho.  Após a integração dos contributos, o Plano de Acção será alvo de uma apresentação pública em Julho e entregue ao Governo, para aprovação e condução da sua execução. Documento final é a resposta ao repto lançado pelas Nações Unidas.

A crise climática, a crise energética, a pandemia e a guerra – que abalaram e interromperam cadeias de fornecimento de bens e serviços – vieram agravar os índices de pobreza e formas de malnutrição e expor a urgência de repensar a produção local e o consumo dos bens agrícolas e, em particular, o papel da Agricultura Familiar (AF).

Produzir e consumir localmente, usando mercados de cadeia curta, contribui para um sistema alimentar mais saudável e sustentável, para a redução do desperdício de alimentos e para o envolvimento das áreas rurais e urbanas. Proteger a Agricultura Familiar é favorecer a inclusão territorial, o equilíbrio demográfico e o combate à desertificação, ao mesmo tempo que mitiga os efeitos das alterações climáticas.

A Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou 2019-2028 como a Década da Agricultura Familiar” das Nações Unidas (UNDFF). Ao mobilizar a comunidade internacional para políticas sociais, económicas e ambientais que fortaleçam e apoiem a Agricultura Familiar em todo o mundo, a UNDFF convidou todos os países a desenvolver Planos de Ação nacionais.

Em Portugal, a parceria entre a ACTUAR (ONG que defende o Direito Humano à Alimentação saudável), a Confederação Nacional da Agricultura, a Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural e a Escola Superior Agrária de Viseu – Instituto Politécnico de Viseu permitiu elaborar uma proposta de Plano de Ação para a Década da Agricultura Familiar em Portugal(PADAF).

Este Plano é o resultado de um trabalho que, desde 2021, envolve agricultores, especialistas, entidades governamentais e instituições com responsabilidade no campo da AF, de forma a construir de forma participativa a proposta de PADAF para Portugal.

Para Júlia Alves, Presidente da ACTUAR, entidade que lidera a parceria, a concretização das medidas deste Plano representa “a reparação de uma injustiça com os agricultores familiares e as suas comunidades, mas também com todos os consumidores. O direito humano à alimentação só será cumprido se forem disponibilizados às populações alimentos saudáveis, produzidos de forma sustentável e socialmente justa.”

Para além de reunir os dados estatísticos sobre o setor, o PADAF propõe uma visão para a “Década da Agricultura Familiar” em Portugal, enunciando os sete pilares que requerem atenção e ação. Para cada um dos pilares foi desenvolvido um trabalho sistematizado de objetivos, resultados, medidas e metas. São os seguintes os sete pilares:

Pilar 1 – A Agricultura Familiar nas políticas públicas

Pilar 2 – Os jovens e a sustentabilidade geracional da AF

Pilar 3 – A equidade de género e a liderança das mulheres rurais

Pilar 4 – O conhecimento e representatividade dos agricultores familiares

Pilar 5 – O bem-estar social e económico dos agricultores e suas famílias

Pilar 6 – A Agricultura Familiar como fonte de sustentabilidade nos sistemas alimentares resilientes às alterações climáticas

Pilar 7 – A inovação na Agricultura Familiar ao serviço do desenvolvimento territorial, da biodiversidade, do meio ambiente e da cultura

Para Alfredo Campos, da Direção da CNA, “a imagem negativa e redutora que foi criada na sociedade portuguesa, sobre os agricultores familiares está desatualizada e as políticas públicas continuam a não dar a devida e necessária atenção a este sector que precisa de ser reconhecido, valorizado e apoiado, para o bem de todos. Com a produção da Agricultura Familiar, reduz-se a importação e reforça-se a soberania alimentar”.

Por isso, o PADAF pretende alcançar o reconhecimento do contributo social, económico e ambiental da Agricultura Familiar para:

  • os sistemas alimentares sustentáveis e dietas saudáveis em Portugal
  • a segurança alimentar e nutricional da população
  • a sustentabilidade ambiental, preservação da biodiversidade e dos ecossistemas
  • a preservação do património cultural nas áreas rurais

Segundo Sandra Candeias, Diretora de serviços de Promoção da Atividade Agrícola da DGADR, “o crescimento populacional, as mudanças nas dietas alimentares e as alterações climáticas pressionam o sistema alimentar a produzir alimentos suficiente, saudáveis e com práticas que preservem os recursos naturais. A dependência e a insuficiência alimentar são temas que face ao contexto atual assumem grande relevância e são hoje cada vez mais debatidos. Certamente Portugal estará à altura de responder ao desafio das Nações Unidas sobre a Década da Agricultura Familiar, apresentando progressos nesta matéria”.

O PADAF pretende que, até 2030, Portugal tenha uma AF fortalecida organizacionalmente e vinculada aos mercados, na qual prosperem sistemas alimentares territoriais sustentáveis e justos, que promovam o desenvolvimento integral das famílias e comunidades.

Espera-se alcançar, até 2030, os seguintes resultados:

  • Quadros regulatórios e político-institucionais da AF fortalecidos;
  • Sistemas alimentares territoriais sustentáveis;
  • Presença da AF nos mercados local, nacional e internacional, com produtos diferenciados e alimentos de valor nutricional, social e cultural;
  • Inclusão económica de mulheres e jovens na AF;
  • Desenvolvimento de competências que respeitem os saberes tradicionais;
  • Bem-estar social e económico para as famílias da AF

Em representação da ESAV, Cristina Amaro da Costa destaca o facto de “o atual sistema alimentar e agrícola é amplamente responsável pela escassez de água, perda de biodiversidade, esgotamento do solo que, juntamente com altos níveis de emissões de gases de efeito estufa, contribuem para as alterações climáticas”.

A AF tem um papel fundamental para a realização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS, 2015), especialmente os relacionados com a segurança alimentar e nutricional, a gestão dos recursos naturais, a inclusão económica e social de pessoas produtoras agrícolas e grupos sociais em condições de vulnerabilidade, a revitalização económica dos territórios rurais, a preservação do património cultural e, em geral, a criação e manutenção de sistemas alimentares sustentáveis e inclusivos.

Dados de enquadramento sobre a Agricultura Familiar:

  • A AF representa mais de 90% da agricultura mundial e produz 80% dos alimentos do mundo em termos de valor
  • Há mais de 500 milhões de agricultores familiares no mundo
  • Desde o início da pandemia Covid-19, em 2020, a situação de insegurança alimentar agravou-se, afetando hoje 1 em cada 3 portugueses
  • 2% da população em Portugal vive em risco de pobreza
  • 68% do volume de trabalho agrícola é efetuado pela população agrícola familiar (na UE28, essa percentagem é de mais de 75%)
  • Apenas 13% dos agricultores em Portugal trabalham a tempo completo e aproximadamente 2/3 ocupam menos de 50% do tempo de trabalho na exploração.
  • A maioria das explorações agrícolas continua a ser gerida por produtores singulares (94,5%)
  • A representatividade das mulheres à frente do destino das explorações agrícolas é de 33,3% (acima da média da UE28 de 30,1%).
  • A média de idades dos produtores agrícolas em Portugal é de 64,3 anos (acima da média da UE28 de 58,0 anos).
  • A mão de obra agrícola familiar contribui com mais de 2/3 do trabalho agrícola.
  • Os produtores agrícolas singulares são maioritariamente homens (67,1%), têm em média 64 anos, quase metade conclui apenas o primeiro nível do ensino básico (46,3%), e 53% têm formação agrícola exclusivamente prática. Apenas 10,3% dos produtores agrícolas singulares em Portugal têm menos de 45 anos.

(fontes: Recenseamento Agrícola de 2019 e INE 2021)


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