Os números não mentem. Ainda que possam ser torturados. E, olhando para os divulgados esta semana pelo Ministério da Agricultura a partir do IFAP, quanto à evolução, crescente, das candidaturas às ajudas da Política Agrícola Comum (PAC), dá vontade de esboçar um sorriso de satisfação.
Vejamos. Em 2017 entraram 181 267 candidaturas, em 2018 entraram 183 231 e, em 2019, até à data, já deram entrada 183 649 processos. E o ano ainda vai a meio.
É bom, sim. Ainda que valha a pena analisar o montante do investimento associado a cada candidatura e ver a que subsetor de atividade se destina, quantas foram analisadas e em que período de tempo, quantas foram aprovadas e quantas estão pendentes, os montantes pagos e o valor da comparticipação nacional afetado a essas operações. E esses dados, com este detalhe, o Ministério de Capoulas Santos não revelou.
Não é, contudo, a execução do PDR 2020 que mais preocupa os operadores do setor agrícola no momento. O envelope financeiro para 2021-2027 é que os assusta.
Entre 2014 e 2020, Portugal receberá um total de 9372 milhões da PAC, 4105 milhões de pagamentos diretos e 4058 milhões para o desenvolvimento rural (ver tabela). Já para o período de 2021- 2017 o envelope vem bastante mais vazio.
É certo que o Reino Unido sairá da UE e deixará de contribuir para o orçamento europeu. Mas o quadro financeiro plurianual avançado pela Comissão Europeia de 1,135 mil milhões de euros de autorizações (a preços de 2018) para 2021-2027, e de apenas 365 mil milhões de euros para a PAC (face aos 408,31 mil milhões do atual quadro), acrescidos de 10 mil milhões de euros através do Horizonte 2020, deixa todos receosos.
E mais receosos ficamos quando sabemos que Portugal corre o risco de sofrer cortes reais na ordem dos 15% e que poderão atingir 25% no desenvolvimento rural (segundo pilar), que, para mais, vale 50% do envelope global (representa cerca de 20% para a média europeia).
Mais. O corte de 15% no segundo pilar da PAC apenas se refere aos preços correntes, não tem em conta o valor real, que pode ser superior. E não falando na ameaça de corte na taxa de cofinanciamento comunitária de 85%, já que a Comissão fala em 70% para o próximo FEADER, o que exigirá bem mais dos cofres nacionais.
Ora, a PAC é um poderoso instrumento de coesão económica, social e territorial, de combate às assimetrias e à desertificação do interior. É dever do Governo erguer-se da cadeira, engrossar a voz e bater o pé, para evitar qualquer corte para Portugal. Nem que tenha de exercer o direito de veto.