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ARBCAS – Seca e Estratégia Hídrica – Campilhas e Alto Sado

Desde há muitos anos que a escassez de recursos hídricos tem obrigado a ARBCAS – Associação de Regantes e Beneficiários de Campilhas e Alto Sado a repensar a sua ação e estratégia tendo em vista ultrapassar os períodos difíceis de seca, procurando preservar a água como desígnio fundamental da sua atuação.

Não é a primeira vez que sofremos as consequências da seca. Desde 1954 que sentimos os caprichos do clima, sendo cíclicos, mas imprevisíveis, os anos chuvosos, de abundância de água, a alternar com períodos de défice hídrico, felizmente em menor número.

Quando a seca se instala, sempre há a questão “..então o que se pode fazer para que tal não volte a acontecer?”. Não sendo equacionado o manuseamento do clima e a alteração dos ciclos hidrológicos, temos de procurar soluções concretas de curto, médio e longo prazo que sejam praticas, tangíveis e sensatas economicamente.

Em resultado da nossa experiencia e conhecimento da região, traçámos uma estratégia hídrica que, envolvendo a ARBCAS, os regantes e as organizações agrícolas locais, se subdivide em cinco pontos principais:

A – Redução do Consumos Unitários. Aumento do Rendimento da Água

Com a ajuda do conhecimento técnico e das tecnologias de rega, bem como com a formação dos agricultores e dos agentes ligados à rega, tem-se melhorado substancialmente a rega das culturas. Cada vez mais se utiliza sistemas de rega localizada, de precisão, associadas a sistemas de monitorização da água no solo, que, relacionadas a sistemas de monitorização do clima, permitem ao agricultor saber quando e quanto regar. Não é ficção, hoje, o que antes seria teoria, com o auxílio da tecnologia e conhecimento, pode e deve ser cada vez mais implementada na prática da maioria das culturas regadas. Incentivos financeiros, agroambientais ou outros, à aquisição de equipamentos, à certificação do regante e da exploração de regadio poderiam dar um importante input para a disseminação desta aplicação pratica da tecnologia.

Mas regar melhor nem sempre significa regar menos. Por exemplo, passar de produções de tomate de 50T/ha, com rega por gravidade nos anos 60/80, para as atuais 100 a 120T/ha, com rega por gota-a-gota, não significou regar mais ou menos, mas regar melhor. Isto é, antes regava-se o tomate com 6000 a 7000 m3/ha e agora rega-se com a mesma quantidade de água, mas com um substancial ganho de rendimento da água utilizada. O uso eficiente da água não é regar menos ou não regar, é regar de forma eficiente, sem escassez e sem excesso ou desaproveitamento do recurso. Ter conhecimento é determinante, pelo que a aprovação de projetos com culturas de regadio deveria ser condicionada à certificação do regante e á formação obrigatória, em especial dos jovens agricultores.

Ao nível da entidade gestora dos sistemas de distribuição, a pratica de planos de contingência, que são fundamentais em anos de défice hídrico, podem e devem também ser implementados em anos de maior abundância do recurso água. Limitar e controlar as dotações atribuídas, condicionar os fornecimentos, questionando os desvios anormais de consumo, deve ser intrínseca dos planos anuais de utilização da água. Para funcionar, os planos de contingência obrigam a que exista um bom sistema informático, um bom sistema de informação geográfica associada a uma base de dados fiável e um programa de gestão da rega que recolha e analise toda a informação em tempo real. A ARBCAS desde os anos 90 que procura desenvolver o seu sistema (iGis4ARBCAS), algo que nunca estará perfeito porque sempre temos necessidade de saber mais, para melhor controlar a nossa ação nas redes de distribuição de água.

Neste aspeto, não se pode descurar o tarifário, que deve ser elaborado tendo em conta a necessidade de penalizar o mau uso.

B – Melhoria dos Sistemas de Registo e Controlo

Só se pode corrigir com algum rigor o que se mede e quantifica. Ao nível da exploração agrícola os sistemas de rega devem incluir, nos diversos sectores e culturas, sistemas de contagem e monitorização da água. A medida 7.5-Uso eficiente da água veio dar um bom impulso, mas é necessário continuar a incentivar o registo e controlo dos volumes utilizados na rega.

Ao nível das entidades gestoras, toda água que sai das albufeiras deve ser medida, monitorizada e acompanhada por sistemas de telegestão que podem atuar em tempo real. Hoje, sobretudo nos novos regadios, pode-se associar os medidores a sistemas de informação geográfica, podem colocar-se sondas e actuadores que permitem saber quando e onde existem roturas, podemos auxiliar-nos de imagens de satélite que nos podem ajudar a ver onde e quando. Como já se referiu no ponto anterior, o sistema informático das organizações gestoras é fundamental para levar a efeito uma boa gestão da água. A todo o momento a ARBCAS tem conhecimento dos volumes existentes nas albufeiras, os volumes medidos nas tomadas de água e os volumes fornecidos aos regantes, podendo estes solicitar o seu extrato de consumo, sempre que tal seja necessário e podendo os técnicos efetuar projeções dos consumos.

Nesta área, para além do investimento material, é importante a formação para se poder associar e integrar sistemas, podendo assim tirar-se partido, em tempo real, destas tecnologias.

C – Origens de Água Alternativas

O antigo Plano de Rega do Alentejo incluía a construção de um conjunto de barragens e uma grande barragem, o Alqueva, que permitia o reforço de caudal das barragens de menor dimensão, sendo assim a salvaguarda para ultrapassar a série de anos secos que já nessa altura seriam previsíveis. Este funcionamento em rede está hoje em parte construído, faltando algumas ligações, nomeadamente uma que desde logo esteve prevista para garantir água ao Baixo Alentejo, a ligação á barragem do Monte da Rocha. Esta obra, fundamental para o Alto Sado, está prevista no Plano Nacional de Regadios, estando, nesta altura a elabora-se o projeto de execução. Se não existirem mais imprevistos, a obra deverá estar concluída apenas em 2024.

Em Agosto de 2016 entrou em funcionamento a ligação de Alqueva ao canal do Alto Sado, permitindo levar água a 3000 ha dos 7000 ha que potencialmente são geridos pela ARBCAS. Desta forma tivemos água para que uma parte da área continuasse irrigada e muitos agricultores pudessem continuar a sua atividade, apesar da seca que se vive na região.

A ligação de Alqueva á barragem da Fonte Serne está em fase de obra, devendo entrar em funcionamento em 2021.

Faltará ligar Alqueva á barragem de Campilhas, algo que antes nunca foi equacionado, mas que hoje, se começa a analisar como tecnicamente possível, podendo eventualmente ser estudado para uma segunda fase do Plano Nacional de Regadio.

As captações do meio hídrico e as reutilizações já são uma realidade com muitas décadas nesta região, sobretudo ligadas á pratica da cultura do arroz, nos 150 Kms de linhas de água que são confiantes com os aproveitamentos hidroagrícolas. Não existindo nesta região aglomerados populacionais numerosos, considera-se que a utilização de águas residuais não tem expressão significativa, embora possa ser equacionada em outras regiões.

D – Redução das Perdas de Água.

Ao nível das perdas nas albufeiras, pouco haverá a fazer para a sua redução. Mas quando analisamos as perdas nas redes de distribuição de água, sentimos que muito se poderá fazer para reduzir as perdas. Desde logo, reabilitar ou modernizar. Modernizar se a alteração a efetuar se afigurar radical, como por exemplo passar do atual sistema de rega com distribuição por gravidade, com controlo por montante, para um sistema de rega em pressão, com controlo por jusante. Esta alteração terá seguramente perdas muito inferiores e um serviço ao agricultor de maior qualidade, pese embora o elevado investimento. Pode-se optar pela reabilitação, com investimentos de simples reparações, substituições de materiais, impermeabilizações e outro conjunto de investimentos pontuais, que permitam de imediato a poupança de água e o aumento da eficiência do sistema.

A ARBCAS com o apoio dos fundos nacionais e comunitários tem investido na reabilitação, em impermeabilizações, reparações, substituições de tubagens, automatizações e outros investimentos que visam melhorar a funcionalidade e operacionalidade dos sistemas de distribuição, bem como reduzir as perdas, o que tem conseguido. Nos últimos 20 anos passamos de perdas de 25% a 30% na rede de rega para 9 a 15%, o que se considerarmos que estamos a falar em canais abertos, rega com controlo por montante e sistemas obsoletos, representa uma economia assinalável.

E – Aumento da Capacidade de Armazenamento

Embora a precipitação seja cada vez menos e irregular, em todas as décadas há anos anormalmente chuvosos, em que assistimos a descargas das albufeiras. Uma maior retenção e armazenamento de água superficial permitiria certamente uma maior resiliência perante os períodos de menor precipitação.

O aumento da capacidade de armazenamento poderá ser efetuado através da construção de novas barragens, aumento da capacidade das barragens existentes, da construção de açudes ou de reservatórios. No caso da nossa região identificámos alguns açudes e reservatórios que, sem grandes impactos, poderiam dar uma grande ajuda na melhoria do sistema de distribuição, permitindo poupar os recursos das albufeiras. 

Este conjunto de ações pode ser executada de forma simultânea, com maior ou menor grau de realização, em função das disponibilidades financeiras e da oportunidade de implementação, devendo atender sempre à conciliação com as medidas de minimização do impacto ambiental.

Algumas acções já estão em curso, podendo sempre ser melhoradas e aperfeiçoadas. As acções que necessitam de menos recursos financeiros têm avançado mais rapidamente do que aquelas que necessitam de investimentos elevados.

Nesta altura, quase sem qualquer recurso hídrico armazenado, mais do que poupar o que não existe, temos de encarar o futuro com um misto de cautela e optimismo, mas com esperança, aguardando a tão ansiada normalidade pluviométrica que nos permita repor os níveis de armazenamento nas albufeiras. Na ARBCAS, a Eficiência Hídrica, mais que uma necessidade é um desígnio basilar da identidade da organização, tendo vindo a ser melhorada e aperfeiçoada desde a sua fundação, há mais de 65 anos.

Ilídio Martins

ARBCAS


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