As migrações continuam. A revolução Yamnaya | Por José Manuel do Carmo

O povo chamado Yamnaya, embora também praticasse a agricultura, eram essencialmente pastores-ganadeiros nómadas. Montavam a cavalo, conduziam manadas de gado pelas pastagens, possuíam carroças em que se deslocava a comunidade, usavam armas e utensílios de metal, um regime funerário (enterramento em urna) e uma nova cultura, conhecida como Cerâmica Cordada e, sobretudo, trouxeramas línguas indo-europeias. Cerca de 2.800 ac. deslocam-se para oeste pelas estepes do Sul da Rússia a partir, provavelmente do Leste da Ucrânia, e em dois ou três séculos instalaram-se até locais tão distantes como a Rússia, as Ilhas Britânicas e a Península Ibérica. Se não há indícios sobre o que os moveu a migrar, também não se sabe o que terá permitido que tenham tão rapidamente substituindo os agricultores neolíticos que há milhares de anos constituíam praticamente a população da Europa.

JOSÉ MANUEL DO CARMO
Professor coordenador (aposentado).
Escola Superior de Educação e Comunicação, Universidade do Algarve
No Sudoeste da Península Ibérica, na região do estuário do Tejo, na primeira metade do III milénio ac., um novo estilo de cerâmica em forma de sino apareceu, a cerâmica Campanuliforme 

Uma explicação é que a população Yamnaya transmitiu uma bactéria, a que eram resistentes, dizimando as aldeias do Neolítico o que implicaria que a doença apenas afetasse os homens; outra é que dizimaram violentamente a população masculina; outra ainda é que tenham tomado as mulheres para eles, passando a ser os únicos reprodutores. Em apenas 200 anos, o haplogrupo R1b do cromossoma Y do DNA masculino dos Yamnaya terá substituído 70 a 100% o dos homens da Europa, afinal mais próximos dos nativos americanos (cujos antepassados têm origem numa região mais oriental, na Sibéria) do que dos agricultores neolíticos europeus. O haplogrupo R1b,  está presente atualmente em mais de 70% em Portugal e Espanha, com em torno de 90% no País BascoCatalunha e em algumas áreas no noroeste de Portugal, mas também  em algumas partes da Irlanda. Todavia, de alguma forma, manteve-se a forte afinidade genética feminina revelada pela presença do haplogrupo H1 do DNA mitocondrial (mtDNA), associado aos Caçadores-colectores do Paleolítico Superior na Península Ibérica, que atinge na atualidade o seu valor mais alto entre os bascos (27,8%), e 8,4% no Norte de Portugal. Em paralelo, persistem elementos da cultura anterior, como a manutenção de regimes funerários.

No entanto, estudos sugerem que o impacto Yamnaya na população Ibérica possa ser mais reduzido, mantendo as populações uma alta herança genética dos agricultores ibéricos iniciais e permitindo supor a sobrevivência das línguas não indo-europeias na Península Ibérica. A ideia de uma migração em pequena escala, implica a sua concentração em lugares específicos que podem ser identificados através das marcas culturais e genéticas.

Réplica de vaso campaniforme | José-Manuel Benito Álvarez, CC BY-SA 2.5, (https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=1251530)

No Sudoeste da Península Ibérica, na região do estuário do Tejo, na primeira metade do III milénio ac., um novo estilo de cerâmica em forma de sino apareceu, a cerâmica Campanuliforme (Bell Beaker), como uma evolução da cerâmica “Cordada”, e algumas outras variantes locais; enterramentos em urna individual com os artefactos pessoais, como a sua cerâmica e armas, com afastamento da anterior cultura megalítica de enterramentos coletivos; generalização da cultura do cavalo, que permitiu uma mobilidade sem precedentes; presença do haplótipo R1b do cromossoma Y. Todavia, este povo mostra heterogeneidade genética indicativo de constituírem uma fusão de vários contributos genéticos.

A expansão desta cerâmica, em que a “novidade da moda” vai de Portugal à Grã-Bretanha em menos de 100 anos, é uma demonstração da circulação cultural, sem um movimento significativo de pessoas, mas reproduzindo o percurso que levou os caçadores-coletores ibéricos e depois os agricultores Neolíticos até à Grã-Bretanha e Irlanda.

O limitado influxo Yamnaya explica a continuidade da língua não-Indo-Europeia introduzida pelos agricultores anatólios, que no Neolítico se estendeu até à costa atlântica e prevaleceu na maioria do território, até as migrações Celtas introduzirem a sua língua no Oeste e Noroeste da Península, que se estendeu para Sul.

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