Barragem do Pisão avança ou não avança? Providência cautelar interrompe construção

Menos de duas semanas depois do início das obras da Barragem do Pisão, no Crato, um grupo de associações ambientalistas interpôs uma providência cautelar junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco (TAFCB) para travar as obras do “Alqueva do Alto Alentejo”.

“O propósito da providência cautelar é, obviamente, parar as obras, porque neste momento já há uma grande área de destruição”, alertou Hélder Careto, secretário executivo do Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente (GEOTA), uma das associações ambientalistas que está evolvida na providência cautelar.

As máquinas tinham entrado a 22 de Setembro na Herdade da Zambujeira, a zona destinada ao paredão, relata a SIC Notícias. A população da aldeia, que ficará submersa pelo Empreendimento de Aproveitamento Hidráulico de Fins Múltiplos do Crato, também conhecido por Barragem do Pisão​, já estava a ser informada e a aceitar condições sobre as novas casas

A acção foi proposta pelas associações ambientalistas GEOTA, Quercus, LPN e Zero, tendo já sido notificadas a Comunidade Intermunicipal do Alto Alentejo (CIMAA), responsável pela obra, e a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), entre outras entidades, sobre a suspensão da declaração de impacte ambiental que permitia, com a devida compensação, o abate de mais de 50 mil azinheiras.

Hélder Careto sublinhou que, após a entrada do processo e de as partes terem sido notificadas pelo tribunal, as “obras não pararam, continuaram”, pelo que os ambientalistas estão a desenvolver outros procedimentos junto da justiça para denúncia dessa situação.

“Neste momento, o assunto está a transitar em julgado, aguardam-se as resoluções fundamentadas das diversas entidades que são citadas no processo e também a decisão do juiz”, disse. A obra deveria estar “absolutamente parada, porque o juiz deu ordem para parar as obras, e isso não aconteceu”.

Autarcas contestam “bloqueio ambientalista”

Os 15 presidentes de câmara do distrito de Portalegre discordam da acção de associações ambientalistas que interpuseram uma providência cautelar para travar a construção da Barragem do Pisão, no concelho do Crato.

Em comunicado subscrito pelos 15 autarcas, enviado à agência Lusa pelo Conselho Intermunicipal da Comunidade Intermunicipal do Alto Alentejo (CIMAA), entidade responsável pela execução da obra, os autarcas afirmaram repudiar a acção, considerando tratar-se de um “bloqueio ambientalista”.

“O Empreendimento de Aproveitamento Hidráulico de Fins Múltiplos do Crato – Barragem do Pisão, o mais ambicioso projecto do Alto Alentejo em décadas, é forçado a interromper os seus trabalhos após providência cautelar interposta por associações ambientalistas junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, que decreta a anulação da Declaração de Impacte Ambiental (DIA)”, lê-se no comunicado.

No comunicado, a CIMAA informou que vai responder a esta acção em sede própria e manifestou a “profunda convicção” de que irá ultrapassar este novo bloqueio ao desenvolvimento do Alto Alentejo.

A CIMAA garantiu ainda que, “com maior ou menor oposição”, o projecto da Barragem do Pisão “vai ser concretizado”, porque tem o compromisso dos autarcas dos 15 concelhos do distrito de Portalegre, do Governo e das populações.

Longo processo

No início do ano, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco já tinha anulado a Declaração de Impacte Ambiental (DIA) integrada no Título Único Ambiental (TUA) do projecto, fruto de uma acção interposta pela Coligação C7, que reúne um conjunto de organizações não governamentais de ambiente.

Em Fevereiro, a ministra do Ambiente anunciou que a APA tinha recorrido essa decisão judicial. No início de Junho, o ministro da Economia e Coesão Territorial, Manuel Castro Almeida, anunciou que a construção da barragem podia avançar.

Contactado também na altura pela Lusa, José Janela, do núcleo regional de Portalegre da associação ambientalista Quercus, uma das organizações não-governamentais responsáveis pela acção no TAFCB, considerou “incorrectas” as afirmações do Governo.

“O TAFCB ordenou que o processo fosse para o Tribunal Central Administrativo Sul, para conhecimento dos recursos, mas sem anular a decisão que deu razão às organizações não-governamentais de ambiente”, disse.

Investimento de 222 milhões de euros

O financiamento do projecto da Barragem do Pisão transitou do Plano de Recuperação e Resiliência em Março deste ano para o Orçamento do Estado e passou de 151 para um montante total de 222,2 milhões de euros (mais IVA) e um prazo de execução até 2027.

Segundo a comunidade intermunicipal, além do regadio que vai dar resposta a mais de cinco mil hectares, a barragem vai contar com uma central fotovoltaica flutuante, de 150 megawatts, num valor de cerca de 51 milhões de euros.

Entre outras componentes, o projecto contempla, além da barragem e da central fotovoltaica, uma central mini-hídrica e canais para regadio agrícola e sistema de abastecimento público de água.

A albufeira, uma reivindicação histórica da região, vai surgir numa área de dez mil hectares, ficando submersa a aldeia de Pisão, que actualmente conta com cerca de 70 moradores e 110 casas.

Autarcas garantem cumprir exigências ambientais

A CIMAA recordou tratar-se de uma “infra-estrutura decisiva” para o desenvolvimento do Alto Alentejo e que visa a “melhoria das condições de vida” das populações, a par do “respeito total” pelo ambiente.

“O escrutínio é natural num investimento tão complexo e tão transformador como este, sendo que estes entraves legais, perpetuados por associações ambientalistas, já aconteceram no passado – e estamos certos de que vão continuar a acontecer -, enquanto for possível judicialmente contestar o projecto”, admitiu a entidade.

A CIMAA e respectivos associados reafirmaram ainda “total transparência” na condução do processo e no “cumprimento de todas as exigências” ambientais, “respeitando escrupulosamente” as normas e a legislação em vigor.

Por isso, reafirmaram manter-se “totalmente convictos da continuidade” da construção da Barragem do Pisão: “Reforçamos ainda a confiança que depositamos em todo o trabalho efectuado pela APA e ministério do Ambiente e Energia” e pelas “demais entidades envolvidas no processo”.

A Barragem do Pisão é o investimento público “mais avultado de sempre” assumido por uma comunidade intermunicipal, refere o comunicado.

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