Biodiversidade florestal

Biodiversidade Florestal na Europa: relatório EFI reforça importância da gestão mais próxima da natureza

O EFI – Instituto Europeu da Floresta – acaba de disponibilizar o relatório “Biodiversidade Florestal na Europa”. O documento explora a importância da biodiversidade no contexto das florestas europeias e deixa sugestões sobre como manter e melhorar esta biodiversidade através de medidas e práticas estruturadas e transversais de monitorização, proteção, gestão e restauro.

A biodiversidade florestal é mais do que uma mistura de espécies. A sua escala vai desde os genes a florestas inteiras, passando pelas árvores individuais. Na Europa, as florestas têm uma longa história de uso humano e os ecossistemas florestais europeus incluem florestas naturais e plantadas.

A conservação da biodiversidade florestal deve ser feita em qualquer tipo de floresta e tem de envolver a sociedade, proprietários e gestores florestais, além dos decisores políticos. Dada a sua complexidade, precisa de ser sustentada pelas ciências naturais e também pelas sociais, e encarada numa perspetiva de longo prazo, com políticas estruturadas que ultrapassem os curtos períodos que, tipicamente, constituem o horizonte político.

Estas foram algumas das ideias a reter da conferência What Science can tell us about Forest Biodiversity in Europe, um evento que decorreu a 30 de maio de 2022, na Roménia, no qual foi apresentado o relatório do EFI “Biodiversidade na floresta europeia” e lançado o maior projeto de sempre dirigido ao restauro, gestão e biodiversidade das florestas, o projeto europeu SUPERB – Solutions for forest ecosystem restoration.

O relatório divulgado recorda-nos que a biodiversidade florestal que temos hoje decorre em grande parte de um legado que recebemos no passado. Preservar esta herança implica, antes de mais, conservar os ecossistemas insubstituíveis que são formados pelas florestas primárias e antigas. Nestas áreas florestais que constituem habitats de espécies ameaçadas são necessárias medidas de conservação mais rigorosas, alerta o documento, recomendando que estas florestas antigas e primárias devem ser integralmente preservadas e alvo de uma gestão florestal próxima da natureza.

O relatório lembra, no entanto, que apenas metade das florestas primárias e antigas que conhecemos estão protegidas. A outra metade permanece sem quaisquer medidas que previnam o seu desaparecimento, sujeita inclusive a práticas ilegais de desflorestação.

Dada a longa história humana europeia e o também longo recurso às matérias-primas florestais essenciais – desde madeira e alimentos silvestres, a forragem e fibras –, as áreas florestais pristinas e com poucos vestígios de alteração humana são atualmente uma minoria na Europa e ficam, sobretudo, localizadas em zonas inóspitas no norte e leste.

É por isso necessário que a conservação da biodiversidade florestal seja feita também nas florestas que, sendo plantadas, se regeneram naturalmente e nas que são continuamente plantadas e renovadas para a obtenção de matérias-primas naturais cada vez mais procuradas, num modelo de bioeconomia circular.

Estas diferentes realidades da floresta no espaço europeu exigem abordagens de gestão e conservação específicas e adaptadas a cada contexto –, reforça o documento, que identifica a gestão florestal como parte da solução para conservar e melhorar a biodiversidade florestal na União Europeia.

Parte das recomendações para a gestão das florestas alteradas pela atividade humana apelam à constituição de espaços florestais diversos, que conjuguem produção e conservação (entre outros elementos) e que beneficiem de soluções baseadas na natureza para, assim, melhorar a resiliência, produtividade e biodiversidade florestal na Europa.

O sector florestal tem margem para integrar nas suas práticas de gestão mais medidas dirigidas à conservação da biodiversidade, refere o documento. O tipo de gestão florestal aplicado influencia a biodiversidade e é um fator crítico no restauro, manutenção e promoção da biodiversidade nas florestas europeias, nomeadamente nas plantadas.

Este processo pode começar pelo aumento da diversidade genética das árvores e da diversidade das espécies arbóreas presentes numa plantação. Pode ainda ser reforçado se a dimensão das áreas de corte raso se reduzir.

Outras medidas identificadas são a retenção de mais madeira morta no solo, a preservação de árvores com fissuras e concavidades que constituem microhabitats, a promoção de maior diversidade estrutural entre áreas plantadas ou dentro delas e a preservação do subcoberto florestal durante os períodos de corte e replantação.

A gestão de ecossistemas é outro dos aspetos focados no relatório e também a esta escala o recurso a variantes de gestão florestal “baseadas na natureza” é referido.

Neste contexto, o relatório lembra um aspeto nem sempre óbvio, quer para decisores políticos e gestores florestais, quer para a sociedade em geral: as perturbações naturais – árvores derrubadas pelo vento, madeira morta e até incêndios e pragas – são acontecimentos que fazem parte dos ecossistemas florestais e precisam de ser tidos em consideração para manter ou restaurar a complexidade estrutural destes ecossistemas. É, por isso, necessário procurar práticas de gestão que produzam resultados mais semelhantes àqueles que seriam observados em zonas florestais com pouca ou nenhuma intervenção humana.

A gestão florestal integrada e próxima da natureza permite “imitar” estes regimes de perturbação natural e os estágios deles resultantes, ajudando a assegurar a presença de elementos-chave, como sejam os mosaicos de árvores maduras e a presença de madeira morta.

Já à escala da paisagem, é sublinhada a abordagem em tríade. Segundo se refere, esta estratégia – que incentiva um compromisso entre produção, proteção e uso múltiplo – tem-se mostrado promissora na conciliação entre diferentes objetivos de gestão florestal.

A abordagem em tríade combina várias intensidades e objetivos de gestão em parcelas distintas presentes numa mesma paisagem florestal. Prevê, assim, que áreas estritamente protegidas e áreas de produção intensiva constituam partes de uma paisagem florestal mais vasta, com o restante território ocupado por sistemas de gestão integrados e uso múltiplo, onde a cobertura florestal e a gestão próxima da natureza permitam manter corredores verdes – essenciais à conservação da biodiversidade – em torno das plantações e entre diferentes áreas florestais protegidas.

Além destas recomendações, o relatório do EFI “Biodiversidade Florestal na Europa” reforça a necessidade de uma monitorização mais eficaz. Existem lacunas a ultrapassar, sendo a primeira a visão parcial da biodiversidade, ao nível da espécie, que tem prevalecido: “… muito pouca atenção tem sido dada à monitorização de outros aspetos da biodiversidade, como é o caso da diversidade genética e funcional”.

Seja qual for o tipo de floresta, é necessário ter em consideração a multiplicidade de conceitos que a biodiversidade encerra, incluindo a diversidade genética das espécies e das suas populações, a heterogeneidade estrutural da floresta (vertical e horizontal), a diversidade de habitats e microhabitats e, numa escala dimensional mais ampla, a variedade dos ecossistemas.

A falta de uma monitorização coordenada entre países e instituições europeias sobre “o que monitorizar” e “como monitorizar” é outro dos entraves que urge ultrapassar. A determinação de critérios comuns é essencial, quer para conhecer a biodiversidade florestal e sua evolução a diferentes escalas (dos genes aos ecossistemas), quer para compreender como os ecossistemas florestais estão a responder aos desafios que se lhe colocam, nomeadamente aos impactes das alterações climáticas.

Aumento das temperaturas, secas mais frequentes, tempestades, megaincêndios e epidemias são algumas das manifestações que estão a causar o aumento de mortalidade das árvores e a ameaçar a sobrevivência de muitas outras espécies que lhes estão associadas. Contudo, a monitorização deve abranger as restantes ameaças à biodiversidade florestal, como a poluição atmosférica, as espécies invasoras, as pragas e doenças, as alterações no uso do solo e a fragmentação da floresta.

O artigo foi publicado originalmente em Florestas.pt.


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