ADN

Cientistas querem “editar” genes do arroz e torná-lo mais tolerante ao calor

Faculdade de Ciências do Porto coordena projecto europeu para “editar” os genes do arroz com a técnica CRISPR e, assim, torná-lo mais resistente às alterações climáticas.

No laboratório da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP), há uma garrafa de vinho espumante com um rótulo curioso. Lê-se “CRISPit” no papel colado ao vidro escuro. Não é uma marca vinícola, mas sim o nome de um projecto internacional que pretende “editar” genes do arroz e torná-lo mais resistente às alterações climáticas.

“Recordo-me de estar a vir de carro para o trabalho e a [investigadora] Ana Marta ligar a perguntar se eu estava sentada, porque tinha uma notícia para dar: tínhamos recebido o financiamento. Comemorámos com bastante alegria, porque estes projectos são muito competitivos”, conta ao PÚBLICO Sílvia Coimbra, professora e investigadora principal do laboratório de reprodução sexual e desenvolvimento das plantas da FCUP.

Com um financiamento europeu no valor de 588 mil euros, dotado pelo Programa Horizonte, o CRISPit tem como objectivo compreender melhor os mecanismos biomoleculares que regulam a tolerância ao calor durante o processo reprodutivo do arroz. A FCUP vai coordenar, ao longo de quatro anos, um consórcio internacional com dez parceiros em países como a Itália, a França, os Estados Unidos, o Japão e o Vietname. Em Portugal, contam com a colaboração do Instituto de Tecnologia Química e Biológica, em Lisboa, e da Deifil, uma empresa de biotecnologia vegetal.

“É importante estudar o impacto das alterações climáticas nas plantas com relevância agrícola, porque as diferenças de temperatura, assim como do grau de salinidade, vão ter um impacte na produtividade – ou seja, vão afectar a quantidade de alimento que vamos obter. Sabendo que o planeta está a aquecer e a população a aumentar, estes estudos são necessários para ultrapassar dificuldades e manter uma boa produtividade agrícola”, faz notar a investigadora Ana Marta Pereira.

O que é a CRISPR-Cas9?

A palavra curiosa escrita na garrafa – CRISPit – é uma referência ao nome (não menos estranho) de uma técnica de edição genética chamada CRISPR-Cas9. Com esta ferramenta, os investigadores esperam poder editar genes específicos do arroz, por forma a obter variedades capazes de resistir à subida gradual da temperatura no planeta.

A CRISPR-Cas9 foi criada, há pouco mais de uma década, por uma dupla de investigadoras da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, e do Instituto Max Planck de Berlim, na Alemanha. Rápida e acessível, a técnica funciona como uma tesoura molecular, permitindo alterar e corrigir genes-alvo com precisão.

O segredo de tamanha exactidão está numa enzima chamada “Cas9” – e daí parte do nome da técnica. A enzima, proveniente da bactéria Streptococcus pyogenes, funciona como um instrumento de corte, só que ao nível molecular. Uma vez encaixada num pedacinho de ARN (uma molécula parecida com o ADN), é capaz de entrar em células vivas e cortar o ADN em locais previamente indicados pelas “ordens químicas” do ARN.

“Há um mundo de utilizações para esta técnica. No nosso caso, vai permitir a […]

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