O dia 17 de junho de 2017 mantém-se presente e emociona quem o viveu. Muitos já não querem falar mais, outros contam o que ainda hoje os inquieta: porque é que os bombeiros e ambulâncias demoraram? Como é que não havia comunicações? O estado da floresta revolta. “Em termos de segurança, está pior do que estava”.
É como se ouvissem o tempo contar até que as chamas voltem a consumir a terra. Cinco anos depois do grande incêndio que matou 66 pessoas nos concelhos de Pedrógão Grande, Castanheira de Pera e Figueiró do Vinhos, entre os que querem falar e os que só desabafam, o sentimento é o mesmo: o que se viveu ali naquele sábado, 17 de junho de 2017, não se esquece e muito mais podia ou devia ter sido feito para evitar que uma tragédia se repita. O que sobra está à vista: os eucaliptos rebentaram de novo, mais os que foram plantados. O mato chega em muitos casos até à estrada, alto, em alguns caminhos quase a formar um túnel de árvores, agora algumas com mais de três metros, onde se veem ainda os palitos das árvores que arderam em 2017, nem todas limpas.
“Em questão de segurança, está pior do que o que estava. Das matas que foram limpas, o que deu dinheiro foi cortado e vendido e o que não prestava ficou lá para fazer de pasto para as chamas quando ele vier. O resto são eucaliptos a rebentar, com aquele óleo que parece gasolina. O fogo assim volta com tanta força ou mais do que aquela com que veio”, diz Eugénio Santos, de 65 anos, um dos sobreviventes do fogo na aldeia de Nodeirinho, onde morreram 11 pessoas naquele dia, entre eles Bianca, de três anos, encurralada com a avó quando fugiam de carro com a mãe e o irmão.
Eugénio teve 30 segundos para decidir para onde fugir. Na madrugada, ganhou coragem para ir com a Proteção Civil ajudar no reconhecimento de 16 corpos. “Ainda hoje tenho pesadelos. Dos 16 corpos que vi, só conheci três. É impressionante ver uma pessoa reduzida a carvão”.
Não há mais palavras. Acompanha-o a imagem da neta no colo da avó. “Passadas seis horas, ainda não havia uma ambulância para socorrer a mãe”.
A pressão foi esmagadora, começou a fumar três maços de tabaco por dia. Em outubro de 2017 deu-lhe um enfarte, de acumular, disse à médica. Mas naquele dia Eugénio não perdeu nada e está grato por isso.
O que o revolta agora é perceber como os anos passam e o risco de que uma tragédia se repita continua presente. Estamos em Adega, um pouco antes de Nodeirinho. É sairmos numa cortada ali abaixo à esquerda para ver, exemplifica.
O caminho de curvas leva até à aldeia onde os habitantes se salvaram num tanque, e se o principal está mais limpo, naquele a vegetação vem até às bermas, sem distância de segurança, muito menos os dez metros ou mais previstos na lei.
A madeira dos incêndios foi tirada, mas outra ficou e mesmo de trabalhos que parecem recentes veem-se aqui e ali muitos restos de madeira caída. “Os eucaliptos cortam-nos, deixam lá a raiz e voltam a rebentar”.
Ontem chovia, mas o país tem estado em onda de calor – “aqui são três meses de inverno e o resto de inferno”, dizem-nos à chegada – e num placard da Proteção Civil por que passamos pode ver-se o aviso “risco máximo de incêndio”.
“Nas estradas principais está tudo bem, nas secundárias é só mato”, corrobora Nelson Elias, de 68 anos, residente em Moleiro, Vila Facaia.
Naquele sábado estava ali, no café de Adega, a ver o Portugal-Sérvia do Campeonato Europeu de Futebol Sub-21.
“Primeiro apareceu uma pessoa a dizer que o fogo estava no campo de São Mateus, em Pedrógão Grande. Passado um bocado vieram dizer que fogo tinha passado Ponte Pera. Víamos o fumo ao longe. De repente aparecem bombeiros com três feridos, começaram a dar-lhes água aqui. Vejo-os discutir entre eles, não tinham comunicações. Como era possível não terem comunicações?”.
Nelson conta que pegou no telemóvel, tinha […]