Perante o anúncio do acordo alcançado no Conselho Europeu, a 21 de Julho, sobre as verbas do Quadro Financeiro Plurianual (QFP) 2020-2027, a que se juntam, para o mesmo período, as verbas do Fundo de Recuperação, a CNA considera que não há qualquer motivo para se respirar de alívio, antes se adensam as preocupações quanto ao futuro da agricultura e da situação económica e social do País. Na verdade, dizer-se que se evitaram males maiores não faz com que o acordo passe a ser bom.
Mesmo incluindo as verbas do Fundo de Recuperação, o financiamento total disponibilizado aos Estados-Membros (EM) mantém um recuo assinalável relativamente aos seus valores reais no passado. Situação mais preocupante porquanto é o QFP, ou seja, as verbas atribuídas aos EM sem o Fundo de Recuperação, que vai servir de base aos futuros orçamentos plurianuais.
A agricultura foi severamente prejudicada pelo arrastar das negociações do Fundo de Recuperação, tendo perdido metade da dotação inicial proposta, que era de 15 mil milhões de euros, ficando apenas com 7,5 mil milhões. Isto significa que, para a agricultura, vai somente 1% das verbas adicionais do Fundo de Recuperação. Situação de gravidade acrescida, tendo em conta as exigências reforçadas no plano da condicionalidade, clima e biodiversidade que vão ser colocadas aos agricultores.
No caso português, a análise dos valores reais (a preços constantes de 2018) revela afinal perdas de quase 500 milhões de euros no Pilar I – pagamentos diretos e medidas de mercado (menos 9% do que no quadro anterior) e de mais de 300 milhões no Pilar II – desenvolvimento rural (menos 5%). Não são vitórias, são reduções significativas, das quais nada pode vir de bom.
A CNA vê com grande apreensão, no plano mais geral do País, que este pacote de fundos comunitários contemple a possibilidade de aumento da dívida pública, tendo em conta que uma fatia importante virá sob a forma de empréstimos, somando-se assim a uma dívida já de si asfixiante, e em boa parte de legitimidade questionável. A CNA rejeita que a atribuição destes apoios seja associada a novas condicionantes que limitem ainda mais a soberania política e económica do nosso País, colocando em causa funções sociais essenciais para as populações de todo o País, e para os territórios rurais em particular.
A CNA, com as suas Associações, com os agricultores, prosseguirá a sua ação no sentido da concretização de uma política agrícola que apoie e promova a Agricultura Familiar, os pequenos e médios agricultores, pilar essencial da Soberania Alimentar do nosso País.
Reclamamos um programa de medidas específicas para a Agricultura Familiar e os pequenos e médios agricultores. Mantemos a exigência da concretização do Estatuto da Agricultura Familiar como instrumento indispensável dessa política. Reclamamos o reforço do Regime da Pequena Agricultura, e dos apoios à agricultura em zonas desfavorecidas, à organização da produção dos pequenos e médios agricultores, aos circuitos curtos de distribuição, níveis adequados de apoio ao investimento e a definição de critérios que incluam modulações e plafonamentos para as grandes explorações.
Não basta o discurso em grandes parangonas sobre os objectivos ambientais, de coesão territorial ou sobre estratégias em vários tons de verde, se faltar o essencial para as fazer sair do papel.
Só com mais justiça na distribuição dos apoios será possível defender convenientemente a agricultura, o Mundo Rural e os efeitos positivos da Agricultura Familiar, no ambiente, no território ou na economia e proporcionar às populações uma alimentação saudável e de proximidade.