[Fonte: CNA – Confederação Nacional da Agricultura]
Os graves problemas da Floresta Nacional não se resolvem com medidas administrativistas impostas pelo Ministério da Agricultura e que ignorem os direitos dos proprietários e produtores florestais como mais uma vez acontece, no caso com as áreas mínimas fixadas – por “Unidades de Cultura” – para manter as parcelas florestais “indivisas”, nas heranças.
De facto, através da Portaria nº 19/2019 (e anexos) de 15 de Janeiro, o Ministério da Agricultura e o Governo acabam de fixar a níveis demasiado altos– embora regionalizados – as áreas mínimas abaixo das quais não será possível dividir (fraccionar), formalmente, os “prédios rústicos” florestais das heranças pelos herdeiros ou seja, essas parcelas vão ficar “indivisas”. Assim, vão permanecer “indivisas” parcelas florestais cuja área não atinja, designadamente, 4 hectares(ha) no Norte, no Alto Minho, Porto, Ave, Cávado, Douro e Tâmega e Sousa e regiões de Aveiro, Coimbra, Leiria, Viseu… Ou 8 ha, no Alto Tâmega, na Beira Baixa e Serra da Estrela, nas Terras de Trás-os-Montes, no médio Tejo e no Oeste, em parte do Baixo Alentejo e no Algarve… E chegam a atingir os 48 ha mínimos no Alentejo Litoral, na Lezíria do Tejo e nos concelhos de Alcochete, Montijo e Palmela.
Numa primeira apreciação a este assunto, a CNA declara:
A CNA não foi previamente ouvida sobre esta matéria e devia tê-lo sido. Aliás, nem o Conselho Nacional Florestal foi ouvido sobre a “tabela” em causa, enquanto órgão dito “de consulta” do Ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural.
A pretexto da criação da “Unidade de Cultura” também para as áreas florestais, basicamente foi transposta, para esse efeito, a “tabela” já antes definida – nos anexos da Portaria nº 152 de 9 de Agosto de 2016 – a qual vigora para as áreas máximas e, ao que agora mais interessa, para as “Unidades de Cultura” (áreas “indivisas”) das terras para cultivo, em sequeiro.
E ao transpor de forma administrativista uma tal “tabela”, de igual forma se vão transpor os principais problemas daí resultantes e já detetados nas terras de cultivo em sequeiro (e também em regadio).
Pois, colocar as fasquias tão altas para definir as áreas mínimas – “Unidade de Cultura” para a Floresta – nos valores agora adoptados pelo Ministério da Agricultura e pelo Governo para as heranças permanecerem indivisas, isso NÃO vem ajudar em nada que, para ser de facto útil, teria, primeiro, que ser justo e prático e não nos parece que o seja.
Em primeiro lugar, estas áreas mínimas, embora regionalizadas, vão logo impedir o fracionamento – as partilhas formais – da larga maioria das heranças, agora também das parcelas florestadas, sobretudo a Norte do Rio Tejo e no Algarve.
A “rentabilidade económica e financeira” em prejuízo do social e do ambiental.
É a teoria da “rentabilidade económico-financeira” que também preside a esta nova tabela de áreas mínimas para os “indivisos” – a partir da “Unidades de Cultura” na Floresta – e já sabemos que essa teoria da “rentabilidade” tem pretendido justificar medidas e opções injustas com muitos “erros de cálculo” e muitos atropelos oficiais a recaírem – negativamente – sobre a Agricultura Familiar e o Mundo Rural.
E, a seguir, qual dos herdeiros assume o direito sucessório com a titularidade dessas parcelas “indivisas” e como “indemniza” ele os outros legítimos herdeiros ? Quem, de entre os herdeiros, fica a pagar os impostos dessas mesmas parcelas, sendo que, muitas vezes, o “cabeça de casal” não se dispõe a isso ? … A seguir, por falta de pagamento dos impostos, as Finanças vêm e penhoram o quê, a que valor, para quê e para quem ?
Estímulo virado para a concentração forçada da propriedade rústica,
no caso florestal
Estas novas, e altas, áreas mínimas surgem, aliás, no momento em que múltiplas dinâmicas governamentais atiram para a concentração da propriedade, não raras vezes a obter por autêntica espoliação prática dos “prédios rústicos”, florestados ou não, dos pequenos e médios Agricultores. Assim, esta “tabela” das áreas mínimas de “indivisos”, também na Floresta, é um grande obstáculo a mudanças de titularidade pelo que “só” vêm servir para travar, entre herdeiros, a exploração e usufruto das parcelas.
Ou seja, estas áreas mínimas vão contribuir para, nalguns casos, promover a concentração da propriedade rústica e, por outro, vão contribuir para o aumento dos terrenos ditos “sem dono conhecido” os quais vão ficar sujeitos aos “apetites” – económicos e financeiros – dos maiores proprietários ou produtores florestais.
É ainda provável que vão baixar, ainda mais, os preços de compra e venda do metro quadrado dessas áreas/parcelas, agora “indivisas”, sobretudo nos casos de herdeiros sem apetência para lá irem investir, eles próprios… No previsível contexto, muitos dos herdeiros de “indivisos” vão aceitar vender essas parcelas por tuta e meia e, mesmo assim, se houver quem lhas queira comprar…
Assinale-se também que, depois de tanta conversa e, até, depois de investimentos públicos em torno do “associativismo para ganhar escala” – por exemplo, com as ZIF, Zonas de Intervenção Florestal – parece que esta dinâmica pela via associativa já deixou de ser prioritária para o Ministério da Agricultura e o Governo pois, agora, colocam de novo a tónica no domínio do “económico e financeiro”.
Esta posição oficial é altamente preocupante pois tem sido esse um dos principais efeitos estratégicos imposto, há décadas, pela grande indústria das fileiras da Madeira que determinou a Floresta que temos e que tanto nos tem preocupado e prejudicado como Floresta industrial, (super) intensiva e monocultural.
Estratégico e estruturante é fazer aumentar os Preços da Madeira na Produção.
Entretanto, Governo e Governantes fogem a enfrentar o aspecto, verdadeiramente estratégico, da necessidade em fazer aumentar os Preços da Madeira na Produção – enquanto factor económico mais estruturante. E sem fazer aumentar os Preços da Madeira na Produção, não há “gestão activa da Floresta” pelo menos no respeito pelos direitos dos pequenos e médios proprietários e produtores florestais, incluindo o respeito pelo direito de propriedade.
Outro vector administrativo que deveria ser prioritariamente definido e aplicado, é o de reduzir burocracias, reduzir emolumentos e outros encargos asfixiantes agora exigidos para legalização dos prédios rústicos de pequena e média dimensões, florestados ou não.
Neste nível, as isenções e reduções fiscais para a Floresta terão efeitos mínimos no minifúndio em que os rendimentos são já tão pequenos que não atingem os escalões fiscais contributivos que há até agora. Ou seja, quem mais sairá beneficiado com novas isenções ou reduções fiscais vão ser os maiores entre os grandes proprietários ou produtores Florestais , afinal, como este “sistema” manda que aconteça !…
Coimbra, 29 de Janeiro de 2019 // A Direcção da CNA