Sim, o problema da minha Aldeia não é ter Gente a mais… O problema da minha Aldeia é ter Gente a menos, normalmente.
O nosso problema, na minha Aldeia e nas outras que conheço, não é haver ar puro a mais, não é haver horizontes livres e espraiados por montes e vales e planícies.
Na minha Aldeia, o nosso problema é que estão a fazer-nos ter medo de respirar ar puro…é fazerem-nos crer que é perigoso alargarmos os nossos olhos por esses horizontes…e subirmos ao alto daquela colina – que, aliás, ali mesmo está há centenas de milhões de anos ! – e arfarmos na caminhada, sem máscaras…
Eu cá, confesso, já tenho receio em beijar a minha companheira…até a minha filhota… Um vizinho meu lamenta-se que não o deixam visitar a mãe que está acamada num Lar, aqui pertinho… Irra ! Que raio de vida !
Enfim, sabemos que anda por aí um “bicho ruim”, uma tal de “Covid 19”, a tentar tramar-nos a vida. E sim, convém termos alguns cuidados, mas também exageram nisso !
Os “senhores” governantes que pretendem mandar nisto tudo (…), até nos vírus, mandam-nos ficar fechados dentro da “gaiola”, sem arejarmos a não ser pelas janelas abertas… por onde entra o frio… E decretam-nos sucessivos “estados de emergência” e “estados de sítio”… Dizem-nos que nos fazem isso “para nosso bem” ?!… Será mesmo assim ou é de desconfiar de tanta “bondade”?… É que, de facto, não é necessária tanta “violência institucional” com estas restrições todas, a fecharem-nos em casa, dias e noites seguidos !
Por aqui, nas nossas Aldeias muito rurais, para a pouca Gente que ainda por cá teima em viver, não chegaria o uso da máscara, o distanciamento social para evitar alguns ajuntamentos maiores, o não viajar para outros concelhos ? Estamos convencidos que isto seria suficiente e nós também receamos a pandemia.
Entretanto, esses mesmos governantes (e outros “senhores”) não são capazes de atinar num plano de vacinação rápido, claro e eficaz ! Sim, por exemplo, quando vão ser vacinados – onde e com que tipo de vacina – todos os nossos idosos ? É que a Rainha de Inglaterra já foi vacinada quase de certeza. Enfim, “somos todos iguais mas há uns mais iguais do que outros!”… Porém, pode vir a acontecer, e em breve, que com as demoras (políticas…) na vacinação, em Portugal, muitos dos nossos idosos corram o risco de vir a morrer (com Covid) “na praia” dessa espera, quiçá a suspirarem pelas vacinas !…
E nós sabemos que, neste momento, muitos milhares de idosos há noutros países que já foram vacinados e que vão ser vacinados muitos mais nos próximos 30 dias … Então e para nós ? Então para nós, estes governantes, que se dizem tão nossos “amigos”, afinal dão prioridade aos “estados de emergência“ e aos “estados de sítio” em prejuízo da vacinação rápida e eficaz?
Apagaram-nos o “Cepo de Natal e Ano Novo” ! Congelaram as nossas Tradições !
Saí à rua na minha Aldeia onde quero continuar a ser um “pássaro do campo” que “pássaro de campo” não quer gaiola.
Fui ao Largo da Capela onde já passei muitos fins de ano à volta do “Cepo de Natal e Ano Novo”. Uma tradição crepitante de calor e luz naturais. Mas também “crocante” porque, tantas vezes, tantas vezes, e não por magia mas por tradição, por lá apareciam umas chouriças e umas febras, por vezes um frango, até um borrego. Tudo a colocar nas brasas do “Cepo”, a assar, a “chiar” no lume, até ser degustado e regado com pinga da boa, por norma do Vinho Dão !
Podem até dizer que isso é demasiado básico, demasiado “rural” ou “campónio”. Pois que digam isso e mais ainda… Mas que eu e os outros “rurais” e os citadinos (de visita à Aldeia) que apreciam, possamos continuar a conviver dessa forma ! Aliás, temos pena dos outros, inclusivé dos maiores críticos da tradição, que não sabem o que perdem !…
Sim, trata-se de conviver com prazer – o calor do “Cepo” e as iguarias valem a pena ! — e satisfação pela tradição cumprida. Que estamos (estaríamos…) ali, à volta do “Cepo de Natal e Ano Novo”, os Conterrâneos e outros Amigos, a convivermos uns com os outros. E assim também convocamos (convocaríamos…) os nossas antecessores na Aldeia e no ritual, para ali ficarmos, todos, em paz e satisfeitos (que ninguém se atreve a levar Vinho de má qualidade…) a ultrapassar a dimensão do tempo, nesses momentos ! Mas – bolas ! – não estamos !
Este Ano de 2020, o “Cepo” está apagado. O Largo da Capela e ruas adjacentes estão sem vivalma… Não, não vai haver iguarias. Não vai haver convívio…nem conversatas partilhadas…nem recordações comuns.
“Inventaram” um “estado de emergência” que apagou o “Cepo de Natal e Ano Novo”…que “congelou” as nossas melhores Tradições !
E as ”Janeirinhas” proscritas, também elas !
Das mais agradáveis das minhas recordações da infância ficaram no “pedir as Janeirinhas” – “ou de carne ou de choiriça” – quando a garotada em bandos (nessa época havia muita garotada na minha Aldeia…), com sacolas na mão – corria de porta em porta a interpelar os residentes para lhes “darem as janeirinhas”. Que excitação! Que expectativa !
Mais tarde, em adultos, o estilo dessa tradição manteve-se embora os grupos fossem formados menos espontaneamente e por norma, entravam sem grandes “restrições” pelas bebidas alcoólicas, com o Vinho (sempre) e também com a Jeropiga (“jorpiga”) e a Aguardente de Pêra.
Mas hoje – 1 de Janeiro de 2021 – nem carne, nem choiriça, nem vinho, nem nada ! Nem Crianças, nem Amigos, nem Conterrâneos, nem Gente. Que tristeza !
Quando passar esta “má onda” sanitária, vamos pensar em pedir uma “indemnização” ao Estado e à União Europeia. E vai ser alta “indemnização” que este “prejuízo” todo, a todos nós, até nem tem preço que o pague !
Sim, a Covid 19 e os “estados de emergência” convergem para fazer da minha Aldeia, já antes desertificada, uma Aldeia Fantasma !
Pois eu vos esconjuro !
Viva o Espírito de Natal e os Festejos do Ano Novo à solta pela minha Aldeia !
Viva a vida !
Membro da Direção da CNA, Confederação Nacional da Agricultura