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Colocar a Ciência no centro da elaboração das Políticas Agrícolas

O Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC) de Portugal para o período 2023-2027 esteve em consulta pública entre 19 de Novembro e 6 de Dezembro. A ADVID, enquanto associação dedicada à produção e transferência de conhecimento com vista à modernização e capacitação da vitivinicultura, apresentou os seus contributos com base no mais recente conhecimento científico, fundamentando-os na experiência adquirida no âmbito das actividades de investigação, desenvolvimento experimental e disseminação promovidas ao longo de 39 anos e que são o motivo da sua fundação e existência.

Nesta perspectiva, em alinhamento com os objectivos da estratégia Farm-to-Fork, foram apresentadas pela ADVID propostas para adequar o PEPAC a uma contribuição consequente para uma viticultura mais sustentável, equilibrando os pilares ambiental, económico e social e, consequentemente, mais resiliente face aos novos desafios que se apresentam aos actores da cadeia de valor agro-alimentar. Detalham-se em seguida esses contributos:

Eixo A- Sustentabilidade (Eco-Regimes)

As intervenções propostas no âmbito dos Eco-Regimes visam apoiar compromissos anuais que promovam a melhoria do desempenho ambiental das explorações. Neste âmbito, na sequência dos trabalhos que têm vindo a ser desenvolvidos desde 2001, a ADVID propôs a introdução de um eco-regime de apoio à “utilização de métodos alternativos aos pesticidas de síntese”, onde se inclui a substituição dos insecticidas pela prática da confusão sexual.

No que respeita aos modos de Produção Integrada (PRODI) e Agricultura Biológica (BIO), destacámos a sua importância para a promoção e melhoria contínua das práticas agrícolas sustentáveis e para o efeito positivo que estas práticas têm a longo prazo nos ecossistemas, alertando para a absoluta necessidade da manutenção de compromissos plurianuais de 5 anos nestas duas intervenções como único modo de credibilização de todo o processo produtivo. Realçámos também a importância de assegurar a manutenção do apoio à assistência técnica prestada por associações de agricultores, uma vez que, demonstradamente, esse apoio garante uma rápida transferência e adopção das inovações e avanços do conhecimento científico e das tecnologias, pela proximidade que estabelece entre técnicos e agricultores, independentemente da sua dimensão e capacidade financeira, na implementação destes modos de produção. Esta abordagem tem evidentes e demonstrados impactos, a nível nacional e europeu, no uso de soluções baseadas na natureza, na preservação e melhoramento dos ecossistemas agrícola e circundante, na preservação e valorização do capital natural, da biodiversidade e da natureza, o que contribui para os compromissos nacionais em termos das estratégias europeias, mas também a nível da Convenção para a Biodiversidade (CBD) e dos Acordos de Paris (UNFCC).

Com intuito de promover a economia circular e a fertilização orgânica nas explorações, defendemos o alargamento deste eco-regime à reutilização de subprodutos da actividade vitivinícola. No que respeita às práticas promotoras da biodiversidade defendemos a extensão do apoio a outras infra-estruturas ecológicas de capital importância para a viticultura, sobretudo no contexto dos territórios de baixa densidade e de montanha, para além das inicialmente previstas.

Eixo B- Programa Nacional de Apoio ao Sector Vitivinícola

Inclui-se nesta intervenção o programa VITIS, programa da maior importância para a modernização da vitivinicultura nacional. No âmbito deste programa, numa perspectiva de contribuir para a diminuição da pressão fitossanitária em novas plantações e, assim, continuar na redução da utilização de produtos de protecção, existindo conhecimento, tecnologia e regulamentação disponível para o sector, foi proposta uma majoração do apoio às plantações que utilizem material vegetal submetido a termoterapia (TAQ), em linha com a mais recente legislação nacional aplicável, que regulamenta o tratamento de material de propagação de videira por imersão em água quente.

Numa perspectiva de adaptação e aumento da resiliência dos sistemas vitivinícolas às alterações climáticas e de preservação do património genético autóctone nacional, fonte do valor, qualidade e identidade dos vinhos portugueses, a plantação de vinhas com material certificado policlonal deverá ser incentivada através de uma intervenção específica para este efeito, no cumprimento das normativas mais recentes da OIV sobre este assunto bem como, da recente legislação nacional aplicável, que estabelece os procedimentos para o reconhecimento oficial da certificação voluntária de material de propagação de videira policlonal.

Eixo C- Compromissos Agro-ambientais e Clima

No âmbito destas intervenções de carácter plurianual, foram propostas duas intervenções que apoiem os viticultores na manutenção do património paisagístico e genético da viticultura nacional, através de um apoio à conservação e manutenção de vinhas tradicionais e de um apoio ao uso das variedades de videira autóctones, assim como de material policlonal. A importância da manutenção de um apoio à prática de enrelvamento de culturas permanentes, ao uso eficiente da água foi também reforçado, na sequência de todo o trabalho e conhecimento científico gerado nas últimas duas décadas pelo sector académico nacional e que importa transferir para executar a urgente adaptação da viticultura às alterações climáticas e, assim, aumentar a sustentabilidade e resiliência das práticas agrícolas.

Eixo D- Investimentos na Exploração Agrícola

O Investimento na Exploração Agrícola é fundamental para a modernização do sector vitícola com vista à promoção da sustentabilidade e garantindo a sua competitividade. Nessa perspectiva, os investimentos em novas tecnologias e equipamentos é fundamental para assegurar a transição digital e uma gestão agrícola e dos ecossistemas suficientemente granular para permitir equilibrar a rentabilidade económica com a conservação da biodiversidade e dos ecossistemas. Assim, deverá ser apoiado de forma diferenciada, pelo que as taxas de apoio propostas deverão ser revistas sob o risco de poderem não ter um carácter incentivador.

A medida de Investimentos não Produtivos é fundamental para a recuperação dos socalcos do Douro e outras estruturas ecológicas e paisagísticas de elevado valor ambiental, com grande importância na preservação do património paisagístico, mas também na promoção da biodiversidade   e na diminuição dos riscos de erosão , motivo pelo qual foi proposto o reforço dos montantes desta intervenção assim como a abertura de concursos regulares, que possam permitir um acesso equitativo a todos os viticultores.

O PEPAC é o principal instrumento comunitário disponível para o sector vitivinícola no período 2023-2027, pelo que consideramos que a proposta apresentada carece de maior reflexão e de uma revisão específica para colocar o conhecimento técnico e científico mais recente na base das decisões políticas a implementar. Entendemos que apenas desta forma será possível atingir os objectivos estabelecidos na estratégia Farm-to-Fork, equilibrando a conservação da Natureza com a protecção das comunidades rurais e a viabilidade económica das explorações agrícolas que as suportam, promovendo uma verdadeira sustentabilidade do sector vitivinícola nacional.

O artigo foi publicado originalmente em ADVID.


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