Oito comunidades intermunicipais (CIM) criticaram hoje a carta de Perigosidade de Incêndio Rural, que consideram desajustada aos territórios e exigiram ser ouvidos na elaboração de um novo mapa que não contribua para a desertificação do interior.
As comunidades intermunicipais foram hoje ouvidas no parlamento, a pedido do PSD, sobre a Carta de Perigosidade de Incêndio Rural, um instrumento nacional para planeamento das medidas de prevenção e combate a incêndios rurais e que estabelece condicionamentos às atividades nos espaços rurais, mas que tem merecido contestação de autoridades locais, sobretudo autarcas, levando à discussão de alterações à lei, publicada em 28 de março de 2022.
Os responsáveis pelas CIM foram unânimes em saudar a “suspensão” da carta de perigosidade, considerando haver “situações que têm que ser clarificadas”, com Luís Marques, em representação dos autarcas das Beiras e Serra da Estrela, a alertar para as condicionantes nas áreas de elevada perigosidade definidas “sem atender às especificações do território”.
“As entidades sub-regionais e os autarcas têm que ser ouvidos”, acrescentou o presidente da CIM de Viseu, Fernando Ruas, manifestando a preocupação de que a carta, nos moldes em que foi aprovada, possa “ser um fator para aumentar a desertificação”, face às proibições de edificação em solo rústico nas áreas de perigosidade elevada ou máxima.
Uma preocupação secundada pelo representante da CIM de Aveiro, que lembrou aos deputados que 75% do território desta região está em concelhos serranos, e pelo representante da comunidade de Coimbra, José Rolo, que aludindo aos incêndios de 2017, “que já castigaram fortemente” a região, alertou que aquela zona não pode ser duplamente castigada com as condicionantes geradas pelas áreas de prevenção e segurança.
Dando o exemplo de concelho de Oliveira do Hospital, que “passa todo a vermelho”, José Rolo alertou que, quer neste, quer noutros concelhos do país, a carta pode “provocar o aumento da perigosidade”, originando desinvestimento na área do turismo, da edificabilidade, da agro-pecuária e da agricultura”.
Em representação da CIM de Leiria, Paulo Batista Santos lembrou que o país, que tinha cerca de 32% do território considerado de elevado risco, passou, com a nova carta, a ter concelhos em que as áreas de risco sofreram “um acréscimo significativo”, dando os exemplos de Castanheira de Pera “que passou de 16 para 89%; Figueiró dos Vinhos de 16% para 90% e de Pedrógão Grande de 32 para 85%”.
Valores que levaram Paulo Batista “a concluir que o modelo [da carta] foi baseado apenas e só nas ocorrências passadas [os incêndios de 2017], sem olhar para o território e aquilo que são as evidências hoje”.
A mesma crítica foi verbalizada pelo líder da CIM da Beira Baixa, João Carvalhinho, apontando o caso de Oleiros, com 93% do território considerado de elevado risco, o que “é quase como fechar o território” a qualquer investimento ou atividade.
Para os representantes de todas as CIM é necessário “alterar a metodologia” de elaboração da carta de perigosidade e adaptá-la a cada município, admitindo “alguma flexibilidade”, acrescentou a presidente do Médio Tejo, Anabela Freitas.
Na região que tem “85% do território pintado de vermelho”, a responsável alertou para o facto de que, nos períodos de risco máximo de incêndio, as duas brigadas de sapadores florestais “nada poderem fazer” ou, ainda, de não poderem ser utilizados “investimentos que foram feitos em passadiços, ou percursos pedonais em espaços florestais”.
Concordando que a carta de perigosidade é um instrumento fundamental, o secretário executivo da OesteCim salientou que “irá condicionar todos os investimentos no território” e que, sem olhar para esta variável, irá estar-se a olhar para este instrumento de uma forma muito vertical sem perceber o alcance que a medida pode ter.
Daí “a necessidade de aferir correções em função da realidade territorial”, disse ainda Paulo Simões, subscrevendo o apelo dos autarcas para serem ouvidos na definição de uma carta mais adaptada à realidade nacional.
Estes foram também argumentos subscritos pelo PSD, que pediu as três audições de hoje e que reiterou importância de o Governo “trabalhar com os municípios”.
O PS, pelo seu lado, reiterou que está disponível para corrigir e aperfeiçoar este instrumento, salientando que a Carta de Perigosidade de Incêndio Rural foi elaborada segundo critérios internacionais e com o suporte científico de entidades como a Direção-Geral do Território (DGT) e a Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF).
Por último, o Chega considerou não estar claro que a carta se encontra suspensa, pedindo ao Governo que clarifique a situação.