Carlos Guerreiro estava a tomar café minutos antes de viver o pior dia da sua vida. Passou mais de quatro meses em coma, e oito sem ver o filho que entretanto nascera. Hoje, não vê um só culpado pela situação, mas confessa a mágoa com o Presidente da República e o primeiro-ministro
Carlos Guerreiro estava a tomar café minutos antes de viver o pior dia da sua vida. Lembra-se daquelas três horas como se fosse hoje, e conta-nos como lidou com tudo o que se passou desde então
“Assisti ao primeiro incêndio com os meus próprios olhos, enquanto bebia café”. Esta é uma das últimas lembranças de Carlos Guerreiro do fatídico dia 17 de junho. Foi uma das vítimas mais graves da tragédia de Pedrógão Grande, onde 66 pessoas perderam a vida, tornando aquele no incêndio mais mortal da história de Portugal.
À CNN Portugal, e quatro anos e meio volvidos, Carlos Guerreiro conta tudo o que se passou naquele dia, e como a sua vida tem sido de sofrimento desde então.
Perto da estrada da morte, a estrada do milagre
O relógio marcava as 14:15 do dia 17 de junho quando Carlos Guerreiro foi beber um café, na zona da Tujeira, perto do Senhor dos Aflitos, em Pedrógão Grande. Era um dia de calor anormal, e marcaria o início de uma semana aterradora na zona.
Por volta dessa hora já havia relatos de fogo, e foi no café onde estava, à altura com 44 anos, viu as primeiras chamas: “Assisti ao primeiro incêndio com os meus próprios olhos, enquanto bebia café”.
Da casa onde estava a residir recebeu uma chamada a pedir socorro. Foi imediatamente para lá com o irmão da companheira, e, chegado ao local, disseram-lhe que tinha de acompanhar o cunhado e um outro homem a uma zona de exploração de madeiras. É que o dono da propriedade queria verificar que estava tudo bem com o produto. Nessa altura, já as chamas percorriam grande parte da zona.
“Andei a passear no meio dos incêndios”, conta, referindo que não estava fardado, até porque não estava ao serviço.
Com o avançar das chamas, os três homens meteram-se num jipe para fugir do local, mas acabaram por ficar encurralados. Segundo Carlos Guerreiro, o cunhado e o outro homem conseguiram fugir, mas ele ficou preso, no lugar do pendura, uma vez que a porta não abria.
Lá conseguiu galgar para o lugar do condutor, e daí sair para o meio da mata, na estrada que liga Troviscais a Mosteiro, perto do IC8.
Eram cerca das 17:00 quando o homem conseguiu chegar à estrada, na altura já completamente cercada pelas chamas: “Corri cerca de 400 metros debaixo de fogo sem saber se saía de lá, mas sempre na esperança de conseguir”, diz.
Não muito longe dali, na Estrada Nacional 236-1, 47 pessoas perderam a vida. Essa via ficou conhecida como a estrada da morte. Para Carlos Guerreiro, aquela via percorrida pelo fogo, foi a “estrada do milagre”.
“Só consegui salvar os pés e os genitais. De resto foi tudo até ao osso”, refere, lembrando os 85% do corpo queimado com que chegou ao hospital.
Sem saber onde estava, conseguiu chegar a uma zona com menos fogo, e acabou por se sentar numa pedra: “Nem sei o que sentia”, admite, falando numa mistura de dores e de adrenalina por toda a situação.
Passados 15 a 20 minutos de estar ali chegaram os bombeiros, que rapidamente o socorreram. Foi uma ambulância da corporação de Pedrógão Grande que o levou para a helipista de Figueiró dos Vinhos, de onde estava programado sair de helicóptero para o Hospital de Coimbra. No entanto, uma emergência relacionada como criança acabou por lhe trocar as voltas, e acabou por ser transportado de ambulância até ao hospital. É nessa altura que tem a última lembrança daquele dia: “Estava agarrado à […]