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Cresce o interesse dos investidores pelo setor agro-alimentar

Porque cresce o interesse da parte dos investidores no empreendedorismo agroalimentar?

O setor agroalimentar tem despertado interesse do mundo financeiro com entrada de investidores no setor. Cada vez mais se ouve falar de fundos de investimento a investir em explorações agrícolas na zona do Alqueva, e de startups deste setor que angariam investidores para apoiar os seus planos de crescimento.

Porquê esta tendência? São um conjunto de fatores que tornam este setor apetecível. Senão vejamos:

É um setor com grandes desafios de sustentabilidade e em que quase tudo tem impacto, positivo ou negativo, na natureza.

Nos últimos anos, como consequência de uma crescente preocupação por temas relacionados com a sustentabilidade e boas práticas de gestão nas sociedades, temos vindo a assistir ao crescimento da estratégia de investimento designada por “ESG” (Environment, Sustainability and Governance), que de uma forma simplificada visa garantir que os fundos investidos por instituições de investimento e financiamento nas empresas é utilizado para promover impacte positivo na sociedade, ambiente e economia e não visam apenas o retorno financeiro da empresa e nos seus acionistas. Na verdade, as tendências do lado do consumidor e a cada vez maior atenção dada a estes assuntos por parte dos decisores económicos, até nas decisões de compra do dia a dia, levam a que se consiga justificar mesmo a longo prazo que esta política de impacto produzirá retornos económicos positivos para os investidores.

O crescimento acelerado desta tendência leva também a alterações ao nível da escolha por parte dos investidores relativamente aos ativos onde investir, com maior interesse por setores em que estes efeitos são mais visíveis e fáceis de medir. Dos setores que se tornaram mais apetecíveis para investimento com estes critérios, estão por exemplo a energia, economia circular, economia do mar, água e recursos naturais e o setor agroalimentar que abrange desde os temas ambientais (emissões de CO2, utilização de químicos potencialmente perigosos, promoção ou não de circuitos curtos e comunidades locais, etc.), aos temas da saúde, bem-estar e da  segurança alimentar, sem esquecer a pegada de carbono na distribuição ou a utilização correta ou incorreta de resíduos agrícolas e florestais. Ou seja, trata-se de um setor onde o potencial de aplicação de fundos que contribuam de forma direta para a “Sustentabilidade” é elevada.

É neste enquadramento que o setor agroalimentar surge como um setor onde se verifica um crescente interesse de aplicação de capital por parte de investidores. Esse interesse é ainda enquadramento numa agenda política favorável relacionado com a estratégia europeia “Farm-to-Fork” ou o Pacto Ecológico. Um investidor que pretenda efetivamente implementar uma estratégia de investimento de impacte dificilmente poderá evitar este setor, em mudança acelerada e onde por definição surgem oportunidades de investimento.

O investimento de impacte também acaba por contagiar o segmento de empreendedorismo, havendo cada vez mais investidores em startups interessados em procurar oportunidades de investimento em novos projetos empresariais no setor agroalimentar que contribuam para o impacte.

É um setor com grandes mudanças em curso ao nível dos hábitos de consumo

Quando falamos em empreendedorismo e startups no setor agroalimentar, mais facilmente consideramos o mais visível setor normalmente designado de “Food Tech”, onde se consideram projetos que se enquadram nas grandes tendências internacionais de alteração de padrões de consumo (vários novos conceitos alimentares resultantes de investigação e inovação, novas tendências de hábitos alimentares, novos modelos de distribuição, novas técnicas de produção e gestão, surgiram nos últimos anos, muitos financiados por investidores de startups) e raramente de uma exploração agrícola “tradicional”. No entanto, ambos podem ser considerados projetos startup, se devidamente enquadrados e aceder aos fundos que poderão ser aplicados pelo tipo de investidores que procura startups de Impacto.

Os investimentos têm segurança fundiária e está em constante evolução e modernização

Ao investir em explorações agrícolas, os investimentos têm a segurança do valor da terra. Com a oferta limitada e a crescente procura, o valor da terra traz uma componente de valorização imobiliária interessante para os investidores. Esta valorização ainda é maior com a introdução e expansão do regadio.

O setor tem feito grandes investimentos e tem sido alvo de modernização tecnológica, o que traz oportunidades de crescimento em valor que obviamente interessam os investidores.

Qual o perfil dos investidores para os negócios em fases de arranque?

No segmento de financiamento de novos negócios, em fases iniciais, atuam normalmente pessoas individuais, não profissionais (normalmente do conhecimento pessoal dos promotores, familiares ou amigos) ou profissionais (grupos de pessoas que investem em startups e se organizam para fazê-lo de forma profissional); mais recentemente em Portugal, vemos o aparecimento de fundos regulados de capital de risco orientados para o segmento de investimento em projetos de raiz, designando-se este setor por “Venture Capital”.

Em qualquer um dos casos, o investidor procura bons projetos, liderados por boas equipas que estejam totalmente alinhadas com os seus interesses e de preferência em projetos que possam contribuir para o referido impacto e com potencial real de saída. Este último ponto é relevante, uma vez que a forma de remuneração do investimento neste segmento de mercado é a mais-valia realizada na venda final das participações sociais a terceiros, o que pressupõe que a empresa tem de ser gerida para se valorizar economicamente; por conseguinte, toda a entrada de capital deve estar devidamente contratualizada e enquadrada num modelo que prevê as condições em que se vai tentar realizar a referida mais-valia para os investidores.

Sendo claro que o setor interessa aos investidores, resta perguntar se o inverso também se aplica, isto é, se os promotores de projetos agroalimentares devem procurar investidores privados para os seus projetos?

Os promotores de novos projetos agroalimentares, seja uma nova marca ou conceito comercial, um novo produto, uma unidade de transformação ou uma nova exploração agrícola, devem recorrer a investidores privados apenas quando acreditem estarem perante uma excelente oportunidade de mercado, terem capacidade para a executar e considerarem a necessidade de ter mais capital nos projetos. Deverão igualmente estar abertos a discutir as opções com novos sócios, que em regra procuram também eles um envolvimento grande com os projetos, em especial nas fases mais iniciais dos mesmos (até aos primeiros anos de entrada em mercado). Este capital normalmente tenta ser um capital “inteligente”, ativo e empenhado em apoiar o desenvolvimento dos projetos, pois tem elevadas expectativas de ganho com o investimento realizado. Trata-se de um capital paciente, disponível para esperar e até preparado para erros e correções que acontecem em qualquer projeto (“pivotting” é o termo inglês que se utiliza quando uma startup falha e se reinventa) mas cuja finalidade última é a realização de uma mais-valia financeira, pelo que existe todo o incentivo para os próprios investidores se envolverem no apoio aos projetos.

Em conclusão, estas novas soluções de capital privado, com crescente interesse por este setor nas temáticas e tendências referidas, podem ser vistas como um complemento financeiro a outras soluções existentes, nomeadamente como uma fonte de contribuição para os capitais próprios das empresas que é complementar a outras soluções de financiamento mais utilizadas, como os apoios da Política Agrícola Comum e o financiamento bancário.

Tiago Vaz Serra

CEO VSM Advisors


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