Acabada de sair de uma recessão histórica, a economia nacional enfrenta uma crise de escassez e de subida de preços que pode demorar meses até ser resolvida
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A bordo dos camiões, de e para as fábricas, as matérias-primas alimentares também acumulam cotações mais calóricas, atingindo os valores mais altos da última década segundo os preços medidos pela Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO). “É uma situação absolutamente inédita, em que há uma conjugação terrível de fatores”, descreve Jorge Tomás Henriques. O presidente da FIPA revela que, desde 2020, se sucedem os aumentos nas compras ao estrangeiro – as subidas de preços de cereais como o milho e das oleaginosas como a soja e a colza ultrapassam em alguns casos os 50%. E, até chegar à prateleira, é sempre a somar: além dos combustíveis e energia, os custos com cartão, alumínio, plásticos ou papelão, essenciais às embalagens, sobem a dois dígitos. No transporte marítimo, suprir as falhas de graneleiros para transbordo de produtos de norte a sul obriga a uma corrida aos camiões e aos motoristas, que escasseiam tal como no Reino Unido. E quem procura contentores para exportação paga seis ou sete vezes mais do que antes. Ou fica a ver navios.
Economia arrasta a âncora
O arranque de 2021 devia ter sido um sinal. O bloqueio do Canal do Suez pelo megacargueiro Ever Given deu o tiro de partida para um ano infernal (e muito lucrativo) para o comércio marítimo. Explosão de preços, atrasos nas entregas, cadeias de distribuição paralisadas, portos congestionados e prateleiras de supermercados vazias. A espinha dorsal invisível da globalização tornou-se um sério obstáculo à recuperação da pandemia. Pouco depois do episódio Ever Given, dezenas de barcos esperavam para descarregarem mercadorias nos portos de Los Angeles e Long Beach. Nos últimos meses, o engarrafamento piorou para mais de 100 cargueiros.
A explicação está no desencontro total entre oferta e procura no transporte marítimo, com indústria e portos ainda não totalmente recuperados da paralisação da pandemia e as famílias dos países mais ricos dispostas a gastarem as poupanças acumuladas na compra de bens. Muitos deles vêm da China, ainda a recuperar da crise, e 90% chegam pelo mar. Com tanta procura, os cargueiros abandonavam portos europeus e americanos sem sequer serem carregados, para voltar o mais rápido possível à “fábrica do mundo”, onde tinham encomendas à espera.
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