Embora o sector agrícola esteja atrasado na digitalização, os novos cultivadores de canábis estão a usar IoT, automação e software analítico para garantirem resultados.
O mercado mundial de canábis legal vai valer 12 mil milhões de euros em 2019, segundo o Brightfield Group, e 80% dessas vendas serão feitas nos Estados Unidos. É aqui, onde metade do país já legalizou o consumo de marijuana para fins medicinais e uma dúzia de Estados permitem também o consumo recreativo, que está o epicentro de uma revolução tecnológica agrícola com potencial para se alastrar a outros cultivos.
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“A agricultura é o sector menos digitalizado de todos”, afirmou David Friedman, CEO da empresa “AgTech” VividGro, durante uma apresentação no 6º Congresso Mundial e Exposição de Negócios da Canábis, em Los Angeles. “Os agricultores ainda não apanharam a onda da tecnologia”, reconheceu. Porquê? É um processo complexo, que exige grandes mudanças, e com custos elevados.
Friedman falava num Congresso em que o espaço de exposição estava cheio de produtos e soluções tecnológicas concebidos para otimizar o cultivo e distribuição de canábis e seus derivados. Sistemas de iluminação LED para promover o crescimento da planta, máquinas compactas de climatização inteligente, secadoras ultrarrápidas para acelerar a produção de cânhamo, havia de tudo entre os expositores. Mais notável ainda, surgiram várias soluções integradas, de software, CRM, dados e analítica, com o propósito de catapultar o cultivo de canábis para o futuro da produção inteligente.
“A maioria da inovação está a vir do espaço da canábis, onde há capital de risco”, explicou Friedman, sublinhando que a agricultura de precisão é a grande tendência do momento. As soluções da VividGro centram-se em SMAA – sensing, monitoring, alerting & automating, dispositivos colocados na estufa que permitem ao agricultor saber tudo o que se passa e otimizar resultados.
“Se num edifício a humidade cair 6% e for um hospital, os doentes não vão morrer por causa disso. Mas se for uma estufa de canábis, vai matar várias plantas”, descreveu Friedman, exemplificando o quão crucial é ter informação precisa sobre as condições exatas em todos os momentos. Com investimentos avultados na produção de marijuana, em que as plantações facilmente atingem milhões de euros de custos, a perda de plantas por causa de alterações mínimas na humidade ou luz é um problema que todos querem evitar.
O importante, explicou Friedman, é conseguir dados fidedignos para a monitorização em tempo real e analítica subsequente. E isso, sublinhou, “tanto vale para canábis como para folhas de alface.”
Antes de se lançar de cabeça no negócio, David Friedman e a sua equipa passaram um ano a falar com agricultores e a tentar perceber do que precisavam e o que queriam. Há uma grande vontade de automatizar funções, mas fazê-lo não é fácil, concluiu. “O principal problema que vemos é que os agricultores escolhem os fabricantes das máquinas antes de pensarem na automação”, revelou o responsável. “E depois, não conseguem extrair dados delas.”
O ideal é obter sistemas com fluxo de informação bidirecional e interoperável, mas tal não acontecerá se os utilizadores não protestarem. “Não vejo isso a acontecer tão rápido como necessário”, afirmou. “Os fabricantes vão querer sempre verticalizar os seus sistemas.”
IoT em explosão
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Numa estufa de canábis que tinha investido 70 mil dólares (62 mil euros) em luzes LED, um apagão que durou cinco dias arruinou tudo o que estava plantado, totalizando um milhão de dólares (895 mil euros) de prejuízo. Noutra plantação, o fornecimento de água foi interrompido e as plantas esturricaram sob as lâmpadas. Se tivessem sensores ligados a um sistema de alertas, estas perdas teriam sido evitadas. São situações extremas, mas espelham a importância que a Internet das Coisas (IoT) pode ter num negócio com margens tão elevadas, pelo que a utilização de sensores e sistemas que agregam os dados recolhidos por eles está em explosão no mercado da canábis.
Foi isso que deu origem à GrowFit Analytics, fundada para servir o sector agrícola com foco na canábis. O presidente da empresa, Leighton Wolffe, deu os exemplos de perdas durante o Congresso de Negócios em Los Angeles para ilustrar a importância da IoT na plantação do futuro.
“A nossa abordagem é reunir todos os dados numa plataforma unificada”, descreveu, referindo que a GrowFit Analytics se conecta aos sensores e ao próprio equipamento. O sistema agrega dados de múltiplos dispositivos, estrutura-os, analisa-os e apresenta-os conforme as necessidades de quem está a olhar para eles, porque o agricultor, o gestor da operação e a equipa de gestão querem todos ver a mesma informação apresentada em ângulos diferentes.
“Os agricultores gostam de fazer experiências”, indicou, descrevendo como o sistema pode ser usado para aperfeiçoar o cultivo minimizando os riscos. “Tentam uma coisa na estufa A e outra na estufa B e depois vão querer analisar os dados quando chegar a hora da colheita. Estão a entrar em território interessante no que toca a ciências ambientais e biociências”, considerou.
No entanto, segundo referiu Leighton Wolffe, um dos principais problemas que a GrowFit encontra entre os agricultores é a utilização de múltiplos subsistemas que não comunicam. “Não conseguimos aceder ao equipamento da plantação em tempo real”, afirmou, referindo que este é um dos pedidos mais frequentes entre os cultivadores. Tal como David Friedman, o responsável acredita que terão de ser eles a insistir com os fabricantes para mudarem este estado de coisas e passarem a fornecer interfaces aplicacionais abertas. Porque a tentação será sempre blindar os seus sistemas de forma a “prenderem” os clientes.
Dada a proliferação de soluções que estão a surgir, isto continuará a ser um problema. No mercado da canábis, o ciclo começa no sistema de controlo de climatização e software que regista a operação desde a semente até à venda na loja, passa por testes de laboratório, software de ponto de venda e distribuição e termina na fidelização dos consumidores finais e construção da marca.