Desafios da segurança alimentar para o sector avícola – Manuel Chaveiro Soares

Nas minhas primeiros palavras seja-me permitido expressar o meu reconhecimento pelo honroso convite que me foi dirigido pelo Senhor Presidente do Federação Portuguesa das Associações Avícolas (FEPASA), Senhor José António dos Santos, para representar tão prestigiada Federação neste Fórum consagrado à Segurança Alimentar e oportunamente promovido pela Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (APIFARMA), que felicito por esta iniciativa.

É no domínio dos riscos biológicos que se centram os maiores desafios no âmbito da segurança sanitária dos produtos avícolas – ovos de consumo e carne -, se bem que sejam os riscos químicos que estão na origem dos fenómenos mais mediáticos. E, como risco biológico mais saliente entre nós, ressalta a salmonelose, que os Avicultores Nacionais têm prevenido com êxito assinalável, que se traduz nas baixíssimas prevalências detectadas, nomeadamente no corrente ano.

Na verdade, o Sector Avícola Português tem actuado eficazmente no âmbito da biossegurança, adoptando medidas profilácticas correctas e rigorosas, conducentes a um declínio notável dos riscos de origem biológica, com sublinhado paro a salmonelose. De salientar a estreita cooperação estabelecida, nesta matéria, entre o Sector Avícola, a Indústria de Alimentos Compostos poro Animais e a Direcção Geral de Veterinária, o que terá indubitavelmente concorrido para o sucesso alcançado em Portugal.

Concretamente, no que às galinhas reprodutoras pesadas diz respeito, em 2009 registou-se positividade em um só bando e, no 1º semestre de 2010, não se detectou um só caso positivo de salmonelose.

Aliás, na área da multiplicação avícola, a excelência da qualidade sanitária – conjugada com elevados desempenhos reprodutivos e economias de escala – confere apreciável competitividade a algumas empresas portuguesas, tanto no espaço da UE como em países terceiros. Na decorrência desta situação, as exportações de aves do dia e de ovos de incubação têm vindo a assumir uma importância crescente, contribuindo assim para atenuar o acentuado desequilíbrio da nossa balança comercial de produtos agrícolas. Paralelamente, nos frangos de carne tem-se vindo o observar um decréscimo assinalável da prevalência de salmonelose, sendo que em 2010 encontramo-nos muito próximo do objectivo proposto para a UE, ou seja, 1 % de bandos positivos.

No respeitante aos ovos de consumo, os resultados obtidos em 2010 denotam também uma melhoria muita significativa, situando-se actualmente bastante baixa a prevalência registada no efectivo nacional.

Quanto aos resíduos de antibióticos e de coccidiostáticos, a leitura dos relatórios respeitantes ao Plano Nacional de Controlo de Resíduos revela que, nomeadamente nos últimos anos, os contaminantes detectados em produtos avícolas são em número muito escasso, Concretamente, em 2008 importa realçar a existência de um diminuto número de amostras não conformes, devido mormente à presença de anticoccídeos. Neste capítulo parece pertinente analisar o caso particular do coccidiostático nicarbaniza, para compreendermos a situação incómoda em que os Avicultores Portugueses têm desenvolvido o sua actividade. Efectivamente, a nicarbazina é um aditivo incorporado habitualmente nos alimentos de iniciação administrados a frangos de carne, devido à sua eficácia como caccidiostático. Acontece, porém, que se trata de um aditivo altamente electrostático, e, adicionalmente, é fácil encontrar partículas de alimento de iniciação na cama, quando se levantam as linhas dos comedouros antes da apanha dos frangos destinados ao matadouro. Nestas circunstâncias, não raras vezes detectam-se no laboratório concentrações diminutas de nicarbazina nas aves abatidas. A legislação, porém, não obstante estabelecer Limites Máximos de Resíduos em espécies não-alvo, para atender a contaminações cruzadas decorrentes nomeadamente das características electrostáticas da nicarbazina, ainda não contempla o caso da espécie-alvo, o frango de carne. Mas, finalmente, no passado dia 16 de Junho, considerando os estudos científicos realizados nos últimos anos, foi votado por unanimidade o Reg. (CE) N° 2430/ 1999, que não só estabelece lMR para a nicarbazina em frangos de carne como suprime o período de segurança. Falta ainda, porém, que o referido regulamento seja publicado, o que se presume venha a acontecer nos próximos semanas. Até lá mantém-se a situação embaraçoso anteriormente referida.

Em suma, e no que respeita ao Sector Avícola Português, parece-nos lícito relevar a elevada segurança sanitária dos respectivos produtos. Será talvez interessante acrescentar duas notas, referentes a temas susceptíveis de interessar os cientistas da área da saúde pública: a primeira para realçar que, no Congresso da AVEC, realizada no passada dia 25, foi apresentado um estudo que mostra que o decréscimo da prevalência de Solmonelfa que se tem vindo a registar nos bandos não foi acompanhado por uma diminuição de salmonelose nos humanos; o segundo para anotar que, em Portugal esta prevalência em humanos foi sempre relativamente baixa.

Adicionalmente, e não obstante os condicionalismos e obstáculos que afectam o produção animal em Portugal, o nosso Sector Avícola distingue-se pelo contributo que tem dispensado paro o auto-aprovisionamento do País em produtos avícolas e, inclusivamente, conforme anteriormente mencionado, nos últimos anos tem alcançado uma posição meritória no domínio da exportação, especialmente no âmbito da multiplicação avícola.

Actualmente, a situação mais gravoso deriva dos produtos avícolas importados de países terceiros, onde as condições de produção são distintas das impostas na UE, nomeadamente no que concerne ao uso profiláctico de produtos antimicrobianos, que actuam como promotores do crescimento; de acordo com o Relatório de Sistema de Alerta Rápido, em 2007 a esmagadora maioria das notificações respeitaram contudo a crustáceos contaminados importados pela UE.

Da referida disparidade de critérios sanitários resultam inconvenientes:

i) para a saúde dos consumidores europeus, devido às resistências bacterianas decorrentes do uso, nos países terceiros, de antibióticos administrados de forma contínua, como promotores do crescimento;

ii) para a competitividade dos avicultores europeus, que deste modo são expostos a uma concorrência desleal (cuja distorção é, acrescente-se, ampliada por condicionalismos europeus mais rigorosos nos domínios do ambiente, do bem-estar animal e, também, no âmbito social).

Como nota final, gostaríamos de referir que estamos a participar num Fórum sobre Segurança Alimentar, supostamente referente à segurança sanitária dos alimentos. Mas, será talvez oportuno que nós, Europeus e em especial os Portugueses, nos preocupemos também com a segurança alimentar em termos de abastecimento e de independência: uma temática que assumiu especial relevo na crise de 2008 e que se mantém actual, considerando, por um lodo, o aumento do consumo de alimentos no mundo, por outro, as crescentes restrições e condicionalismos impostos à produção de alimentos na UE, com sublinhado para os de origem animal, e, por último, O desequilíbrio da nossa balança de produtos agrícolas, na ordem dos três mil milhões de euros por ano. Constitui motivo sério de reflexão o facto de, nos últimos anos, enquanto em Portugal se vem adensando a rede burocrático em torno da actividade pecuária, a maior potência exportadora da UE (Alemanha) tem criado condições propícias à expansão da sua produção animal, de modo o tornar o país cada vez mais competitivo também neste domínio, constituindo motivo de preocupação para os produtores tradicionais da UE, que por esse motivo se vêem abrigados a diminuir a produção.

Na nossa opinião e depois de termos atingido um nível seguro no plano sanitário, seria pertinente que os intervenientes na fileira avícola, quer do Sector Empresarial quer do Governo, reflectissem sobre o possibilidade de se melhorar ainda mais a competitividade do Sector Avícola Português – mormente através da redução dos custos burocráticos, da adequação da legislação laboral e de um relacionamento justo com a grande distribuição, pois o aludido Sector apresenta potencialidades para dispensar um contributo ainda maior ao desenvolvimento económico e social do nosso País

Manuel Chaveiro Soares
Federação Portuguesa das Associações Avícolas (FEPASA)

Quem ganha com alarmismos infundados? – Manuel Chaveiro Soares


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