Dualismos agrícolas mas sempre para o lado dos mesmos – João Dinis

Estrutura fundiária
O primeiro e mais básico de todos os “dualismos” na(s) nossa(s) Agricultura(s) é aquele que se expressa através da pequena e da grande propriedade. É o minifúndio versus o latifúndio. Temos uma estrutura fundiária profundamente dual. Uma minoria de latifundiários detém enormes áreas de terras e uma larga maioria de pequenos de médios proprietários detém comparativamente muito menos. Foi e é a histórica dualidade Norte-Sul.

Mas hoje também já há uma outra dualidade fundiária, ainda “jovem” e não completamente estruturada enquanto plena propriedade privada, mas já operativa, já com as raízes no terreno. É aquela dualidade em que se estrutura – se explora – a Floresta Industrial (eucalipto) também no Centro e Norte. E vai pelo mesmo caminho (mais lento) o esboço que já avança com a realização do Cadastro Predial em alguns concelhos.

Portanto, minifúndios e latifúndios, acabados ou em formação – eis pois um problema com que nos defrontamos permanentemente em todo o País.

Dualismos financeiros – privilégios políticos
Com a entrada de Portugal na então CEE, a seguir com o advento da União Europeia e com a entrada da PAC e das suas variantes na nossa Agricultura, institui-se um outro dualismo:- os maiores proprietários, a grande agro-indústria e o grande agro-negócio abocanharam a grande, grande parte dos fundos públicos, nacionais e comunitários, destinados à Agricultura.

Ou seja, uma minoria de grandes proprietários absentistas mais os detentores da grande agro-indústria “mamaram” – e “mamam” – até à exaustão, nas “tetas” do erário público enquanto que a larga maioria dos verdadeiros Agricultores Portugueses foi condenada – pelo sistema – a ficar-se pelas ”migalhas” da PAC e dos apoios nacionais. E a partir daqui, forjou-se a teoria dos “competitivos” e dos “não-competitivos” – outro dualismo artificial mas também ele de classe.

Para ilustrar melhor, assinale-se ainda que em plena crise financeira e alimentar, o sistema até engendrou processos para atribuir centenas de milhões de euros em subsídios públicos aos maiores proprietários e à grande agro-indústria sem a obrigatoriedade destes produzirem! É uma espécie de rendimento máximo garantido e quer chova quer faça sol… É um crime !

Agora mesmo, nesta última versão da PAC, com uma outra “invenção” – a do “esverdeamento” da PAC – complica-se a vida a quem quer e precisa de produzir e prepara-se o sistema para fazer chegar mais dinheiro público aos bolsos dos mesmos do costume, os grandes proprietários absentistas !

E numa dada fase da política nacional, até houve um ministro que “conseguiu” inventar uma série de caricatas medidas “agro-ambientais” para compor ainda melhor a conta bancária de uns tantos senhores (quase) feudais. Ou já estamos esquecidos disso ?

Acesso à Água e à Terra por parte dos pequenos e médios Agricultores
Entretanto, através de um enorme esforço público – com muitos e muitos milhões de investimento – construiu-se assinalável área de regadios. A água ou a ausência de água. Outro problema.

Neste momento, nos regadios de base pública, o acesso à água por parte dos pequenos e médios Agricultores também está ligado à questão do acesso à terra susceptível de ser regada (ou irrigada). Particularmente até no Alqueva. Sim, deixemos de lado os “hidropónicos” e similares…

Precisamos de utilizar os regadios prioritariamente para produzir pão ( e não tem que ser Milho geneticamente modificado). Não queremos os regadios para produzir eucalipto.

Produzir para alimentar – Prioridade ao mercado interno de proximidade
Precisamos produzir para alimentar a População Portuguesa em primeiro lugar. E aqui reside o pior dos modernos dualismos (para além do da estrutura fundiária de base):- temos um dualismo político e económico com o grande agro-negócio a produzir para a exportação, não importa o quê e ainda menos como é produzido. E nessa actividade delapidadora dos nossos recursos naturais, o grande agro-negócio está a ser super-apoiado pelas políticas públicas dos sucessivos governos, enquanto que, na maior parte dos casos, nem sequer paga impostos dentro de Portugal.

E, em contrapartida, temos a Agricultura Familiar, os pequenos e médios Agricultores, a pequena e média agro-indústria nacional, a serem desprotegidos, discriminados politica e economicamente.

E temos o mercado interno sujeito à “ditadura” comercial dos hipermercados que promovem as importações sem controlo eficaz, que pressionam em baixa os preços à (boa) produção nacional. E temos os mercados locais e de proximidade desclassificados, como “desclassificadas” pretende o sistema que sejam as Pessoas que os frequentam e principalmente os Agricultores.

Ou seja, são necessárias outras políticas agrícolas e de mercados. Políticas verdadeiramente alternativas e não apenas “duais” assim como se fossem o “bem” e o “mal”.

“Cool” também é coisa fria, senhora Ministra da Agricultura…


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