"É urgente cumprirmos o PRR. É uma oportunidade única para a Justiça"

A transformação digital faz parte da sua atividade profissional há vários anos, mas é enquanto secretário de Estado que Pedro Ferrão Tavares enfrenta um importante processo de mudança na Justiça, com o Programa de Recuperação e Resiliência (PRR) a financiar em 267 milhões de euros a digitalização do setor e da investigação criminal. 

Esta verba será aplicada num investimento em plataformas digitais de tribunais, de documentação de cidadãos e empresas, de investigação criminal e forense, de gestão, mas também em infraestruturas e equipamentos tecnológicos. Em entrevista ao Notícias ao Minuto, Pedro Ferrão Tavares fala sobre aquela que “é uma oportunidade única para a Justiça”, que tem “uma necessidade de evolução” e de “modernização”, ainda que Portugal esteja “há vários anos na liderança da transformação digital”.

A Inteligência Artificial é usada para melhorar o acesso à Justiça e para melhorar os sistemas e, nos serviços, o objetivo é “passar a afetar pessoas para tarefas onde acrescentam mais valor”.

Enquanto o novo sistema online de pedidos de nacionalidade permitiu “descongestionar de forma muito significativa aquilo que é o atendimento presencial”, faz notar o governante, o novo Cartão de Cidadão chega já “no último trimestre deste ano” com “todas as funcionalidades” disponíveis. 

E, para “assegurar que as metas são cumpridas”, revela, vão ser assinados dois protocolos, com o Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e com o ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, “para avaliação do impacto do PRR para a Justiça”. 

Portugal, na verdade, é dos países que está já há vários anos na liderança da transformação digital

Sabemos que a Justiça tem 266,9 milhões de euros para aplicar no âmbito do PRR, dos quais, segundo o Ministério, perto de 70 milhões estão já contratualizados ou em procedimentos iniciados, sobretudo para uma transformação digital. Uma vez que essa é a base, gostava de lhe perguntar se Portugal estava muito atrasado, comparativamente a outros países, nesse campo?

Portugal, na verdade, é dos países que está já há vários anos na liderança da transformação digital. É preciso ver que nós, em Portugal, fomos o país do Simplex, que implementou o Cartão de Cidadão, que implementou medidas como a Empresa na Hora, a Empresa Online. As Finanças, a Autoridade Tributária, têm um conjunto de serviços altamente modernizados e digitalizados. Portanto, nós já somos há muitos anos um exemplo dessa transformação. Aliás, fazemos parte do grupo das Digital Nations – um pequeno grupo internacional reconhecido pela sua experiência na área da transformação digital – e, portanto, temos estado sempre na linha da frente desse processo.

Agora, isto não é algo estanque. A transformação digital não se faz por decreto e se diz: ‘Agora transformamos, está feita a transformação e não precisamos de fazer mais nada’. É algo em que temos de trabalhar todos os dias para que aconteça. Termos a certeza que nós acompanhamos quem? Os cidadãos e as empresas, que todos os dias também eles próprios são mais exigentes, porque também utilizam tecnologias de formas diferentes, porque têm dispositivos novos… Nós não podemos dizer que a tecnologia é algo que se utiliza e que as pessoas imediatamente a podem utilizar, porque há barreiras de literacia, porque há barreiras de conectividade e o que é necessário é garantir que há acesso aqui [em Lisboa], mas também há acesso numa aldeia em Trás-Os-Montes, porque é fácil utilizar os sistemas e não há determinadas questões. Porque temos – e algo que é aqui relevante em Portugal – uma autenticação forte, ou seja, quando nós acedemos aos serviços públicos não temos determinados sistemas cuja autenticação seja ou difícil ou pouco segura e temos algo como a Chave Móvel Digital, que hoje em dia já 30% da população tem Chave Móvel Digital ativa, mas que tem de ser ainda mais reforçada. Ora, a Chave Móvel Digital é um objeto de autenticação forte, em que eu posso usar a mesma, seja nos serviços da Justiça, seja na Segurança Social ou até num privado.

Isto para concluir que somos um país que já era um exemplo, com estes múltiplos projetos, com estes múltiplos processos, mas que precisava também de um novo passo e de um novo processo de aceleração dessa evolução, dessa modernização. Por um lado, pela própria exigência dos serviços e depois, por outro, como em muitos destes temas fomos os primeiros, estávamos por esta altura já com a necessidade de atualizar estes sistemas, porque eles já eram muito antigos. Temos de garantir que estes sistemas hoje em dia estão mais atualizados.

Estamos a fazer nesta altura dois protocolos, vão ser assinados na próxima quarta-feira, (…) para avaliação do impacto do PRR para a Justiça

Falava-me aqui da necessidade de acelerar. Pegando nisso e olhando para o prazo para a execução dos projetos, acha que em 2026 todas as medidas estarão concluídas?

Sim. Estou seguro que vamos fazer esse trabalho, por vários motivos. Primeiro, porque nada se faz sem termos um plano. E portanto, o que está no PRR não é simplesmente uma manifestação de uma ambição ou de algo que não esteja associado aqui a algo que esteja agregado, que tenha um objetivo. Nós trabalhamos em dois PRR’s. Um, na área da Justiça, que se chama Justiça Económica e Ambiente de Negócios e, depois outro, na área das Florestas, para o BUPi [Balcão Único do Prédio], o Cadastro Simplificado.

A Justiça Económica e Ambiente de Negócios, que são os tais 266,9 milhões de euros, tem este objetivo de nós, enquanto Justiça, também sermos um catalisador para uma maior eficiência, para uma maior competitividade do país, em que a Justiça contribui de uma forma mais forte para essa competitividade, seja nos Tribunais, seja nos Registos e nas outras áreas também, nas 18 áreas em que trabalha a Justiça. Para isso, nós temos de ter esse plano: saber o que é que vamos concretizar, como é que vamos concretizar, com que meios. Alguns desses meios são externos, mas também internos. Nós temos, nesta altura, processos de recrutamento, pela primeira vez, por exemplo, para o Instituto dos Registos e do Notariado, há 23 anos que não havia recrutamento para este Instituto. Portanto, garantir que temos pessoas novas e as pessoas novas também são agentes de mudança.

Mas também, na área tecnológica, temos pessoas que vão trabalhar nestes sistemas, para perceber como é que o sistema se adequa a determinados cidadãos, a determinada tipologias de público e empresas, mas também temos de capacitar aquilo que são os nossos trabalhadores da Justiça, para que também saibam responder a isto. Não faz sentido fazermos um processo de transição digital se as pessoas não se sentirem parte dessa transição digital. Ou seja, estamos aqui a fazer um processo acelerado de capacitação.

Ainda há pouco terminámos um curso avançado, que chamámos LAB Justiça, que formou cerca de 100 líderes e gestores de projeto, de uma forma totalmente transversal a toda a Justiça, sem qualquer tipo de hierarquia, portanto, as turmas estavam todas juntas, pensadas com duas das melhores universidades portuguesas – com o ISEG e a Nova SBE nesta primeira edição – em que o objetivo foi assegurar que estes líderes vão perceber sobre gestão de mudança, sobre liderança, sobre transformação digital, sobre inteligência artificial, por exemplo. E depois, a parte final, e última componente, é controlo de execução e sabermos que este processo e este projeto está a acontecer.

Portanto, estamos aqui a trabalhar numa lógica de assegurar que as metas são cumpridas, que os processos são executados na data certa e, finalmente, que este investimento não é só algo que fazemos feito não feito.  ‘Ah está o portal feito’ – mas as pessoas utilizam? Mas poupou alguma coisa? As pessoas estão mais contentes por utilizarem? E, então, estamos a fazer nesta altura dois protocolos, vão ser assinados na próxima quarta-feira, com o Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra para a vertente Florestas, na área do BUPi, e com o ISCTE, para avaliação do impacto do PRR para a Justiça.

Portanto, o nosso objetivo é não só dizer que está feito, é trabalhar com estas instituições, na área da investigação, para que elas também nos ajudem a perceber que impacto é que esta reforma está a ter, nestas componentes, na dimensão de simplificação, de poupança, de eficiência, satisfação dos cidadãos e das empresas, atração de investimento, de melhor gestão, ou seja, todas estas dimensões, não só no final, mas ao longo do processo. Para quê? Para se percebermos que no BUPi é preciso alterar qualquer coisa, alteremos agora e não no fim. Se é preciso haver um serviço novo que nós lançámos e que, se calhar, não está a ter tanta adesão que agora façamos uma campanha para ter adesão. Para concluir, é com esta junção desta componente de capacitação, transformação e recrutamento de pessoas e, finalmente, com a componente de medição de resultados que acho que nós vamos cumprir porque de facto temos aqui as condições certas para termos mais resultados.

As pessoas são essenciais, nós não vamos deixar de ter pessoas, nós vamos é passar a afetar pessoas para tarefas onde elas acrescentam mais valor

Falou aí no LAB Justiça e, como disse, já formou cerca de um centena de dirigentes e gestores de projetos do PRR. O projeto não se vai esgotar com o PRR, uma vez que lhe é inerente? Ou seja, é esperado que tenha continuidade? Vai continuar a formar?

É. As duas coisas. Primeiro, é um processo acelerado de capacitação destes primeiros 100, são aqueles que nós chamamos embaixadores de mudança, são os que garantem que esta primeira fase está a acontecer. Nós, nesta altura, já temos na rua perto de quase cerca de 100 milhões de euros entre procedimentos lançados e em contratação do PRR. Ou seja, esses primeiros cem têm que acontecer, mas nós queremos alargar a mais pessoas. Alargar não só a quem está em Lisboa, mas também para os trabalhadores da Justiça que estão fora de Lisboa. E, portanto, vamos ter aqui também, a iniciar dentro de pouco tempo, a continuidade do LAB Justiça para o grupo também de líderes e gestores com universidades fora de Lisboa, esta é uma primeira parte.

A segunda, tem a ver coma capacitação também complementar destes próprios gestores em áreas especificas. Neste primeiro curso era o básico, o essencial, para fazer esta mudança, esta transformação, mas depois estamos a falar de pessoas na área de recursos humanos, de pessoas de tecnologia, juristas, conselhos diretivos, e têm perfis diferentes. E, com esses perfis diferentes, também é necessário pensar em formação adequada para cada um destes perfis. E, portanto também vamos trabalhar, seja diretamente na Justiça, seja em articulação também com a área da Administração Pública, com o Instituto Nacional de Administração, para a formação complementar destes quadros.

E, finalmente, o último ponto: a Justiça tem quase cerca de 10 mil pessoas e temos também de trabalhar na capacitação de todos estes funcionários, em áreas como o atendimento, como a transformação digital, como a simplificação, para que também isto não seja algo que é feito e está aqui apenas nos gestores e nos líderes, não, é algo que está em todas as organizações que a Justiça coordena. 

Portanto, eu diria que isto é algo que não se esgota, pelo contrário, isto é o início. Até porque as pessoas vão sentir, elas próprias, muito mais necessidade de atualizar os seus conhecimentos. O que queremos é que as pessoas sintam que a transformação digital é delas, não é algo que é imposto ou que vem a inteligência artificial e substitui as pessoas, não. As pessoas são essenciais, nós não vamos deixar de ter pessoas, nós vamos é passar a afetar pessoas para tarefas onde elas acrescentam mais valor. 

A tecnologia tem instrumentos para melhor eficiência, mais automatização de tarefas

Das iniciativas já em curso, e além destas que acabámos de falar, quais é que destaca e por que é que o Ministério decidiu dar-lhes prioridade?

Eu diria que nós temos três frentes, também porque a Justiça tem áreas muito específicas. Uma primeira tem a ver com os Tribunais. Portanto, na área dos Tribunais, nós chamamos Justiça Económica e Ambiente Negócios, foi esse o nome que com a Comissão foi identificado, para nós trabalharmos também numa componente em que a Justiça, através do Tribunais, tem aqui uma capacidade de resposta e um acesso à Justiça mais facilitado para os cidadãos e para as empresas.

Na área Administrativa e Fiscal uma das nossas prioridades é também termos aqui um conjunto de iniciativas, um chamado pacote de medidas, que ajuda também a termos uma resposta mais célere nesta área. Nós, nas diferentes áreas, sobretudo na jurisdição comum, estamos com pendências, dependendo das áreas, que já não tínhamos há cerca de 20 e poucos anos, o número reduziu-se muito. Na área Administrativa e Fiscal esse número, apesar de ter baixado, ainda é significativo. E, portanto, nós queremos apostar numa melhor eficiência dessa área. Para isso, o que é que a tecnologia contribui? Contribui porque tem instrumentos para melhor eficiência, mais automatização de tarefas. Vou dar um exemplo. Uma das componentes que obriga e dá trabalho manual é a anonimização da jurisprudência. A jurisprudência são os processos que depois de findos são publicados. Para poderem ser publicados e serem transparentes, têm de ser anonimizados, para que não se saiba de facto quem são os autores, os réus, etc., tudo aquilo que está envolvido no processo. Ora, até este momento, este trabalho tinha de se feito manualmente, havia alguém que tinha de ir aos processos e, manualmente, anonimizar isto, o que fazia com que, muitas vezes, afetasse os recursos para esta tarefa, que é muito repetitiva, ou que, outras vezes, nem disponibilizássemos essa jurisprudência por falta de recursos. Nós temos de ter capacidade, porque esta informação é importantíssima para a transparência, é importantíssima por exemplo para os magistrados, para o juiz quando está a decidir um processo e, portanto, é para nós muito importante que isto seja mais eficiente. Por um lado, libertamos recursos para que esses recursos façam outras tarefas, por outro, também no próprio sistema, termos sistemas que sejam melhorados.

Estamos a trabalhar aqui naquilo que nós chamamos a tramitação digital por definição na área dos Tribunais, garantir que desde que o processo está no Tribunal, aliás, até antes, quando está ainda na componente em ligação ao Ministério Público, e depois quando entra num Tribunal, até quando vai para um Tribunal Superior, toda essa tramitação é digital e que os seus utilizadores utilizam um sistema que não é o mesmo para cada um deles. O que é que eu quero dizer com isto? Nós, como eu referi, fomos um dos países a ter, na área dos Tribunais, sistemas de apoio – o Citius para a área da jurisdição comum e o SITAF para a área Administrativa e Fiscal. O que tínhamos era um sistema que era igual para o juiz para o procurador, para o mandatário, advogado ou solicitador, e para a própria secretaria.

O que estamos a construir agora são chamados interfaces de utilizador. O juiz tem necessidades próprias, tem utilizações próprias, precisa de ter um conjunto de ferramentas que são diferentes, por exemplo, do senhor procurador. E, neste caso, também o mandatário, o advogado ou solicitador, também tem necessidades próprias que muitas vezes precisa de interagir com o sistema. Também nesse caso estamos a desenvolver interfaces próprios.

Na área dos Tribunais é garantir que este sistema é a tramitação digital por definição e temos interfaces próprios para cada um. Também ainda na área do acesso à Justiça a importância dos meios alternativos de resolução de litígios. Nós lançámos, há cerca de duas semanas, aquilo que chamamos a Plataforma RAL +, que é uma plataforma que suporta aquilo que são os meios, passo o pleonasmo, alternativos de resolução de litígios – estamos a falar dos legados de paz, da mediação familiar e da mediação laboral, estamos a falar da arbitragem que virá em junho – são instrumentos que permitem que, em muitos casos, as pessoas possam optar por soluções em que podem resolver os seus conflitos, dependendo do casos, quando são pequenos conflitos, fora dos tribunais. Esta plataforma já foi lançada, o nosso objetivo, a nossa expectativa é que tenha uma utilização também crescente.

Muito do que nós queremos fazer (…) prende-se com esta lógica, esta ideia de a Administração Pública, quando já tem informação, ser proativa e não reativa

Depois, na área dos Registos, estamos a trabalhar, especificamente, naquilo que nós chamamos os ciclos de vida do cidadão e da empresa. O cidadão quando nasce interage com o Registo. Eu registo a minha criança, caso ou divorcio-me, tenho um conjunto de atos, posso mudar o nome, posso mudar o sexo e depois tenho ainda o óbito associado aquilo que é o ciclo de vida. E nas empresas a mesma coisa. Também nestes casos nós estamos a trabalhar, de uma forma muito efetiva, em responder de uma forma mais ágil àquilo que são as necessidades e exigências dos cidadãos. Vou dar um exemplo: o cartão de cidadão, durante muito tempo, por causa da necessidade da sua atualização, tinha uma pressão no presencial, nas Conservatórias e nas Lojas do Cidadão, muito grande, o que nós fizemos, há cerca de ano e meio, foi automatizar a emissão do Cartão de Cidadão. Hoje em dia, o Cartão de Cidadão é emitido automaticamente sempre que expira. Muito do que nós queremos fazer neste processo, no chamado ciclo de vida, prende-se com esta lógica, esta ideia de a Administração Pública, quando já tem informação, ser proativa e não reativa, face obrigar o cidadão a deslocar-se ou a fazer determinadas comunicações que nós Administração Pública já temos.

Ainda em fevereiro lançámos o pedido de nacionalidade online, já disponibilizado para mandatários, que veio descongestionar de forma muito significativa aquilo que é o atendimento presencial associado ao registo, que para nós era muito importante. Vou dar aqui um número: nós detetámos que cerca de 30% do tempo que os funcionários ocupavam a tratar do processo era dedicado a receber o documento, a perceber se o documento era autêntico ou não, a digitalizar o documento e a inseri-lo no sistema. Ora, com o processo de nacionalidade online, nós podemos afetar esses 30% – ainda por cima temos ferramentas que validam se os documentos são autênticos ou não, através de inteligência artificial – para outras tarefas dentro da nacionalidade, o que fazem com que também descongestionem.

Nós temos aqui um compromisso de, no último trimestre deste ano, já termos a entrega dos primeiros [novos] Cartões de Cidadão

Tocou aí em dois pontos importantes e a que gostava de voltar. Primeiro, no Cartão de Cidadão, não sobre a revalidação, mas naquele que também é um projeto do PRR que é o novo Cartão de Cidadão. O Governo tinha anunciado que este novo documento iria entrar em vigor este ano. Já há uma data?

Nós temos aqui um compromisso de, no último trimestre deste ano, já termos a entrega dos primeiros Cartões de Cidadão. O nosso objetivo é, também fruto daquilo que são as obrigações ao nível europeu, um Cartão de Cidadão com tecnologia ‘contactless’, com aquilo que são protocolos e ‘standards’ internacionais e a nível europeu que têm que ser cumpridos. O nosso Cartão já era o Cartão mais seguro do mundo quando foi lançado, nós queremos continuar a ser, portanto, existem novos protocolos que queremos garantir. O que estamos a fazer é assegurar que os Cartões de Cidadão que forem emitidos no último trimestre já refletirão esta nova atualização. Mas só dar nota e reforçar que não implicará que as pessoas tenham de alterar o seu cartão de cidadão nesta altura. De acordo com a data de validade do seu cartão, o seu cartão será substituído por um novo.

Ou seja, quando expirar.

Quando expirar.

Novo Cartão de Cidadão? Vai ter novas funcionalidades, como por exemplo o contactless

Continuando neste tema, qual vai ser a grande mudança face ao documento atual?

Duas componentes. Quando falamos, hoje em dia, do Cartão de Cidadão e, durante muito tempo, o nosso Cartão de Cidadão era um cartão físico e é um cartão físico, sobretudo, estamos a falar da nossa identidade física, o documento que damos quando nos queremos apresentar como um documento de identidade a ele associado, e portanto tem esta componente. Vai ter novas funcionalidades, como por exemplo o ‘contactless’, ou seja, permite que se eu estiver a dar os meus dados, por exemplo quando vamos a uma unidade hospitalar e utilizamos o nosso Cartão de Cidadão para uma fila de espera, não tenha de o inserir no leitor. Automaticamente, sem contacto, pode ser logo lido naquele momento. Temos tecnologia nova, como os nossos cartões de crédito, tem esta componente física.

Mas também dar nota de um trabalho que estamos a fazer na componente digital. Muito do que estamos a fazer em articulação com a Modernização Administrativa é dar mais funcionalidades ao nosso Cartão digital. Hoje em dia, através da app id.gov.pt já temos o nosso Cartão físico de uma forma virtual, já é possível ver aquele cartão e, portanto, pode ser utilizado como o nosso identificador. Tal como nós quando queremos pagar com o cartão podemos pagar com o nosso telemóvel, para nós também é importante que a identidade também esteja disponibilizada nos nossos dispositivos de forma sempre segura, de forma sempre autenticada, com protocolos de segurança avançados e standards a nível europeu. Portanto, muito daquilo que são as novidades do Cartão tem a ver com a componente física, protocolos, documento de segurança europeu, identificação, utilização de uma tecnologia ‘contactless’, como eu referi, e, depois, na componente digital termos cada vez mais capacidade de podermos utilizar e interagir com este Cartão ao nível digital.

E, finalmente, também com um ponto de autenticação, como eu referi a Chave Móvel Digital, que resulta da nossa própria autenticação forte do que é o Cartão de Cidadão, tem nesta altura cerca de 2.8 milhões de cidadãos já com Chaves Móveis ativas. O que nós queremos é assegurar que temos ainda mais pessoas a utilizarem o cartão. Para isso é preciso mais adesões, é preciso mais literacia, temos de trabalhar também em comunicar melhor as vantagens do Cartão de Cidadão, em garantir que é seguro, explicar às pessoas como é que funciona, o que é que deve ser feito, e assegurar que cada vez é mais simples, por exemplo, ativar a Chave Móvel. Hoje em dia por biometria, sem ter de me deslocar a uma Conservatória, posso com o meu telemóvel, com a minha câmara, ativar a Chave Móvel Digital. 

Os leitores [físicos] estão disponíveis nos espaços e são compatíveis com este [novo] Cartão

Estas mudanças implicam o fim dos leitores? Um novo investimento?

Implica uma mudança gradual. Não digo o fim do leitor, mas se reparar, quando nós lançámos o Cartão de Cidadão, para as pessoas poderem usar o Cartão de Cidadão, tinham de ter o leitor. Hoje, enquanto cidadãos particulares, já pouca gente utiliza um leitor físico, porque já não sentem essa necessidade. Mas ainda há os leitores, de facto, nos espaços, eles estão disponíveis e são compatíveis com este Cartão. Portanto, podem ser utilizados com este Cartão. Agora, à medida que também os novos dispositivos, os novos leitores forem evoluindo, também vão ter novas tecnologias, neste caso ‘contactess’, que permitirão que nós não tenhamos de ter um local físico onde inserir o Cartão, que é aquilo que acontece também no caso dos meios de pagamento.

Quando saírem os novos Cartões de Cidadão já estarão disponíveis todas as funcionalidades

E quando saírem os primeiros novos Cartões de Cidadão já estarão disponíveis todas as suas funcionalidades?

Já estarão disponíveis todas as funcionalidades, ou seja, este trabalho, ao nível do que é o Cartão físico, já inclui todos estes protocolos, já inclui esta segurança, já permite tudo isso. Claro que a adesão, por exemplo ao ‘contacteless’ será algo gradual, depende também de cada uma das entidades que interagir. Se eu for a uma unidade hospitalar, se eu for a um banco, se eu for a um serviço público, à medida que esses serviços públicos também eles próprios forem renovando, também vão utilizando essas tecnologias. No caso da componente digital, nunca pararemos. Estas primeiras funcionalidades que temos agora, que eu já aqui referi, são as primeiras, estamos a trabalhar de uma forma articulada enquanto Administração Pública para garantir que temos mais funcionalidades, que temos mais formas novas de interagir com os serviços públicos, utilizando também estes dispositivos. Aí será um trabalho em contínuo. 

Fomos desenvolvendo guias que ajudassem os cidadãos a encontrar mais facilmente informação

Já aqui falámos na Inteligência Artificial e no que a mesma trouxe para estes projetos. Anteriormente, falou mesmo do uso da tecnologia do ChatGPT nos serviços da Justiça. Quais são as potencialidades?

Em primeiro lugar, quando nós falamos em Inteligência Artificial, é importante dividir a Inteligência Artificial ou ‘Machine Learning’ em diferentes usos. Nós temos ‘Machine Learning’ que, muitas vezes, serve para agilizar, automatizar, garantir que tarefas repetitivas não têm de ser utilizadas, como referi há pouco na anonimização da jurisprudência ou no BUPi um algoritmo que localiza as matrizes para que os proprietários não tenham que andar à procura no mapa, perdidos, onde é que está a sua propriedade. Isso são algoritmos que nos ajudam a automatizar e acelerar tarefas, para que não tenhamos de perder tanto tempo e podermos afetar recursos onde podemos acrescentar mais valor, tendo em conta que os recursos são sempre limitados. Esse é um primeiro passo para nós muito muito relevante e é onde estamos a investir, em particular, na área de ‘Machine Learning’ e Inteligência Artificial. 

Depois, também temos de trabalhar naquilo que pode ser uma oferta e disponibilização de serviço público onde isso também possa acrescentar valor. Muito importante aqui, sem nunca substituir aquilo que é o utilizador e, nas outras tarefas, o mesmo, sem nunca substituir o decisor. Em alguns casos, quando estamos a falar de informação, de apenas aceder a informação, de pesquisar, etc, podermos ter ferramentas que nos ajudem. No caso dos cidadãos estamos a falar na mesma lógica. Nós lançámos o Guia Prático da Justiça, que é um projeto do PRR que estava previsto já desde o início do PRR. Ou seja, nós temos a plataforma digital da justiça (justiçagov.pt) onde disponibilizamos um conjunto muito grande informação sobre a Justiça, que é muito heterogénea, são 18 áreas, e às vezes estamos a falar de temas que são muitas vezes relacionados entre si, como é o caso do casamento/divórcio.

Ao longo do portal fomos desenvolvendo guias que ajudassem os cidadãos a encontrar mais facilmente informação. Temos, por exemplo, guias sobre apoio à nacionalidade, no caso do óbito, quando morre um familiar, o que é que as pessoas têm que fazer e onde é que têm de se deslocar, como pedir apoio judiciário, um conjunto de temas muito alargado e estão escritos numa linguagem que seja simples para as pessoas poderem entender. Então vamos usar a tecnologia para que dê uma resposta mais agregada nesse tema e foi aí que apareceu, mais ou menos na mesma altura, a tecnologia associada ao ChatGPT. Nós usamos o mesmo motor mas não aquele interface, até o motor próprio através da tecnologia que está no Azure da Microsoft. Qual é a diferença que tem relativamente ao ChatGPT? Em vez de ir buscar as fontes de informação a qualquer ponto de informação da Internet, vai só buscar fontes de informação às nossas fontes, à Justiça – nesta fase ainda simplesmente ao portal da Justiça e, no futuro, gostávamos que fosse ao Diário da República eletrónico e, eventualmente, outros portais.

O primeiro tema em que trabalhámos foi o casamento e o divórcio. Muitas vezes quando os cidadãos estão à procura de informação sobre o divórcio têm dúvidas. O que fazer, onde recorrer, que passos são necessários? Nós, na Justiça, quando falamos em divórcio, também temos uma oferta diversificada. Eu dependendo do caso, se estivermos a falar de divórcio por mútuo consentimento e não houver menores, eu posso fazer o divórcio no Registo, através do Instituto dos Registos e do Notariado e, hoje em dia, até através da Plataforma de Atendimento à Distância, ou seja, nós lançámos a plataforma em outubro, em que é possível que as partes nem tenham de se encontrar.

Em alguns casos, quando estamos a falar de casos que envolvem menores, posso ter de utilizar por exemplo a mediação familiar, e já estamos a falar dos meios alternativos de litígio. Em casos mais complexos posso ter de recorrer a Tribunais. É nesta oferta, e nesta informação, que sistemas como este podem ajudar a pesquisar. Posso fazer uma pergunta ao Guia Prático da Justiça e perceber um pouco melhor a resposta que a Justiça tem a dar para estes casos. As vantagens que nós temos neste sistema são uma resposta mais agregada, uma resposta em contexto. Portanto, nós construímos esta primeira versão para teste, está em teste, casamento e divórcio, e o nosso objetivo é também alargar a outras áreas, a outros temas, à medida que também formos sentindo que, de acordo com as pesquisa e procura que vamos tendo no portal da Justiça, as pessoas também queiram ter aqui novos guias de informação.

Não acedemos a dados pessoais, não há qualquer disponibilização de dados pessoais, a informação que nós colocamos nas fontes de informação são as que estão disponíveis no portal da Justiça, são totalmente públicas 

Já percebi que houve aqui uma preocupação relativa às fontes de informação, até porque sabemos que a informação errada é uma das questões associadas ao desenvolvimento da Inteligência Artificial e a plataformas como o ChatGPT. Olhando um pouco para estas preocupações e olhando até, por exemplo, para Itália, que decidiu bloquear o ChatGPT por não respeitar os regulamentos da proteção de dados que estão em vigor na União Europeia, o Governo não tem receio que com estas tecnologias possam ser colocadas em causa informações sensíveis do próprio Governo, mas também dos cidadãos?  De que forma é que planeiam mitigar essa questão?

No primeiro ponto, e gostava de clarificar algo que é muito importante, nós não estamos a usar o ChatGPT, porque, precisamente, a nossa preocupação inicial foi: o ChatGPT é um sistema público, que vai buscar fontes de informação a qualquer lado, onde as pessoas podem inserir dados pessoais, onde podem existir dados pessoais. Portanto, não estamos a falar do ChatGPT, estamos a falar do motor de pesquisa que está por trás do GPT, esse motor de pesquisa – a Microsoft é um dos principais investidores desta tecnologia – só utilizando as nossas próprias fontes de informação é que vai buscar esse conteúdo. Estamos a falar em isolar as nossas fontes de informação. Por outro lado, e está exposto em todo lado, nós não acedemos a dados pessoais, não há qualquer disponibilização de dados pessoais, a informação que nós colocamos nas fontes de informação são as que estão disponíveis no portal da Justiça, são totalmente públicas, não há acesso a qualquer base de dados de informação. E, por outro, também não incentivamos, pelo contrário, que as pessoas coloquem dados pessoais na ferramenta e não são recolhidos esses dados. Temos os ‘disclaimer’ relacionados com isso.

Depois uma segunda componente para nós muito relevante que é: a Justiça, desde o início, que está ao nível europeu a colaborar, e Portugal obviamente como país, naquilo que são as disposições europeias ao nível da Inteligência Artificial. Já tinham sido emitidas recomendações especificamente para a área da Justiça, por exemplo, na não utilização de Inteligência Artificial para a decisão, questões e matérias sensíveis em que não utilizamos. Aquilo que está a ser discutido ao nível europeu, que é o regulamento da Inteligência Artificial, todos os Estados-Membros participaram, e que agora se encontra no Parlamento Europeu, também ele próprio reflete essas preocupações. Nós, desde o início, ainda antes de haver este regulamento, tínhamos esta preocupação, de não usar estas ferramentas nem para decisão, nem com utilização de bases de dados e fontes de informação com dados de cidadãos e, finalmente, a preocupação de não recolha de informação nestas plataformas. Iremos respeitar todo o regulamento europeu que vier a ser aprovado, como é evidente.

Plataforma de Atendimento à Distância? Temos cerca de 100 atos

Parece-me que esta era uma questão importante a esclarecer para quem nos vier a ler. Ainda há pouco falou na PAD – Plataforma de Atendimento à Distância (que veio permitir a realização de atos autênticos por videoconferência, como escrituras, divórcios ou habilitações de herdeiros). Já tem alguns dados que possa avançar? Quantos atos há já associados a este sistema?

A Plataforma de Atendimento à Distância nós lançámos em outubro e nasceu da pandemia, num momento em que as pessoas estavam todas à distância e em que não tinham possibilidade de poder realizar atos. Permite que o Instituto dos Registos e do Notariado possa realizar atos de compra e venda de casa, de heranças e partilhas, na área do divórcio. Permite isso e também permite que as Ordens, que têm hoje em dia um conjunto de atos muito significativos – estamos a falar da Ordem dos Advogados, da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução e a Ordem nos Notários – possam usar [essa plataforma].

Nós, nesta altura, estamos a ter um número que está em crescendo utilização. Temos cerca de 100 atos, é um número baixo. Eu gostava que este número fosse maior, sinceramente, gostava que este número fosse maior, mas para isso também é necessária uma comunicação mais eficaz. Portanto, vamos lançar uma campanha de comunicação maior. É uma tecnologia nova e, muitas vezes, as pessoas estão habituadas, em casos como estes, a deslocarem-se presencialmente. Temos também , nós próprios, de fazer um trabalho de comunicação, sensibilização, sobre as vantagens. É algo que nós temos de trabalhar em Portugal, seja na nossa Diáspora. Com as Ordens também estamos a trabalhar com uma sensibilização para que utilizem mais esses serviços e o que queremos é que a plataforma cresça e que estes números cresçam.

Estes, para já, são os atos que temos nesta primeira fase, mas também queremos trazer para a plataforma outros atos que também possibilitem que essa utilização seja maior. Eu diria que, nesta altura, porque lançámos uma plataforma inovadora, estamos ainda com números que queremos que avancem e que daqui a algum tempo já sejam bastante mais significativos, também com uma campanha de sensibilização, uma campanha de comunicação, para que seja um numero mais robusto de utilizadores.

Não estamos a retirar competências, pelo contrário, estamos a dar também mais atos a estes profissionais, agora, num meio diferente

Sabemos que beneficia os cidadãos, mas acha que nestes casos há também um benefício para os trabalhadores? Quando falamos de tudo isto, não abandonamos a mão humana em prol da máquina?

Repare que nós estamos a falar sempre de videoconferência. Não há atos e nunca se realizam atos digitais, são atos por videoconferência. Nós para podermos realizar o ato tem de estar um conservador, um notário, um mandatário a validar que aquele ato de facto corresponde àquilo que está definido na lei. Não estamos a retirar competências, pelo contrário, estamos a dar também mais atos a estes profissionais, agora, num meio diferente. Isso faz parte da tecnologia, a tecnologia de facto vem possibilitar a utilização de novos meios, de novas formas, é inovador, por isso é que eu digo que a gestão de mudança é algo que deve ser feito e que deve acontecer. Mas não estamos a retirar de maneira nenhuma a o papel essencial que o profissional tem num ato como este. Isso é garantido e é isso que obviamente faz do Instituto dos Registos e do Notariado o Instituto que ele é, dando obviamente o rigor jurídico àquilo que são os atos que a fé pública de facto dá.

Não é termos menos pessoas, é termos pessoas nos sítios certos, a fazerem o trabalho certo

Mas, para esclarecer, antes de chegarmos ao momento da videoconferência, hoje já podemos iniciar pedidos sem nos deslocarmos ao Registo.

Aí estamos a falar dos Serviços Digitais. Pedido de nacionalidade, outros processos, iniciar uma empresa, serviços que vamos lançar dentro de muitos poucos dias. Todos esses serviços permitem a sua utilização online. Eu diria que estamos a falar de processos que, muitas vezes, requeriam muito papel, a utilização de ferramentas mais tradicionais, tarefas repetitivas, de trabalho de digitalização… Se nós afetarmos essas pessoas para tarefas onde acrescentam mais valor, as pessoas vão ficar mais satisfeitas e essa é a nossa preocupação. Não é termos menos pessoas, é termos pessoas nos sítios certos, a fazerem o trabalho certo. As pessoas ficarão muito mais satisfeitas por já não terem de digitalizar um documento e passarem o dia a analisar documentos. É essa a nossa preocupação nestes casos de automatização. Não é retirar o papel do humano é dar-lhe tarefas onde eles de facto acrescentam valor.

 Para nós era muito importante, se queremos ter um Registo que transforme, que evolua, que modernize, que tenha de facto novas pessoas

Chegando à questão dos recursos humanos. Está prevista a contratação de 300 profissionais para os Registos e Notariado, uma das mais aguardadas, diria, nos últimos anos. Quando se pode esperar que entrem em funções?

Sim, exatamente. O Regista era das áreas da Administração Pública com uma idade mais avançada, é ainda, atualmente. Para nós era muito importante, se queremos ter um Registo que transforme, que evolua, que modernize, que tenha de facto novas pessoas. Nós temos um processo em curso de contratação de 240 oficias de registo e de 50 conservadores para este ano, mas o modelo é um modelo plurianual, ou seja, nós temos já aqui previsto um conjunto de recursos também a serem contratados nos próximos anos para que haja também esta capacidade de renovação, de uma forma regular, ao longo do tempo.

O processo de recrutamento durante muitos anos demorava quase dois anos. As pessoas tinham de fazer um curso específico, depois faziam estágio, depois entravam no processo e só depois é que começavam a trabalhar. O que nós queremos é, com as necessidades que temos, com aquilo que são os novos perfis associados a este trabalho, que esse processo seja mais rápido. Portanto, vamos lançar o concurso de recrutamento já no início do próximo mês, agora nos próximos dias, esse é o primeiro objetivo, e queremos que as primeiras pessoas tenham uma formação no modelo ‘on the job’, ou seja, tenham uma componente teórica mas também uma componente prática, para que já possam estar fisicamente numa primeira fase já integradas no ambiente. Não quer dizer que seja a realizar atos, muitas vezes é a apoiar, é a assistir, é a aprender, mas já estejam de facto progressivamente nos espaços, nas nossas Conservatórias, nos nossos serviços centrais, a interagir todos os dias com o Registo. Portanto, este processo vai ser um processo muito mais acelerado e ainda este ano queremos que estas primeiras pessoas já estejam a trabalhar connosco. 

E os oficiais de Justiça? Foi recentemente anunciada uma nova greve e têm sido adiadas milhares de diligências. Como é que o Governo está a pensar impedir o agravamento da situação?

Eu não tutelo a área dos Tribunais. 

Já conseguimos, só este ano, mais de 1.500 recrutamentos, uma autorização de 1.500 recrutamentos para a Justiça

Bem sei, mas não podia deixar de lhe colocar esta questão.

Eu tenho os Registos e depois tenho a Tecnologia, a modernização tecnológica de todas as áreas da Justiça. Não tutelo especificamente. Aquilo que posso dar nota é a senhora ministra e o meu colega senhor secretário de Estado Adjunto e da Justiça têm estado a trabalhar também nesse processo, conversando, evidentemente, com as estruturas sindicais, trabalhando naquilo que é a proposta de revisão de carreira. E, portanto, o nosso objetivo é que esse processo tenha uma resposta, durante este ano, como a senhora ministra já anunciou, para que isso também aconteça e também seja possível.

Mas, já agora, dar nota de que, nós, este ano, juntando os profissionais dos Registos, este recrutamento, os novos recrutamentos para a Polícia Judiciária, cerca de 1.100, e na área dos guardas prisionais e também nos 200 Oficiais de Justiça, já conseguimos, só este ano, mais de 1.500 recrutamentos, uma autorização de 1.500 recrutamentos para a Justiça. Portanto, é um número muito expressivo. Darmos nota aqui também deste trabalho articulado e fundamentado que estamos a fazer de reforçar em recursos humanos a Justiça, dos Registos aos Tribunais.

O PRR é uma oportunidade única para a Justiça que nós não podemos desperdiçar

Estes investimentos e ajustamentos de que falámos, na sua opinião, são suficientes? Ou considera que há algo urgente a fazer na Justiça?

Diria que na componente tecnológica, mais do que a componente tecnológica, é urgente nós cumprirmos o PRR. O PRR é uma oportunidade única para a Justiça que nós não podemos desperdiçar. A Justiça tem de facto aqui uma necessidade de evolução, de capacitação, de transformação, de modernização. Modernização não é só investir em computadores, em tecnologia, em sistemas, não, é investir em competências, é investir em novos processos, é investir em simplificação, é investir também numa lógica de mudança do que é que é todo este sistema associado. Diria que a nossa primeira preocupação é garantir que este PRR também ele próprio é um instrumento para a transformação da Justiça.

Quando lançámos o plano de transformação Justiça + a nossa nota foi esta, garantir que há a transformação. Depois também associado, evidentemente, a um processo de modernização das instalações. Ao nível dos Registos nós já fizemos aqui um trabalho muito forte, com um investimento muito significativo, também na área dos Tribunais, recentemente, num Conselho de Ministros em Braga foi anunciado um investimento forte na área dos Tribunais, na área dos Prisionais. Também ao nível de instalações é muito importante que aconteça. E, finalmente, ao nível das pessoas. Nós temos de trabalhar nestas três componentes: Tecnologia, instalações e pessoas. Temos de trabalhar nesta lógica para termos a tal Justiça mais eficiente, um melhor acesso à Justiça e melhor capacidade da Justiça de facto atuar e agir a servir ao cidadão e às empresas.

Os números refletem uma tendência muitíssimo significativa de decréscimo de pendências em todas as áreas

Ainda há pouco referiu que há questões que não são da sua tutela, mas tenho de tocar num ponto que acho que inquieta muitas pessoas. Falo sobre megaprocessos, especificamente sobre a Operação Marquês que se arrasta há anos e José Sócrates pode nunca vir a ser julgado, com o prazo de prescrição a terminar no início de 2025. Enquanto membro do Ministério da Justiça, que resposta dá as acusações de que a Justiça portuguesa se caracteriza por ser lenta? Palavras que não são minhas.

Primeira nota e o primeiro ponto muito relevante tem a ver com as perceções sobre o que é a eficiência da Justiça e os números reais. Como eu referi, nós, na Justiça, temos pendências, nesta altura, com números que não tínhamos desde cerca de 96/97, ou seja, estamos com um número de pendências muito baixo, fruto de um trabalho que temos feito de forma consolidada, de transformação, modernização e de eficiência. O PRR vai ajudar muito a que isto possa acontecer, mas eu convidava a visitar a página das estatísticas e consultar aquilo que são as estatísticas da Justiça para percebermos que, em termos de números, esses números refletem uma tendência muitíssimo significativa de decréscimo de pendências em todas as áreas. É muito importante passar esta mensagem porque a perceção que temos, muitas vezes, não corresponde àquilo que é realidade. Temos questões associadas a processos específicos e áreas específicas em que, de facto, devido à complexidade, à informação, ao conjunto de meios necessários, temos pendências maiores. Decorre dessa área, mas naquilo que é a resposta da Justiça, esses números têm vindo a descer.

Mas, já agora, dar nota que também é pela componente de transformação digital que nós temos de conseguir atuar. Muito do que é o trabalho que temos de fazer na transformação tem a ver com pesquisa de informação. Há processos que têm muita muita informação, muitos documentos associados, que demoram de facto muito tempo a que sejam tratados, a que sejam analisados. Nós temos de dar instrumentos para os senhores magistrados, os senhores procuradores e os senhores juízes possam eles próprios ter mais facilidade em pesquisar informação, em trabalhar sobre os casos, em ter meios para que isso seja possível, em que tenham pessoas, evidentemente, para dar resposta. A nossa preocupação enquanto Administração da Justiça, que é o que nós fazemos, o nosso objetivo, é assegurar que temos meios e damos meios e condições para que quem decide possa ter instrumentos para isso. 

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