Manuel Chaveiro Soares

Economia Circular e Sustentabilidade Ambiental – Manuel Chaveiro Soares

Ao longo do século XX a ciência proporcionou avanços notáveis na produção de alimentos e de fármacos, o que conduziu à eliminação da fome em vastas regiões do mundo e ao decréscimo da mortalidade, especialmente infantil, tendo como consequência um incremento espectacular da população mundial. Mas, por outro lado, emergiram dois problemas que importa resolver: o aumento da prevalência da obesidade e a sustentabilidade ambiental.

A propósito desta segunda questão tem-se registado uma preocupação crescente com a economia circular, constituindo o complexo agro-pecuário da Herdade da Daroeira um exemplo em que se procura dar resposta à preservação do ambiente e, simultaneamente, produzir proteína animal de modo eficiente.

A aquisição da Herdade teve como desiderato primordial a criação de frangos de carne em condições de elevada biossegurança, atendendo a que na região não existia qualquer exploração avícola.

É certo que as aves não iriam ficar expostas a elevados riscos sanitários, mas, por outro lado, a Herdade da Daroeira situa-se numa variante de clima mediterrâneo com o Verão muito quente e seco, desfavorável portanto para o bem-estar das aves e, consequentemente, também para o seu desempenho zootécnico.

Nestas circunstâncias foram instalados painéis evaporativos e ventilação túnel, e aquecimento com pisos radiantes.

Assim, foram construídos nove núcleos avícolas – com seis pavilhões cada – suficientemente afastados entre si para minimizar possíveis riscos sanitários –, com capacidade total para criarem 15 milhões de frangos por ano, sendo os pintos do dia fornecidos pelo centro de incubação que o Grupo tinha construído um ano antes em Serpa, então apenas com vista à exportação para o país vizinho. Considerando as amplas áreas que ficaram disponíveis entre os referidos nove núcleos avícolas e atendendo à existência de quatro barragens na propriedade com capacidade de 8 milhões m3 (entretanto a barragem principal foi reforçada a partir de um adutor da EDIA), foi decidido proceder à cultura do milho-grão, principal matéria-prima utilizada na dieta das aves (representa cerca de 60 por cento do alimento administrado aos frangos de carne, sendo aquele complementado principalmente com bagaço de soja produzido na unidade de extracção de óleo do Grupo Valouro, sita em Torres Vedras).

Para o efeito: i) instalaram-se grandes «pivots» rotativos, viabilizando inclusivé o regadio de terras com bastante declive, num total de 1200 ha; ii) considerando que nos solos em causa predominam as argilas do grupo das ilites, que apresentam baixo poder de retenção para a água e não fendilham, mas todavia a sua estrutura pode ser melhorada através da incorporação judiciosa de correctivos orgânicos, como, por exemplo, estrumes de aviário, no caso em apreço com uma razão C/N próxima de 13; estes, para além de melhorarem as propriedades físicas e biológicas dos solos, fornecem às plantas não só macronutrientes vegetais, como também micronutrientes; esta prática de fertilização orgânica, inserida numa economia circular, tem vindo a ser adoptada na Herdade, o que contribuiu para elevar substancialmente a produtividade da cultura do milho que, ao longo de duas décadas, subiu de 7-8 para 15-16 t/ha.

Tendo em vista reduzir custos de transporte, minimizar riscos sanitários e minorar a pegada ecológica, tomaram-se também as seguintes iniciativas complementares na Herdade: i) instalação de secadores de milho e de amplos silos, tendo em conta não só os cereais produzidos na Herdade, como também o milho adquirido a agricultores da região; ii) construção de uma fábrica de alimentos compostos destinados aos frangos criados na Herdade; iii) instalação de um matadouro de aves, que permite um transporte rápido dos frangos, evitando eventuais inconvenientes para o bem-estar das aves durante a deslocação; iv) construção de unidades de tratamento de subprodutos, quer do matadouro, quer dos aviários (compostagem de estrumes).

Em síntese tendo por objectivo primeiro a produção  de carne de aves – em condições de segurança sanitária, bem-estar animal e minimização da pegada ecológica – o Grupo Valouro instalou na mencionada Herdade os principais segmentos da fileira do frango de carne: i) produção de milho-grão, recorrendo-se para o efeito aos estrumes produzidos nos aviários como fertilizantes de excelência e à água das barragens; ii) fabrico de alimentos compostos completos; iii) criação de frangos de carne; iv) abate de aves; v) tratamento térmico dos subprodutos do matadouro (destinados à alimentação de animais de companhia e peixes); vi) compostagem, desidratação e granulação de estrumes.

Ainda no que respeita à sustentabilidade ambiental, de assinalar que na Herdade da Daroeira foram instaladas duas centrais fotovoltaicas que, juntamente com outras fontes renováveis pertencentes também ao Grupo Valouro, perfazem uma potência instalada de 54 MW, cuja produção corresponde a mais do dobro do total da energia eléctrica consumida pelo mesmo grupo empresarial.

Em conclusão: podemos afirmar que o complexo avícola instalado há duas décadas na Herdade da Daroeira constitui um exemplo ímpar de uma grande integração vertical na fileira do frango de carne, tendo como objectivos principais a segurança alimentar, o bem-estar animal, a eficiência dos recursos, a produção de energia renovável e a reutilização dos subprodutos na perspectiva de economia circular, minimizando também o uso de nutrientes vegetais, como o fósforo e o potássio, provenientes de fontes não renováveis.

* Resumo da comunicação apresentada na Ordem dos Engenheiros, em 19 de Junho de 2019.

Manuel Chaveiro Soares

Eng. Agrónomo, Ph.D.

Grupo Valouro

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