Nos últimos dias têm-se multiplicado as notícias dando conta do rápido agravamento das cotações de diversos cereais e de outras matérias-primas agrícolas, o que tem – no sector pecuário – uma consequência praticamente imediata: o agravamento dos custos com a alimentação animal, os quais representam, como é sabido, uma larga fatia dos custos de produção numa exploração leiteira.
Os produtores reclamam, com absoluta legitimidade, que o preço do leite na origem não lhes permite manter a actividade com níveis mínimos de rentabilidade e acenam com a possibilidade de falência de um grande número de explorações.
Todas as empresas do sector transformador reconhecem este problema e, em especial aquelas que diariamente recolhem o leite em milhares e milhares de explorações, têm perfeita consciência de que o elástico está a ser excessivamente esticado e que pode partir, o que terá consequências nefastas para os próprios, mas terá também consequências muito negativas para toda a fileira, pois como sempre repetimos, só existe indústria láctea em Portugal, enquanto no nosso país existir leite em volume suficiente que justifique a sua operação de industrialização em escala economicamente rentável. E a produção pode vir a quebrar fortemente!…
Mas se tal é verdade, é verdade também que a comercialização do leite, da manteiga, do queijo ou do iogurte produzidos a partir daquela matéria-prima, é hoje realizada com tais desequilíbrios que não tem sido possível distribuir valor ao longo da cadeia de produto, penalizando os elos a montante (produção e indústria) em benefício dos grandes grupos da distribuição e, também, de algum modo do consumidor, que tem hoje nas prateleiras, para várias referências, os preços mais baixos de toda a Europa.
As exigências que a moderna distribuição faz aos seus fornecedores, tantas vezes ilegítimas, quando não mesmo ilegais, retiram toda a rentabilidade à operação industrial e impedem uma justa remuneração dos produtores.
A forma como se abastecem nos mercados externos, mesmo existindo no nosso país produção suficientemente competitiva em qualidade e preço, ou como utilizam os produtos de marca para subsidiar os seus produtos (as ‘marcas de distribuidor’ e, cada vez mais, os produtos ditos de ‘primeiro preço), usando políticas de preços e margens desleais, ‘matam’ qualquer estratégia comercial das empresas do sector.
Aos protestos – legítimos – dos produtores respondem rapidamente as autoridades e as forças políticas, mostrando solidariedade e dizendo que tudo farão para que recebam preços justos pelas suas produções. Mas, na prática, nada acontece, porque nada fazem para corrigir o principal dos problemas: o desequilíbrio negocial existente entre os distribuidores e os seus fornecedores e o consequente enviezamento da cadeia de valor que está a minar o sector lácteo em Portugal.
Pedro Pimentel
Secretário Geral
ANIL – Associação Nacional dos Industriais de Lacticínios