Recordam-se da parábola do sapo e do escorpião? O sapo vai atravessar um rio e o escorpião pede boleia para a outra margem, mas o sapo não cede, dizendo que ele o matará com o seu veneno. O escorpião convence o bicho com o argumento mais óbvio: “Se a meio da travessia te matar, morro também. E não tenho interesse nisso.” O sapo acredita no escorpião e deixa-o ir nas suas costas. A meio da travessia o escorpião crava o seu espigão venenoso no sapo – e ele, na hora da morte, pergunta: “Porque me matas, se morres também?” O escorpião apenas responde: “Porque eu sou escorpião e essa é a minha natureza”.
Não consigo deixar de me lembrar desta parábola quando leio a entrevista dada pelo Sr, Ministro da Agricultura ao Jornal de Negócios, do passado dia 21 de Agosto, ou a forma como foi organizada a reunião com a “fileira” do leite do dia 26 do mês passado. O conflito permanente com o sector é a verdadeira natureza do Sr. Ministro, Dr. Jaime Silva…
A entrevista ao Jornal de Negócios, recorda aquela conhecida declaração de um renomado futebolista que dizia que “Estávamos próximo do abismo, felizmente demos um passo em frente…”. A ânsia de, através de uma entrevista claramente ‘encomendada’, deixar o seu legado (agora que, felizmente, se aproxima a data em que abandonará funções) acabou por funcionar como um inequívoco suicídio.
Fará algum sentido ter num Governo um Ministro do Trabalho contra os trabalhadores, um Ministro da Saúde contra os doentes, um Ministro da Educação contra os alunos ou um Ministro da Economia contra as empresas? Certamente que não. Então que sentido faz escolher e manter um Ministro da Agricultura, cuja permanente prova de vida se faz, em partes iguais, na constante crispação em relação aos agricultores e às suas organizações e na atitude serviçal perante Bruxelas, por certo na expectativa de no final do mandato aí arranjar um lugarzito onde possa dar largas ao seu espírito de eurocrata convicto.
Provavelmente algumas das suas declarações encontrarão algum eco numa certa ‘elite’ urbana, que se habituou a considerar a agricultura e os agricultores como um conjunto de parasitas que vivem única e exclusivamente dos subsídios que lhes são atribuídos (como se fosse o único grupo que deles beneficia). Gostaria de saber, no entanto, se alguns dos paladinos dessa ‘verdade’ estariam disponíveis para trocar, por uma semana que fosse, o conforto da redacção das suas ‘crónicas’ pela vida árdua de, por exemplo, um produtor de leite.
É fantástico também o permanente discurso de apelo à competitividade (que o Sr. Ministro de todo não deve saber o que significa) e, em simultâneo, considerar o conjunto dos agricultores como uma classe rica (a única que não sente os efeitos da crise…), comodista e aburgesada, cujos sinais exteriores de riqueza incomodam o Dr. Jaime Silva, para quem todos deveriam ser, provavelmente, pobres, incultos e, já agora, sem capacidade de opinião e de contestação à ‘maravilhosa’ política agrícola que nos impôs nestes mais de quatro anos…
Finalmente, em relação ao sector do leite, pouco mais há a acrescentar a tudo o que fomos afirmando ao longo do mandato do Dr. Jaime Silva. Dizer que existiu uma política do Governo para o sector é ofender todos os que a ele estão ligados. Afirmar que, apesar da contestação do sector, continuará a defender os interesses nacionais junto de Bruxelas, faz recordar aquela outra frase que diz que “com amigos destes, quem precisa de inimigos…”.
Qualquer que seja o resultado das eleições de 27 de Setembro, uma coisa é certa: o país terá um novo Ministro da Agricultura e um novo capítulo de expectativa abrir-se-á…
Porto, 01 de Setembro de 2009
Pedro Pimentel
Secretário Geral
ANIL – Associação Nacional dos Industriais de Lacticínios