Os eurodeputados bloquistas José Gusmão e Marisa Matias questionaram hoje a Comissão Europeia sobre os fundos da agricultura distribuídos em Portugal, que “impedem a coesão territorial e a resiliência de regiões e tipos de agricultura”.
Em nota à imprensa, os eurodeputados do Bloco de Esquerda (BE) informam ter dirigido três perguntas à Comissão Europeia, apontando “questões que impedem a coesão territorial e a resiliência de regiões e tipos de agricultura deixados de fora nos últimos quadros”.
Segundo Marisa Matias e José Gusmão, essas questões “tornam-se cruciais especialmente num momento de reconstrução da economia europeia em contexto de pandemia”, tendo em conta a nova Política Agrícola Comum (PAC), votada em outubro passado e com início previsto para 2021, “os objetivos climáticos estipulados na União Europeia e a responsabilidade acrescida da presidência portuguesa do Conselho”.
Na primeira questão, sobre “desigualdades na distribuição de fundos da PAC”, os parlamentares europeus assinalam que “mais de 40% das explorações agrícolas portuguesas estão excluídas de qualquer subsídio”, dando o exemplo das regiões da Estremadura e do Algarve, onde “mais de dois terços não tiveram financiamento ao longo dos últimos dois quadros comunitários”.
Na mesma nota, referem também que, de acordo com os Inquéritos de Estrutura às Explorações Agrícolas, “a cobertura dos subsídios é tendencialmente maior nas grandes explorações agrícolas do que nas pequenas” e que “existem grandes discrepâncias entre regiões e tipos de agricultores”.
“É exemplo a passagem dos Regimes de Pagamento Único a Regimes de Pagamento Base, suportados por um histórico de atividade desajustado da realidade, o que concentrou os direitos de pagamento no Alentejo, que em 2018 detinha 62% dos direitos nacionais. Também os pagamentos diretos da produção integrada e outras medidas agroambientais têm contribuído para acentuar as desigualdades”, apontaram.
Para os eurodeputados, as políticas referidas “contradizem os objetivos da PAC de sustentabilidade social, redistribuição, coesão territorial e apoio à pequena agricultura”, pelo que questionam se a Comissão “tem conhecimento da forma como os subsídios são distribuídos em Portugal”, o que fará “para promover regimes de pagamento abertos a todos os agricultores a partir de 2023” e se “aceitará desigualdades destas nos planos estratégicos nacionais”.
Os bloquistas afirmam por outro lado, na segunda questão, que “muitos dos beneficiários da PAC promovem abuso laboral, com recurso a trabalho precário, alojando trabalhadores imigrantes em contentores com condições de habitação indignas, com baixa remuneração, representando elevados riscos de insustentabilidade social e ambiental”.
“Se considerarmos as Unidades de Trabalho Anual (UTA) na análise à distribuição de apoios da PAC, constata-se que o apoio atribuído por UTA é cerca de dez vezes maior na região do Alentejo do que na região oeste e no Pinhal Interior, por exemplo, prejudicando bastante a agricultura familiar”, apontaram.
Criticando o Governo português por ter colaborado “com a legitimação de ilegalidades no tratamento destes trabalhadores, ao equiparar a equipamentos agrícolas as estruturas precárias inaptas para habitação”, Marisa Matias e José Gusmão defenderam que “não há qualquer garantia de que não continuará a haver abuso de migrantes sazonais nas grandes explorações”.
Como tal, e lembrando que o comissário europeu para a Agricultura e o Desenvolvimento Rural, Janusz Wojciechowski, afirmou recentemente ser a favor de excluir dos apoios as explorações que não respeitem direitos laborais, os eurodeputados questionam a disponibilidade da Comissão “para tornar obrigatório o respeito dos mais básicos direitos humanos e suspender pagamentos a quem não cumpra a lei laboral”.
A última pergunta dirigida a Bruxelas é sobre o plano nacional de regadios, aprovado em 2020 com um investimento público de 534 milhões de euros, proveniente do Programa de Desenvolvimento Rural 2020 (no valor de 267 milhões de euros), do Banco Europeu de Investimento (com 187 milhões de euros) e do Banco de Desenvolvimento do Conselho da Europa (com 80 milhões de euros).
Os deputados europeus indicam desconhecerem-se “os motivos que levam o Governo a privilegiar” a intervenção do plano de regadios no Alentejo, pois “não existiu Avaliação Ambiental Estratégica para apoiar as decisões tomadas no âmbito deste programa, como recomenda a legislação nacional e comunitária”.
Até porque “a crise climática obriga a políticas assentes em conhecimento científico e num planeamento cuidado que tenha em conta a resiliência presente e futura das diversas regiões”, justificaram, acrescentando que “apoiar a monocultura intensiva através do aumento de área regada em zonas de escassez hídrica é um erro que apenas agrava o problema”.
Marisa Matias e José Gusmão questionam, por fim, se a Comissão poderá instar o Governo Português “a promover uma maior distribuição” no contexto do plano de regadio e se tenciona pressionar o executivo “a divulgar o que esteve na base da distribuição ou, caso não haja base científica, a promover essa investigação”.