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Frutas e legumes decoram igreja em Viana do Castelo para “agradecer” colheitas

Vários quilogramas de frutas, legumes e cereais estão a dar forma à decoração da igreja de Alvarães, em Viana do Castelo, para “agradecer” a São Miguel as “boas colheitas”, disse hoje uma das dinamizadoras da iniciativa.

Em declarações à agência Lusa, Ester Sotomaior, que há décadas participa na “manifestação de fé” que nasceu espontaneamente há três décadas e que perdura até hoje explicou que “nenhum dos produtos utilizados na decoração dos alteres e do templo é deitado ao lixo”.

“Não deitamos nada ao lixo. O que é comestível dá para comer. O milho e o feijão, se não puder ser usado para consumo humano, são reaproveitados na alimentação dos animais. A única coisa que pode ir para o lixo é palha do milho, mas há pessoas que até reaproveitam para as cortes do gado ou para os galinheiros”, garantiu a zeladora de quase 70 anos.

A antiga professora do primeiro ciclo adiantou que as abóboras “de todas as espécies, tamanhos e feitios” são um dos principais produtos usados na confeção dos trabalhos e que “muitas, sobretudo as grandes, são devolvidas a quem empresta” no final da festividade em honra do santo padroeiro das colheitas.

“As pessoas já semeiam abóboras, mas algumas espécies não são comestíveis, são só para decoração. Este ano optamos por utilizar abóboras pequenas e médias. Houve anos que chegámos a ter abóboras com 50 quilogramas. Eram precisos dois homens para pegar nelas. Este ano, como não tínhamos quem pegasse, optamos por utilizar abóbora pequena ou média, cereais, milho, espiga de milho, feijão, cebola e alho”, especificou.

Além do reaproveitamento de parte dos produtos que “a terra dá”, que Ester não soube quantificar, outros são doados a instituições da freguesia, situada na margem esquerda do rio Lima, como o lar de São José.

A decoração, com cebolas, alho, abóboras, milho, alho, beterrabas, batata-doce, entre outros produtos agrícolas, abre ao público na quinta-feira.

“É uma forma de agradecermos a São Miguel e à natureza tudo o que ela nos dá”, sublinhou a docente, já aposentada.

Segundo Ester Sotomaior, a decoração do templo permanece “até os produtos resistirem viçosos” e a confeção dos arranjos “é feita apenas pelas zeladoras do templo”.

“Não há floristas envolvidas. Na nossa igreja é tudo feito por nós. Pessoas que têm os seus trabalhos normais e que cumprem a tradição”, reforçou.

Nesta festividade as flores são pouco utilizadas.

“Como colocamos flores durante todo o ano, nesta altura, fugimos um pouquinho à flor. Apesar de também ser um produto da terra, vamos mais para os cereais, frutas e legumes”, referiu.

O trabalho de decoração dos diversos altares começou na terça-feira e deverá terminar na tarde de hoje para ser apreciado a partir de quinta-feira.

“Eu já comecei no domingo a fazer o meu altar. Também faço parte de um grupo, agora muito desfalcado, que decora o altar-mor e a tribuna, onde também ajudo a decorar”, contou.

A tradição foi iniciada há 30 anos por uma senhora da aldeia, mas com o correr dos anos acabou por se transformar numa iniciativa de um grupo de sete zeladoras da igreja. Contudo, agora apenas três estão em condições de trabalhar.

“Até agora a gente bastava-se. A senhora mais velha, a quem chamávamos chefe, teve um AVC vai fazer quatro anos. Foi ela quem nos pediu para ajudar. Começámos e assim nasceu o grupo que nunca mais abandonamos”, observou, admitindo ser “difícil” mobilizar a juventude da aldeia para a tradição.

“O que consegui foi pedir um pouco de ajuda aos escuteiros, este ano, porque estão a celebrar os 50 anos de existência. De resto é difícil mobilizar a juventude”, referiu.

Os homens também não se envolvem na tradição, há exceção de “um vizinho que apoia em algumas tarefas, porque ajuda na decoração do altar de uma amiga”, afirmou.

“É o altar mais bonito que temos. O da Senhora Boa Morte, que tem os apóstolos todos e que tem coisas diferentes do habitual. Tem beterrabas enormes, um pé de batata-doce com seis batatas-doces pendentes, com rama”, especificou.

O programa das festividades em honra de São Miguel inclui, entre outras iniciativas, a bênção dos campos agrícolas e, no domingo, uma pequena procissão, também dedicada aos produtos da terra.

A freguesia de Alvarães é igualmente conhecida pelos andores floridos, feitos com “milhares de pétalas frescas e folhas variadas”, ex-líbris das festas das Cruzes que se realizam em maio.

Manda a tradição, que remonta a 1946, que as pétalas das flores utilizadas na confeção dos andores sejam colhidas nos montes de Viana do Castelo e coladas com uma cola feita à base de farinha que garante a humidade necessária para que as pétalas se aguentem vários dias “viçosas e coloridas”.

Um trabalho minucioso que através da conjugação das cores e texturas das pétalas forma desenhos temáticos, transformando os andores em verdadeiras obras de arte popular, com motivos religiosos, paisagísticos e monumentais.


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