Conhecida como árvore-da-China, nogueira-do-Japão, árvore-avenca, árvore-de-quarenta-dinheiros, pé-de-pato ou apenas como ginkgo, esta é uma das espécies de árvores mais antigas do mundo. Considerada um “fóssil vivo”, já existia antes dos dinossauros e há exemplares japoneses que resistiram à bomba nuclear. Descubra este exemplo de resiliência, que se tornou um símbolo de paz e longevidade.
À primeira vista, parece uma árvore igual a tantas outras. No entanto, se pesquisarmos sobre esta espécie, descobrimos pormenores fascinantes, que fazem do Ginkgo biloba uma árvore pouco comum, logo a começar pela sua longevidade.
Conhecido em Portugal principalmente pelo nome ginkgo, árvore-da-China ou nogueira-do-japão, o Ginkgo biloba é uma das espécies de árvore mais antigas que chegou até ao presente. Tornou-se mais falada no século XX, após seis exemplares terem sobrevivido à destruição causada pela bomba atómica em Hiroxima. Uma delas, situada junto a um templo, a cerca de um quilometro do ponto central da explosão, ainda resiste e tornou-se num símbolo de resistência e um ícone botânico de paz.
Esta autêntica relíquia vegetal pouco mudou desde há 200 milhões de anos: já existia na Terra antes dos dinossauros, assistiu à sua catastrófica extinção e sobreviveu até à atualidade, resistindo e adaptando-se a grandes mudanças. É este um dos motivos pelo qual o Ginkgo biloba acabou por ficar conhecido como um “fóssil vivo”.
A sua longa história de resiliência tem deslumbrado cientistas, como o botânico Peter Crane, e tem também apaixonado leigos, como Cor Kwant, que têm dedicado parte das suas vidas a conhecer e divulgar esta espécie.
Mas se é verdade que pouco mudou para os exemplares que conseguiram chegar até ao XXI, nem tudo se manteve inalterado nesta família botânica: estudos paleobotânicos demonstram que já existiram outras espécies de Ginkgo (além do biloba), dispersas por diferentes continentes. Todavia, ao longo de milénios, a sua distribuição geográfica regrediu bastante e registaram-se extinções locais:
os últimos registos na América do Norte datam de há cerca de 15 milhões de anos;
na Europa, terá deixado de existir naturalmente há aproximadamente 5 milhões de anos;
na Ásia, principal continente onde subsistiu, quase se extinguiu devido às glaciações do Pleistoceno (entre 2,5 milhões e 11,7 mil anos atrás).
Hoje, o Ginkgo biloba é o único representante vivo da ordem Ginkgoales, família Ginkgoaceae. Conhecê-lo abre-nos uma janela para o passado, na descoberta de um elo importante na evolução das plantas com semente, nas quais se incluem tanto as coníferas (árvores que produzem pinhas) como as angiospérmicas (plantas com flor).
Segundo Peter Crane, autor do livro “Ginkgo: the tree that time forgot” (sem edição em português) e um dos maiores especialistas mundiais neste tema, esta é uma espécie com um lugar único na evolução das plantas e na cultura humana. A sua beleza — em particular, o dourado das suas folhas no outono — tornou-o muito apreciado como espécie ornamental. Ao longo dos séculos, também encontrou um lugar especial na espiritualidade oriental e inspirou diferentes formas de arte.
Na atualidade, o Ginkgo biloba em estado natural encontra-se confinado a áreas muito restritas da China, nas quais se pensa terem origem todas as plantas cultivadas no sudeste asiático e nos quatro cantos do mundo. Portanto, não é de estranhar que seja considerada uma espécie “em perigo” (EN), segundo a Lista Vermelha da IUCN – União Internacional para a Conservação da Natureza.
Ginkgo: a árvore da eterna juventude
Além de a espécie ter resistido à passagem do tempo, as árvores têm também uma longevidade e resiliência surpreendentes. Nos registos das árvores monumentais, há um Ginkgo, na China, que se pensa ter cerca de quatro mil anos. E há até estudiosos que consideram o Ginkgo biloba como uma árvore eternamente jovem, pois o seu envelhecimento não parece afetar o tamanho das folhas, nem a sua capacidade fotossintética, nem sequer a qualidade das suas sementes.
O segredo desta longa vida foi desvendado pela análise genética, que o atribuiu à produção de substâncias químicas – antioxidantes, antimicrobianas e hormonais – as quais mantêm o Ginkgo saudável e o protegem de doenças e de outros fatores limitantes à sua sobrevivência.
Histórias de devastação por catástrofes, como ciclones ou incêndios, reforçam esta ideia de resiliência, com vários exemplos de árvores que recuperam rapidamente dos danos sofridos, restabelecendo os seus processos fisiológicos e continuando a viver. Um dos mais emblemáticos exemplos é o da extrema resistência à radioatividade, no caso já mencionado da árvore que sobreviveu à bomba atómica em Hiroxima e que foi a primeira planta a recuperar a folhagem depois das explosões.
Espiritualidade, gastronomia, arte e beleza… além de resistência
Na China, no Japão e na Coreia, há muito que o Ginkgo é venerado como árvore sagrada. É, por isso, comum encontrar exemplares centenários junto aos templos. Nestes países, também as suas sementes – semelhantes a pistácios e conhecidas como “nozes de Ginkgo” – são apreciadas para fins culinários. Os cientistas advogam que esta relação – espiritual ou religiosa e alimentar – por parte dos povos orientais foi o principal motivo que evitou a sua extinção.
Parte do seu simbolismo no Oriente está relacionado com a forma das suas folhas que, por serem compostas por dois lóbulos simétricos, remetem para dualidade – Yin e Yang –, duas partes que se completam e equilibram.
Na arte oriental, a espécie aparece quer em pinturas, quer em textos poéticos. No entanto, com a sua chegada ao ocidente, a partir do século XVIII começou a surgir também em produções artísticas ocidentais. Assim, é comum encontrar a sua folha inconfundível nas artes plásticas e decorativas ou até na joalharia, e a servir de inspiração à escrita, como aconteceu com o romântico Goethe, vulto da literatura alemã e autor do poema “Gingo biloba” (1815).
Pensa-se que o primeiro Ginkgo terá sido trazido para a Europa em 1730, pelo cirurgião e diplomata alemão Engelbert Kaempfer, que o descobrira no Japão quatro décadas antes. Mas as primeiras plantações serão as do Jardim Botânico de Utrecht, nos Países Baixos, onde residem os exemplares mais antigos fora da Ásia. No Jardim Botânico de Kew, no Reino Unido, também se encontra um exemplar notável, plantado em 1762.
Em terras lusas, não se sabe exatamente qual é o mais antigo. Embora os exemplares do Jardim Botânico de Coimbra já existissem em 1852, pensa-se que o Ginkgo do Horto das Virtudes, classificado como árvore de Interesse Público e a maior que se conhece no país, seja a mais antiga: poderá datar da fundação deste jardim, nos anos 30 do século XIX.
Em Portugal, tal como noutras partes do mundo, a espécie é cultivada pelo seu valor ornamental e pode encontrar-se principalmente em zonas urbanas – de ruas e avenidas a parques e jardins. Esta escolha deve-se também à resistência destas árvores à poluição atmosférica, intempéries e agressões provocadas por insetos, fungos e bactérias.
Uma curiosidade é que as árvores plantadas para fins decorativos são unicamente exemplares do sexo masculino. Esta espécie é dioica, ou seja, uns indivíduos são masculinos e outros femininos. As árvores fêmeas produzem sementes (falsos frutos constituídos por uma semente rodeada de uma polpa carnuda) de aspeto semelhante a ameixas amarelas, que amadurecem no outono com um odor pestilento e muito desagradável, para além da sujidade que causam quando caem.
O nome científico Ginkgo biloba, atribuído por Lineu, em 1771, inspirou-se nos frutos e folhas desta árvore: a palavra ginkgo tem origem chinesa: deriva de “Gin kyo” que significa “damasco prateado”, enquanto biloba é uma alusão ao formato das folhas, com dois lóbulos que, juntos, lembram um leque.
Hoje, o Ginkgo biloba é uma espécie fácil de avistar em Portugal: em Lisboa, por exemplo, existe no Campo dos Mártires da Pátria, na Gulbenkian, no Largo da Luz, no Parque Eduardo VII, na Praça Paiva Couceiro, no Príncipe Real e na Tapada da Ajuda. No Porto, está presente no Palácio de Cristal, no já referido Horto das Virtudes e em Serralves, entre outros espaços verdes. Em Coimbra, os olhos curiosos podem descobri-la no Jardim Botânico.
Na Madeira, encontra-se também no Jardim Botânico e nos Açores, no Parque Terra Nostra. Curiosamente, neste Parque está identificada como “árvore do amor”, nome mais habitual para a olaia (Cercis siliquastrum).
Propriedades medicinais do Ginkgo: verdades e mitos
Mesmo quem nunca viu um Ginkgo tende a reconhecer imediatamente este nome, dado que, nos últimos anos, as suas propriedades medicinais têm sido amplamente divulgadas e enaltecidas. Hoje, é uma das plantas mais aclamadas a nível mundial e o extrato seco de Ginkgo biloba um dos suplementos obtidos a partir de ativos vegetais (fitoterápicos) mais vendidos na Europa.
“O conceito da qualidade nos produtos à base de Ginkgo biloba comercializados em Portugal”, publicado em 2010, constatou, no entanto, que a maioria destes produtos está integrada na categoria dos suplementos alimentares, não abrangidos pela legislação aplicável aos medicamentos. Por este motivo, “não se encontram garantidos os parâmetros de qualidade, segurança e eficácia”, refere a monografia da espécie “Aplicações Terapêuticas e Produtos no Mercado”.
O Comité dos Medicamentos à Base de Plantas (HMPC), da Agência Europeia de Medicamentos, esclarece que os fármacos à base de extrato seco de folha de Ginkgo podem ser utilizados para melhorar patologias da função cognitiva associadas à idade e aumentar a qualidade de vida dos adultos com demência ligeira. E, em paralelo, que os medicamentos à base de folha de Ginkgo em pó podem ser aplicados no alívio da sensação de pernas pesadas e das mãos e pés frios, ou seja, em problemas ligeiros do aparelho circulatório.
A mesma entidade adverte ainda que os medicamentos de Ginkgo “apenas devem ser utilizados por adultos” e “após a exclusão de patologias graves por um médico”. O mesmo conselho é expresso numa dissertação sobre a sua toxicidade, em que se abordam riscos e efeitos secundários. Assim, “a escolha e a toma de produtos à base desta planta deve ser feita de modo consciente e informado, evitando a automedicação”.
Os primeiros registos de usos medicinais do Ginkgo biloba na tradição chinesa datam de há cerca de 2800 anos a.C. As folhas eram usadas para os mais variados problemas, desde desordens mentais a doenças respiratórias e problemas de circulação. E as nozes para alívio da febre, tosse, diarreia e dores de dentes, entre outras afeções.
O artigo foi publicado originalmente em Florestas.pt.