Com o objetivo de continuar a fomentar a participação ativa de atores relevantes do setor da conservação da natureza, o Ministério do Ambiente e da Ação Climática lançou o desafio ao Professor Miguel Araújo, da Universidade de Évora e vencedor do Prémio Pessoa em 2018, para liderar um processo de formação de conhecimento técnico e o resultado foi o estudo de reflexão “Biodiversidade 2030: Nova agenda para a conservação em contexto de alterações climáticas”, que será apresentado amanhã, e que sugere uma proposta de agenda, num contexto particularmente desafiante de alterações climáticas.
Financiado pelo Fundo Ambiental, o estudo foi realizado de outubro de 2020 a janeiro de 2022, por uma equipa multidisciplinar e que inclui, como cocoordenadores: Maria do Rosário Oliveira (ICS); Isabel Sousa Pinto (U Porto); Emanuel Gonçalves (Fundação Oceano Azul) e Cristina Marta Pedroso (IST).
Partindo dos quatro objetivos que devem nortear os instrumentos de conservação da natureza e da biodiversidade, inscritos na Estratégia Europeia de Biodiversidade 2030 (EEB2030), os peritos propuseram um total de nove Reformas consideradas fundamentais, a saber:
Objetivo 1: Reforçar a coerência das áreas protegidas
Reforma 1 – Criação da Estrutura de Adaptação Climática da Biodiversidade
Prevê a otimização de áreas de conectividade climática, interligando áreas nucleares do Sistema Nacional de Áreas Classificadas (SNAC) e refúgios climáticos para facilitar a mobilidade das espécies. Visa criar oportunidades de expansão do SNAC, ajudando a cumprir o objetivo de conservação de 30% do território terrestre (definido na EEB2030), e proporcionando, simultaneamente, soluções que respondem ao desafio climático para a biodiversidade.
Reforma 2 – Reforço do nível de proteção das áreas classificadas
Para a concretização da meta de 10% em terra e 10% no mar, em regime de conservação estrita (definida na EEB 2030), são propostas soluções como: i) classificação (no mar) ou reclassificação (em terra) de território público em áreas de proteção total; ii) aquisição, pelo Estado, a um valor justo, de propriedades com valor estratégico para a conservação da biodiversidade; iii) contratualização da gestão de propriedades privadas para conservação e restauro da natureza; iv) desenvolvimento de incentivos financeiros e fiscais para classificação de áreas protegidas privadas de proteção total.
Objetivo 2: Gerir com eficácia a biodiversidade protegida
Reforma 3 – Definição de planos de gestão ativa e adaptativa de gestão de espaços classificados
Face à incerteza associada às alterações climáticas e a outras dinâmicas territoriais de difícil antecipação, as áreas classificadas do SNAC (nomeadamente Rede Natura 2000) e os Other Area-Based Conservation Measure, segundo os autores, devem ser acompanhados de planos de gestão ativa e adaptativa, que contemplem as fases necessárias à sua correta implementação.
Reforma 4 – Aprofundamento da cogestão das áreas classificadas
Prevê-se um aprofundamento do modelo de cogestão vigente, para, de um modo geral, aumentar a transparência e eficácia da gestão, decorrente de uma simplificação de procedimentos e de uma clarificação de direitos e deveres em sede de contratualização da cogestão com a autoridade nacional de conservação da natureza e da biodiversidade.
Objetivo 3: Restaurar populações e ecossistemas naturais degradados
Reforma 5 – Restauro dos ecossistemas de águas interiores
É proposto um programa nacional de restauro ecológico, abrangendo linhas de água em estado mau, medíocre, ou razoável, dando prioridade às que se encontram dentro do SNAC e em áreas identificadas como refúgio climático. Para a meta de restauro de conectividade de 25.000 km de rios europeus, da EEB2030, propõe-se priorizar o desmantelamento de barreiras obsoletas em cursos de água que sejam coincidentes com o SNAC (nenhuma é coincidente com os refúgios climáticos).
Reforma 6 – Restauro dos ecossistemas marinhos
É proposto um programa de restauro ecológico focado, numa primeira fase, no restauro dos sapais, das pradarias de ervas marinhas e florestas de kelp, em áreas da Rede Nacional de Áreas Marinhas Protegidas, com vista à expansão da sua área atual. É também proposta a identificação de novas áreas protegidas, incluindo florestas de kelp e outras florestas de macroalgas. No caso marinho é proposto o restauro da biomassa das espécies com interesse comercial, sendo fundamental definir planos de recuperação dos stocks.
Objetivo 4: Financiamento para a biodiversidade
Reforma 7 – Implementação do princípio do utilizador-pagador nas áreas protegidas portuguesas
Esta proposta está alinhada com a EEB2030 para mobilizar financiamento para a conservação através da implementação do princípio do utilizador-pagador, que determina que os beneficiários de um determinado serviço de ecossistema deverão contribuir para a manutenção desse serviço.
Reforma 8 – Criação de mercados de créditos de biodiversidade
Trata-se de uma proposta para que ocorra a transação de créditos de biodiversidade por um valor monetário acordado entre compradores e vendedores, numa plataforma virtual, baseando-se no reconhecimento da importância dos mercados de créditos de biodiversidade e da iniciativa privada para reforçar o financiamento necessário à biodiversidade, criando um mercado com regras simples, bem definidas e capazes de dar flexibilidade para serem criados projetos inovadores.
Reforma 9 – Introdução de mecanismos de fiscalidade verde
Esta é uma proposta de reforma da fiscalidade verde, que permita condicionar comportamentos perversos sobre o ambiente e alavancar os compromissos ambientais. Pretende-se ir além de uma abordagem exclusivamente punitiva (mais taxas e impostos), ao acautelarem-se deduções, isenções e reduções de impostos às organizações e cidadãos que tomem decisões convergentes com o Pacto Ecológico Europeu, nomeadamente com a promoção da conservação e restauro da biodiversidade, quer ao nível dos fluxos associados ao Mercado de Créditos de biodiversidade, quer ao nível do alinhamento da atividade principal da empresa com os objetivos ambientais nacionais e europeus.
O estudo “Biodiversidade 2030: Nova agenda para a conservação em contexto de alterações climáticas” será apresentado publicamente, na sexta-feira, 20 de maio, integrando a conferência inaugural Missão Natureza 22, promovida pelo Instituto da Conservação da Natureza das Florestas. O evento, a decorrer no Palácio Nacional de Queluz, será encerrado pelas 18h pelo Ministro do Ambiente e da Ação Climática, Duarte Cordeiro.
Comunicado enviado pelo Ministério do Ambiente e Ação Climática.