Há espécies quase extintas que dependem da mão humana, mas estão a ser ignoradas

Desaparecidas na natureza mas vivas em cativeiro, há dezenas de espécies à beira da extinção. Estão 100% dependentes da mão humana, mas “largamente esquecidas”, avisa artigo da Science.

Aúltima vez que se observou a pomba-de-Socorro (Zenaida graysoni) no seu habitat natural foi em 1972. Esta ave é originária de Socorro, uma pequena ilha vulcânica situada no oceano Pacífico, a 600 quilómetros da costa ocidental do México. Os gatos introduzidos na ilha acabaram por extirpá-la ali. Mas, felizmente, ela continua a existir. Muitos anos antes, em 1925, 17 indivíduos foram recolhidos na ilha e transportados para um produtor de aves na Califórnia, nos Estados Unidos. Desde então, já nasceram cerca de 37 gerações de pombas-de-Socorro.

Há planos para a pomba ser reintroduzida na natureza, mas os desafios ainda não o permitiram e a ave continua apartada do seu habitat natural. Isto faz com que seja uma das 84 espécies que, em algum momento desde 1950, ficaram extintas na natureza mas foram mantidas pela mão humana, mostra agora um artigo publicado nesta quinta-feira na Science, que revela um panorama difícil para estas plantas e animais que estão na linha da frente da extinção.

“A maioria das espécies extintas na natureza existem num número demasiado pequeno e em poucas instituições, o que aumenta o risco de serem extintas e por isso devemos concentrarmo-nos em fazer crescer o tamanho destas populações e o número de instituições detentoras daquelas espécies”, explicou ao PÚBLICO John Ewen, do Instituto de Zoologia da Sociedade de Zoologia de Londres, no Reino Unido, e último autor do artigo que contou ainda com o trabalho de investigadores sediados em instituições na Austrália, no Canadá, nos Estados Unidos, na Itália, no Reino Unido e na Venezuela.

Da reintrodução à extinção

A União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, sigla em inglês) avalia o estado de conservação das espécies e atribui uma categoria consoante o seu risco de desaparecimento. Há três categorias para quando as espécies já estão ameaçadas de extinção: vulnerável, em perigo e em perigo crítico. Se elas desaparecerem da natureza, mas ainda existirem em cativeiro ou forem cultivadas, no caso das plantas, então caem na categoria extinto na natureza (EW, sigla em inglês para extinct in the wild).

De 1950 para cá houve 95 espécies de animais e plantas em situação de cuidado humano, como nos jardins zoológicos e nos jardins botânicos, que sofreram uma extinção na natureza, adianta o artigo.

Destas, 12 voltaram a ser reintroduzidas na natureza, como o caso do bisonte-europeu (Bison bonasus), dado como extinto em 1927, mas que sobreviveu nos jardins zoológicos europeus e foi reintroduzido na natureza em 1952, com as populações selvagens a crescer desde então. Ou como a Diplotaxis siettiana, uma pequena planta de 40 centímetros com flor amarela, endémica de Alborán, um ilhéu mediterrânico de Espanha, que desapareceu daquele território em 1974 e começou a ser reintroduzida no final da década de 1990.

Mesmo que a batalha não esteja ganha para aquelas espécies – a Diplotaxis siettiana continua em perigo crítico de extinção, e o bisonte-europeu ainda é alvo de uma política de conservação –, elas são exemplos de um avanço positivo relativamente à sua situação frágil.

Todas as espécies podem ser salvas
John Ewen

Mas há outras 11 espécies em que, depois da extinção na natureza, os últimos indivíduos acabaram por também morrer em cativeiro, sem deixar descendência. Seis eram espécies de gastrópodes, duas eram de répteis, há ainda um peixe, uma ave e uma planta, a oliveira-de-Santa-Helena (Nesiota elliptica). Este arbusto originário da ilha de Santa Helena, no Atlântico sul, que não é parente da nossa oliveira, desapareceu da ilha em 1994, devido à degradação do seu habitat, e os últimos exemplares em cativeiro morreram em 2003 por causa de uma infecção fúngica e da dificuldade do cultivo daquele vegetal.

Dos animais desaparecidos, talvez o caso da tartaruga-gigante Lonesome George seja o mais mediático. Este réptil tornou-se o último representante da espécie Chelonoidis abingdonii, da ilha Pinta, no arquipélago das Galápagos. O indivíduo foi descoberto em 1971 naquele pedaço de terra e no ano seguinte foi levado para a Estação de Investigação Charles Darwin, em Puerto Ayora, na ilha de Santa Cruz, nas Galápagos. Apesar de tentarem que o Lonesome George se reproduzisse com tartarugas-gigantes fêmeas de outras espécies daquele arquipélago, parentes próximas de Lonesome George, tal não aconteceu e o solitário réptil acabou por morrer de velhice em 2012. Com ele foi o fim da Chelonoidis abingdonii.

As situações acima mostram como pode ser difícil garantir a manutenção e sobrevivência dos animais e das plantas que estão sob cuidado total humano. Mas tudo depende do esforço feito, argumentam os autores. “Todas as espécies podem ser salvas”, defende John Ewen, acrescentando que “há histórias de sucesso espantosas”, como o caso do bisonte-europeu. “É necessário uma acção corajosa, mas responsável e recursos para fazer esse caminho”, adianta.

Espécies esquecidas

Entre os dois desfechos […]

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