Francisco Palma

Imigração no Alentejo: problemas e desafios – Francisco Palma

O Alentejo, ao longo da história, tem sido um território com problemas de povoamento. A falta de pessoas é um registo crónico do Alentejo, contribuíram e contribuem para este problema vários factores e origens, nomeadamente por ser um território em que o sector primário foi e continua a ser a principal actividade económica. A agricultura alentejana é maioritariamente de sequeiro (92% da superfície), a sua produtividade está dependente do factor climático, que cada vez é mais variável, com maior incidência na precipitação, que tem vindo a diminuir nos últimos anos. Isto faz com que a água seja para o Alentejo e para os alentejanos um bem precioso. Factores como a mecanização da agricultura nos anos 60 do século passado, a reforma agrária de 1975, a adesão à Comunidade Económica Europeia em 1986, as sucessivas reformas da Politica Agrícola Comum (PAC), o desinvestimento do estado nas infraestruturas de rega durante mais de 25 anos (1974 a 2002), no âmbito do plano de rega do Alentejo, fizeram com que a população activa na agricultura diminuísse. O EFMA (empreendimento de fins múltiplos do Alqueva) com os primeiros blocos de rega a serem concluídos em 2005, vem trazer à região uma dinâmica de novos investimentos agrícolas e agroindustriais. O regadio que está a ser construído precisa de pessoas. Pessoas com projectos, conhecimento e capacidade de investimento para transformar o sequeiro em regadio. Pessoas para trabalharem no campo. A intensificação das culturas e a sua consequente produtividade, determinam que a agricultura precisa cada vez de mais gente. Esta é a problemática que a agricultura do Alentejo enfrenta actualmente.

Os sucessivos governos, que foram passando enquanto o EFMA se construía, ignoraram o potencial do regadio, nada se fez em termos de planeamento e estratégia para o EFMA. Ninguém quis ver o futuro ou quis prepará-lo, estabelecendo um conjunto de políticas públicas para o investimento agrícola, determinando um ordenamento agrícola do território de forma a que o investimento no EFMA valorizasse a região em termos económicos, ambientais e sociais.

A migração é um fenómeno global, nunca tantas pessoas saíram dos seus países ou regiões de origem para irem viver para outro lugar, na procura de melhores oportunidades de trabalho ou de investimento, por razões políticas, económicas ou ambientais, pela guerra ou perseguições étnicas e religiosas.

Nestes últimos 20 anos o Alentejo viu e acolheu todo o tipo de imigrantes. Vieram com o objectivo de investir na agricultura, atraídos pela água do Alqueva, sendo os espanhóis aqueles que maior investimento tem realizado na região, trazendo consigo toda a tecnologia associada à cultura do olival e mais recentemente do amendoal, fazendo do EFMA uma enorme oportunidade para a exportação da tecnologia espanhola na forma de plantas, sistemas de rega, adubos, consultoria, terraplanagens e drenagem, etc. O EFMA tornou-se num polo de atracção para o investimento agrícola e agroindustrial de cidadãos ou empresas de diferentes origens, tais como a Rússia, França, Alemanha, Chile e outros, trazendo capital, conhecimento e pessoas para a região.

A água aumenta a produtividade agrícola no nosso clima entre 5 a 10 vezes mais do que em sequeiro. Também aumentam as necessidades de mão de obra, tanto a qualificada como a não qualificada, sendo que esta última é aquela que precisa de mais pessoas. Hoje, a maior dificuldade reconhecida unanimemente por todos os agricultores é a falta de mão de obra. As origens dos imigrantes que substituem a falta de mão de obra nacional, tem variado bastante nos últimos 20 anos, desde brasileiros aos dos países de leste e mais recentemente asiáticos e africanos. A escolha dos investimentos agrícolas tem-se focado em produções onde a mecanização das culturas não está totalmente assegurada, necessitando de muitas pessoas, especialmente na época das colheitas. Existe um claro distanciamento entre as políticas públicas de formação e emprego e os incentivos e opções de investimento no sector agrícola. Portugal tem investido muito na educação em todos os níveis de ensino, com uma maior percentagem de jovens a tirarem cursos superiores e pós graduações. Existe um paradoxo entre a politica de educação e o investimento agrícola, porque ao desenvolverem-se culturas com grandes necessidades de mão de obra, que é inexistente no mercado, cria-se a necessidade de se recorrer a mão de obra estrangeira não qualificada, ao mesmo tempo que se assiste à emigração dos nossos jovens qualificados para outros países onde existem oportunidades para trabalhos qualificados.

O sucesso da migração está na capacidade que os imigrantes têm de se adaptar ao país ou região que os acolhe. A aprendizagem da língua e o respeito pelas normas de conduta e costumes da sociedade que os acolhe, são princípios fundamentais para a integração dos imigrantes.

O Alentejo precisa de todos para se desenvolver. Com o EFMA todos somos sempre poucos, a realidade e a necessidade que a região tem de pessoas é enorme. Não é criando barreiras burocráticas, dificultando os processos de autorização de trabalho/residência ou penalizando os imigrantes nos seus descontos para a segurança social, que se restringe a imigração. Pelo o contrário, o sinal que se dá é de incentivo à criação de esquemas ilegais, para aproveitamento das  pessoas que querem trabalhar ou investir.

O grande desafio do Alentejo é o de transformar ou acrescentar valor à produção das matérias primas de origem agrícola, pecuária e florestal que assistimos todos os dias a saírem da região tais como o azeite, o porco Alentejano ou a cortiça, em que o valor acrescentado destes e de outros produtos de excelência ficará algures noutra região ou país, ficando o Alentejo apenas com uma pequena parte do valor que o seu território e as suas gentes criam.

Francisco Palma

Agricultor e Presidente da Associação de Agricultores do Baixo Alentejo

A financeirização da agricultura, o caso de Alqueva – Francisco Palma


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