Manuel Chaveiro Soares

Importa ultrapassar o envelhecimento demográfico em Portugal

O mundo, Portugal inclusive, mudou muito ao longo da minha vida, sendo a redução drástica da pobreza extrema (abaixo do limiar fixado em um 1,9 dólares por dia) o acontecimento que considero mais importante, ao ter diminuído de 75% da população mundial em 1950 para 9% atualmente.

Entretanto, a população mundial mais que triplicou, se bem que a taxa de fecundidade, ou seja, a média do número de filhos por mulher até ao fim do período reprodutivo, tenha diminuído 50%; mas, por outro lado, a taxa de mortalidade infantil baixou de 15% para 3% e a esperança de vida elevou-se de 46 para 72 anos. Apesar do referido crescimento da população mundial, de 2,5 para 8 mil milhões de seres humanos, a produção de alimentos aumentou de forma ainda mais acentuada, graças aos progressos notórios que se registaram na agricultura, com destaque para a produção de adubos azotados e para o melhoramento genético de plantas e de animais.

No caso de Portugal, desde o fim da II Grande Guerra até ao presente, a população residente elevou-se de 8,4 para 10,3 milhões, mas importa sublinhar que desde 1982 não há renovação de gerações, devido principalmente ao facto do índice sintético de fecundidade ser um dos mais baixos do mundo (1,34 filhos por mulher em idade fértil, em 2021).

Em consequência do crescente envelhecimento demográfico, atualmente Portugal é um dos dez países mais envelhecidos do mundo, de tal modo que por cada 100 indivíduos que saem do mercado de trabalho apenas ingressam 76. 

Este quadro é especialmente grave no setor agrícola, que nas últimas três décadas registou uma quebra média de 30 mil trabalhadores por ano, baixando de 16% para 6% da população residente – em grande parte devido à reforma da Política Agrícola Comum (PAC) de 1992, na sequência da qual as terras aráveis baixaram de 2,3 para 1,0 milhão de hectares (entre 1989 e 1993 o decréscimo da mão-de-obra agrícola foi especialmente acentuado: 272 mil no total, sendo 251 mil mão-de-obra familiar) e, adicionalmente, devido também à crescente mecanização agrícola. Acresce que 60% dos trabalhadores agrícolas têm 55 ou mais anos e apenas 3,9% têm menos de 40 anos.

A esta evolução demográfica negativa devemos acrescentar a emigração portuguesa, tudo concorrendo para que a falta de mão-de-obra seja um problema transversal a vários setores de atividade, podendo ser mitigada pela imigração. 

No setor agrícola a falta de mão-de-obra faz-se sentir não só em atividades temporárias (e.g. colheita de fruta, vindimas, horticultura), como também em atividades permanentes (e.g. produção animal), podendo afirmar-se que sem imigração a agricultura portuguesa já não sobrevive. 

A imigração, porém, enfrenta entre nós alguns problemas, nomeadamente de índole organizacional, inclusive dificuldades de comunicação quando se trata de imigrantes não falantes de língua portuguesa. 

Outros países recorrem em larga escala à imigração, mas alguns controlam-na consoante as necessidades do país. É o caso, por exemplo, do Canadá, que recebe milhões de pessoas qualificadas, concedendo-lhes vistos temporários (variáveis e em geral até seis meses) ou vistos permanentes desde que comprovem determinados requisitos, o que lhes permite inclusive tornarem-se cidadãos canadenses e reunir os membros da família. O Canadá possui mais de 60 programas de imigração, contemplando diversos públicos-alvo que quer atrair. Naquele país, em 2019 os imigrantes foram responsáveis por 80% do crescimento da população e, no início de 2030, espera-se que o referido crescimento dependa exclusivamente da imigração, dado que a taxa de natalidade é baixa. 

Outra alternativa, complementar da imigração, reside em criar em Portugal condições favoráveis ao aumento da atual taxa de natalidade, que nos coloca entre os países onde nascem menos bebés. Para o efeito cabe ao Estado diversas iniciativas, com relevo para a disponibilização de creches, mas também à sociedade, na medida em que são cada vez mais as mulheres que exercem uma atividade profissional como os homens, mas por razões culturais estes nem sempre partilham as tarefas domésticas, incluindo as que respeitam aos cuidados dedicados às crianças.

Manuel Chaveiro Soares

Engenheiro Agrónomo, Ph. D.

Regadio sustentável: um imperativo nacional


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