A Ministra da Agricultura, Maria do Céu Antunes, defende a importância de criar condições para uma gestão em sistema agroflorestal.
As políticas desenvolvidas no âmbito da Política Agrícola Comum (PAC) da União Europeia e o do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) vão contribuir para obter melhores resultados na gestão complementar das atividades agrícolas e florestais, afirma Maria do Céu Antunes.
A Ministra da Agricultura e da Alimentação enuncia os apoios com que os produtores podem contar ao nível da sustentabilidade e da produtividade, colocando a ênfase na inovação para enfrentar os desafios do futuro.
Que políticas estão a ser desenvolvidas para integrar floresta e agricultura no setor primário?
Há um conjunto de políticas desenvolvidas no território nacional no âmbito da Política Agrícola Comum (PAC) da União Europeia, que contribuem para obter melhores resultados na gestão complementar das atividades agrícolas e florestais. As políticas que contribuem para a manutenção da atividade agrícola, nomeadamente em zonas de montanha ou em zonas com outras desvantagens naturais ou vulnerabilidades, contribuem para melhorar o rendimento dos produtores e assegurar uma atividade socioeconómica assente nas potencialidades desses territórios. Estas políticas têm um espetro alargado, ondem cabem os pagamentos diretos aos agricultores, as medidas ambiente-clima que valorizem os serviços prestados nestas zonas, como a manutenção das raças e variedades autóctones, das culturas permanentes tradicionais, do mosaico e dos sistemas agroflorestais, a valorização dos produtos locais, mas também as medidas de inovação e investimento que apoiam a produção de conhecimento, a implementação de novos sistemas agroflorestais e a melhoria de gestão nos existentes. Estas políticas agrícolas, estando atualmente a ser implementadas quer no âmbito do primeiro pilar da PAC, quer do segundo pilar, através do PDR2020, irão ter continuidade no Plano Estratégico da PAC (PEPAC) que arranca em 2023.
Que importância atribui a uma atividade com mosaico agroflorestal para a sustentabilidade económica e ambiental das explorações agrícolas?
A manutenção do mosaico agroflorestal, que assegure a descontinuidade de zonas de floresta, contribui para uma maior resiliência dos territórios a fenómenos adversos, nomeadamente a incêndios rurais, prevenindo a sua propagação, ao mesmo tempo que acautela a degradação dos solos, dos recursos hídricos e da biodiversidade.
A criação de condições para manter a atividade agrícola em zonas florestais, através da valorização dos recursos e produtos desses territórios, não só cria condições de sustentabilidade às explorações agrícolas, em particular à agricultura familiar, mas à sobrevivência dos próprios territórios enquanto espaços povoados.
Afirmou que a investigação científica, em conjunto com inovação e criatividade, pode dar resposta aos desafios do setor. De que forma?
Gostaria de destacar os projetos que decorrem dos grupos operacionais e da agenda de inovação financiada pelo PRR. Em articulação com os nossos parceiros europeus, estamos a desenvolver medidas para responder aos desafios de futuro, nomeadamente de forma a combater a escassez de água no nosso território. Investimos em projetos de regadio para garantir uma gestão eficiente da água para rega, criando novas estruturas e reabilitando as mais antigas.
Apoiamos projetos de agricultura de precisão, para um uso mais eficiente da terra, de forma a mitigar o problema da pobreza dos nossos solos agrícolas. Com tecnologia inovadora, apostamos em novas formas de fertilização dos terrenos agrícolas, métodos inovadores de combate às pragas e valorização das nossas espécies autóctones.
Apoiamos também investimentos para a digitalização da agricultura e para a instalação de painéis solares, e ainda para aproveitamento e valorização de efluentes agrícolas. Enfim, apostamos numa agricultura de futuro, mais moderna e sustentável
Que incentivos estão previstos, numa ótica da Transição Verde, nomeadamente para o reequipamento com máquinas com mais digitalização e para a intensificação da eletrificação nos trabalhos agroflorestais?
Os incentivos à transição verde do país encontram-se incluídos num conjunto de instrumentos de política financiados por fundos europeus e nacionais. No que diz respeito aos incentivos da PAC, serão implementados em Portugal a partir de 2023, através do PEPAC [Plano Estratégico da PAC], ao mesmo tempo que se conclui a implementação das candidaturas aprovadas no âmbito do PDR 2020 atualmente em curso.
O PEPAC inclui um conjunto de incentivos de apoio à aquisição de máquinas e equipamentos que introduzam inovação nos processos produtivos, havendo medidas específicas de apoio às empresas para ao investimento na melhoria do desempenho ambiental, incluindo o investimento em transição energética.
“A manutenção do mosaico agroflorestal contribui para uma maior resiliência dos territórios a fenómenos adversos, nomeadamente a incêndios rurais, prevenindo a sua propagação, ao mesmo tempo que acautela a degradação dos solos, dos recursos hídricos e da biodiversidade.”
Os subscritores do Compromisso Floresta 2030 defendem que a importância da floresta deve ser reconhecida no PEPAC, dotando as medidas florestais de um orçamento adequado à dimensão do setor. Com que apoios poderá este contar no âmbito da nova PAC?
A lógica de intervenção do PEPAC assenta numa visão estratégica de gestão ativa de todo o território, baseada numa produção agrícola e florestal inovadora e sustentável. Os apoios do Desenvolvimento Rural para a preservação e valorização da floresta e da respetiva produção materializam-se sobre áreas e atividades florestais especializadas, áreas agroflorestais e mesmo em áreas agrícolas coadjuvantes, como é o caso do mosaico, contribuindo para vários objetivos do PEPAC.
No objetivo Gestão Ambiental e Climática, as medidas de apoio à conservação do montado e ao mosaico agroflorestal somam cerca de 90 milhões de euros. Associadas ao objetivo Sustentabilidade das Zonas Rurais, encontram-se as medidas que integram o eixo da Silvicultura Sustentável, com uma dotação aproximada de 275 milhões de euros, e a medida de apoio ao investimento na Bioeconomia de base agrícola e florestal, com uma dotação conjunta que ultrapassa os 150 milhões de euros. Ainda no âmbito da abordagem territorial integrada, existem um conjunto de intervenções que integram os programas de Ação em Áreas Sensíveis, com ações ao nível da Pequena Gerês, dos Soutos Notáveis de Montesinho Nogueira, do Barroso, dos sistemas de Montado e da proteção de espécies com estatuto, que ultrapassam os 17 milhões de euros. A estes apoios acrescem ainda os relativos à inovação e conhecimento, que se destinam aos produtores agrícolas e silvícolas, bem como os relativos à organização da produção.
Não temos dúvidas que a importância da floresta se encontra reconhecida no PEPAC e estamos também cientes que o contributo da PAC para o apoio ao rendimento e resiliência da agricultura em zonas vulneráveis desempenha um papel fundamental na gestão dos espaços rurais e na proteção da floresta nesses espaços.
No contexto dos recursos agrícolas e florestais, que novas oportunidades surgem com o novo Quadro Comunitário Portugal 2030?
Este Quadro Comunitário de Apoio integra, pela primeira vez, numa estratégia única, os dois pilares da PAC, criando condições para a definição de uma lógica de intervenção mais coesa e favorecendo a contribuição conjunta das medidas para cada um dos objetivos, bem como a avaliação dos respetivos efeitos.
Um dos grandes eixos de mudança neste quadro é a convergência e coesão na alocação dos pagamentos diretos com uniformização do pagamento em 2026 e abertura gradual de reserva já iniciada em 2022 nas zonas vulneráveis, com impacto esperado muito favorável no rendimento das explorações destas zonas.
Por outro lado, há um reforço do apoio para a transição verde através das medidas de gestão ambiental relacionadas com agricultura e floresta – Ecoregimes, Medidas Agroambientais e Clima – bem como do apoio à digitalização, em complementaridade com a Agenda Terra Futura, e ao investimento para melhor desempenho ambiental tendo em vista o alcance dos objetivos do Pacto Ecológico Europeu.
Há ainda melhorias na continuidade, como o aumento do incentivo ao rejuvenescimento do setor, à Pequena Agricultura e à valorização dos recursos endógenos, bem como uma maior flexibilidade no apoio ao desenvolvimento local e simplificação na concessão dos apoios.
É o encadeamento coerente dos diferentes tipos de intervenção disponíveis, que permitirá promover uma atividade agrícola e florestal sustentável em todas as regiões de Portugal. Esta atividade produtiva tem que ser suportada no princípio de uma “gestão ativa” do território, centrada no principal ativo dos agricultores e produtores florestais, que é o solo e a sua ligação com os restantes recursos naturais, porque só com base no seu uso sustentável, do ponto de vista económico e ambiental, é que será possível assegurar a resiliência e a vitalidade das zonas rurais.
A entrevista integral pode ser lida na edição número 9, de novembro de 2022, que pode subscrever ou consultar em formato digital aqui.
O artigo foi publicado originalmente em Produtores Florestais.