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Incêndios: França enfrenta situação catastrófica com mais de 50 mil hectares ardidos

França enfrenta uma época de incêndios catastrófica, avalia um especialista ouvido pela agência Lusa, considerando que o país pode estar a viver o seu pior ano de sempre, com mais de 50 mil hectares já consumidos.

“Estamos perante uma temporada de incêndios catastrófica, especialmente em comparação ao que observámos nos últimos anos e, sobretudo, considero que é catastrófico porque temos incêndios em zonas onde, até agora, não estávamos habituados”, disse Julien Ruffault, investigador do Instituto Nacional da Investigação Agrónoma (INRAE), em declarações à Lusa.

A situação dos fogos em França, que viu em 2022 multiplicar a área normalmente ardida por sete, levou no início do mês de Agosto o Governo a formar uma ‘task-force’ sob o comando da primeira-ministra, Elisabeth Borne, e com a participação do ministro da Administração Interna, Gerald Darmanin, do ministro da Agricultura, Marc Fesneau, e o ministro do Ambiente, Christophe Béchu.

Borne esteve hoje em Gironde, a região mais fustigada pelo fogo, onde disse que a França nunca mobilizou tantos meios para o combate aos fogos como este ano e que o país será ajudado por outros parceiros europeus como a Grécia ou a Suécia.

“Posso assegurar-vos que nunca mobilizámos tantos meios aéreos na luta contra os incêndios […] Vamos trabalhar no reforço dos meios de segurança civil com uma planificação para os próximos cinco anos e, claro, beneficiamos da solidariedade europeias”, garantiu a chefe do Governo.

França conta com mais de 250 mil bombeiros, entre os quais cerca de 20 por cento são profissionais, e cerca de 25 aviões de combate aos incêndios, entre eles 12 Canandair, segundo Gerald Darmanin.

O ministro incitou ainda as empresas que têm trabalhadores com formação de bombeiros voluntários a permitirem que estes profissionais se ausentem para combater os fogos nas regiões mais afetadas.

No entanto, este ano, o perfil dos fogos que estão a assolar a França é diferente, já que se algumas das regiões no país, especialmente no sul do país, ardem com frequência, o facto de haver incêndios este ano na Bretanha, no norte, ou na região do Maciço da Chartreuse, junto aos Alpes, tem estado a surpreender os investigadores, as autoridades e as populações.

“Mais de 50 mil hectares, o que é incrível. No ano que usamos como referência, quando houve uma grande vaga de calor, em 2003, arderam 70 mil hectares, mas muito concentrado no Sudeste. Agora quase todas as regiões estão a ser afetadas e é algo muito inquietante”, referiu Julien Ruffault.

Para este investigador especializado na ecologia das florestas mediterrânicas ainda é cedo para identificar as razões destes fogos de grandes proporções, mas as alterações climáticas são a maior pista para o flagelo.

“Teremos de analisar as condições, mas observamos que independentemente de todos os outros fatores, a área ardida e a quantidade de grandes fogos estão muito ligados às alterações climáticas. Este ano, temos todos os fatores reunidos, desde logo uma seca que dura desde a primavera, que se combinou em junho e em julho com vagas de calor e isso secou toda a vegetação, fornecendo matéria propícia para o início e propagação dos incêndios”, explicou.

Para travar estes fogos, o investigador sugere que se continue a apostar na prevenção, especialmente na limpeza das florestas no sul do país, assim como avisos nacionais à população e já não tão concentrados em determinadas zonas que até agora tinham maior risco de incêndio.

De maneira direta, sabemos que em França, e penso ser o mesmo caso em Portugal, cerca de 95 por cento dos fogos têm origem humana. E aí há um trabalho a fazer para limitar o desencadeamento do fogo, nomeadamente a prevenção, especialmente nos sítios onde as pessoas estão pouco habituadas às boas práticas de gestão de risco”, indicou.

Mesmo com todos os cuidados, Julien Ruffault alerta que a subida galopante das temperaturas devido ao aquecimento global vai tornar estes grandes fogos recorrentes no país. Só em 2022 já foram batidos muitos recordes de temperaturas no país, com 63 municípios a superarem em julho o recorde absoluto do calor, chegando aos 42 graus.

“Não sei se vamos conseguir erradicar estes fogos extremos, podemos é tentar controlar as suas consequências. Mas eles vão continuar a existir. Temos de nos preparar para este tipo de fogos de forma individual e coletiva. Também não devemos entrar numa profecia autoconcretizada e a maneira de parar estes fogos é travar o aquecimento global”, concluiu.


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