O Governo assegurou hoje no parlamento que as alterações introduzidas ao decreto-lei sobre o Sistema de Gestão integrada de Fogos Rurais, no qual está incluída a carta de risco de incêndio, permitem uma maior participação dos municípios.
As garantias foram dadas pelo secretário de Estado da Conservação da Natureza e Florestas, João Paulo Catarino, que foi ouvido esta tarde, juntamente com o presidente do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) pela Comissão de Agricultura e Pescas no âmbito de várias audições, a pedido do PSD, sobre a Carta de Perigosidade de Incêndio Rural, de caráter nacional.
A Carta de Perigosidade de Incêndio Rural, instrumento para planeamento das medidas de prevenção e combate a incêndios rurais, para definição dos condicionamentos às atividades de fruição dos espaços rurais, foi publicada sob aviso em Diário da República em 28 de março.
Desde a sua publicação, foi alvo de críticas de várias comunidades intermunicipais, municípios e de uma associação de vítimas de incêndios, tendo sido publicado no dia 19 deste mês um decreto-lei que suspende a Carta de Perigosidade de Incêndio Rural, até março de 2023.
Perante este contexto, e numa audição que durou mais de duas horas, João Paulo Catarino defendeu a importância que a Carta de Perigosidade terá para identificar as zonas de maior risco de incêndio rural.
“A carta de perigosidade representa um salto qualificativo, aumentando o rigor de informação. Temos de ter uma visão nacional e não municipal da perigosidade”, defendeu.
Respondendo às críticas dos deputados sobre o facto de os autarcas não terem sido ouvidos sobre este processo, o governante explicou que o anterior decreto-lei sobre o Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais (SGIFG) e o estabelecimento de Áreas Prioritárias de Prevenção e Segurança (APPS) limitava muito a participação dos municípios.
“Esta alteração permite que todos os autarcas tenham toda a legitimidade para se pronunciar sobre o ordenamento do território do seu concelho”, afirmou.
De acordo com a alínea 3 do artigo 42.º do decreto-lei sobre o SGIFG, as comissões sub-regionais de gestão integrada de fogos rurais, nas quais estão integrados representantes dos municípios, irão adaptar, até 31 de março de 2023, “as APPS à realidade territorial e necessidades de priorização das ações de proteção contra incêndios”.
Na anterior versão do documento dizia-se apenas que as comissões sub-regionais de gestão integrada de fogos rurais poderiam “adicionar às APPS territórios onde exista reconhecido interesse na proteção contra incêndios rurais”.
João Paulo Catarino negou também que a Carta de Perigosidade de Incêndio Rural seja um “entrave ao desenvolvimento económico”, ressalvando que nos territórios com maior risco de incêndio pode existir atividade económica, “desde que sejam respeitadas as regras e os condicionamentos”.
Por seu turno, o presidente do ICNF, Nuno Banza, defendeu também a importância da Carta de Perigosidade, divulgando alguns dados estatísticos.
“Esta Carta de Perigosidade explica mais de 90% dos incêndios ocorridos no território continental desde 1975 a 2018. Isto quer dizer que 90% dos incêndios ocorreram em áreas classificadas como perigosidade alta ou muito alta”, apontou.
Seguindo o mesmo raciocínio, Nuno Banza referiu que 92% da área ardida em 2021 coincidiu com área classificada na carta como perigosidade alta ou muito alta e entre 07 e 25 de julho deste ano essa correspondência foi de 65%.
“Ilustra a factualidade de que a carta é uma ferramenta que apresenta este nível de certeza e que identifica os territórios de maior risco”, argumentou.
Durante a sua exposição, o presidente do ICNF afirmou também não fazer sentido envolver os municípios na elaboração desta carta, ressalvando que se trata de “um documento técnico”, uma consideração que gerou uma declaração de repúdio por parte da bancada do PSD.
“Quando nos acusam de que não concertamos esta Carta com os autarcas é verdade. Nós não concertamos com os autarcas e provavelmente os senhores deputados não queriam ter um ICNF que concertasse o risco de incêndio rural com autarcas numa carta de perigosidade. Portanto, nós não concertamos esta Carta e creio que ninguém queria que o fizéssemos”, afirmou.
Nesse sentido, Nuno Banza argumentou que aquilo que o ICNF fez neste caso “não é diferente daquilo que fez na elaboração da Carta de Risco Sísmico ou em outras cartas técnicas, sublinhando que estes documentos “não têm discussão pública nem consulta pública”.
“Aquilo que se faz é recolher os contributos técnicos e envolver os especialistas”, apontou.
A Carta de Perigosidade de Incêndio Rural está suspensa até março de 2023, na sequência de um decreto-lei publicado no dia 19 deste mês.
“O presente decreto-lei prevê a adaptação das APPS [Áreas Prioritárias de Prevenção e Segurança] no âmbito das comissões sub-regionais de gestão integrada de fogos rurais, até 31 de março de 2023, mantendo-se, até lá, em vigor as cartas de perigosidade constantes dos PMDFCI [Planos Municipais de Defesa da Floresta contra Incêndios] ”, pode ler-se no diploma.
A criação deste horizonte temporal, de acordo com o documento, “permite avaliar eventuais constrangimentos sentidos por alguns municípios na aplicação” da Carta de Perigosidade de Incêndio Rural, “em particular quanto às restrições e condicionamentos aplicáveis às APPS”.
No documento, o Governo explica que “a grande diferença entre a metodologia anteriormente adotada a nível municipal pelos Planos Municipais de Defesa da Floresta contra Incêndios (…) e a utilizada no âmbito” da carta de Perigosidade é que todos os concelhos deixam de ter as “cinco classes de perigosidade em proporções idênticas” a que eram obrigados.
Essas classes faziam com que “concelhos com um território de baixa perigosidade tivessem obrigatoriamente áreas classificadas como de alta ou muito alta perigosidade, o mesmo acontecendo com a situação inversa”.