Incêndios – o fogo não perdoa: os erros cometidos na gestão do território

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Como urbanista, defensor da causa pública durante mais de quatro décadas, no âmbito da investigação de questões relacionadas com o território que nos acolhe e pela sua importância na vida do ser humano, tenho publicado trabalhos e alertas sobre o flagelo dos incêndios, dos sismos, das inundações, das alterações climáticas e muitas outras matérias envolvidas neste importante domínio.

Se o fogo não perdoa os erros cometidos na gestão do território, a água, também não. Mesmo em inundações destruidoras, estará no seu devido lugar, segundo a configuração do solo e a impermeabilização inexorável provocada pela urbanização que, ainda, produz 70% dos gases com efeitos de estufa.

Estas situações representam fenómenos resultantes das alterações climáticas e de outros procedimentos humanos “menos corretos”.

Já nem podemos afirmar que estas desgraças só acontecem aos outros… Os pequenos sismos sentidos também representam avisos muito importantes. É tempo de agir, mas… saber agir.

A natureza é implacável, mas com a tecnologia disponível é possível resolver incêndios antes da propagação

A natureza é implacável, já sabemos, e responde sempre com reações adequadas à forma insensata e inadequada com que é tratada.

Gerir a sociedade, em nada se assemelha a participar num evento desportivo, em que os jogadores se preparam… mas atuam segundo as circunstâncias do momento.

É preciso muito mais do que isso!

As vias de circulação, urbanas ou rurais, devem possuir, obrigatoriamente, margens de proteção adequadas.

Os acessos ao interior arborizado são indispensáveis.

Este verão, e uma vez mais, está a ser marcado pela autêntica catástrofe resultante dos incêndios que transformaram uma enorme parcela do nosso país em terra queimada.

Nos últimos 30 anos perdemos muito mais de um terço do nosso massacrado território…

Este drama sistematicamente repetido, representa uma frustração para todos

Se para qualquer ser humano é doloroso ter conhecimento das vítimas, da destruição e da imagem negra da paisagem destruída pelo fogo, para os que, de alguma forma, se encontram relacionados com a melhoria da qualidade de vida através do correto ordenamento do território, a sensação é de terrível frustração.

Todos sentimos a amargura a que nenhum ser humano consegue fugir.

Para além do impacto da dramática perda de vidas, de bens, de situações humanitárias lastimáveis, de gente humilde que em poucos minutos assiste à destruição do resultado de uma vida inteira de trabalho e sacrifício… sentimo-nos como se, nas cinzas, se encontrasse também um pouco do ideal da segurança e da qualidade de vida que perfilhamos, em que se harmoniza o uso do solo, que nos acolhe, com a fruição das suas potencialidades e a correta distribuição das atividades que envolvem a sociedade.

As bases da política florestal continuam por concretizar

A Lei de Bases da Política Florestal representa um instrumento de política sectorial de gestão do território e, como tal, diretamente relacionada com a sua utilização, porém, a sua concretização desenvolve-se com tal lentidão que pouco falta para que seja desnecessária… o avanço do fogo não se compadece com a falta de acessos e de meios de combate e com os erros gravíssimos praticados na gestão florestal.

As leis continuam a não resolver os problemas da sociedade

Sem dúvida, “as leis, como se confirma, não resolvem os problemas dos homens” …

Somos uma jovem democracia, a comparar com muitas outras que não se viram cerceadas na educação, cujas reformas se sucedem ininterruptamente, no ensino e, consequentemente, no desenvolvimento de toda a sociedade.

Em conclusão, não nos tem servido de grande exemplo o drama dos incêndios dos anos anteriores.

Infelizmente, pouco ou nada aprendemos… nem sequer que devemos apostar na prevenção, implementar acessos suficientes e adequados para combate ao fogo…, investir na formação dos nossos bombeiros, em meios tão sofisticados e modernos quanto possível, pois o custo desta catástrofe cobriria muitos anos de vigilância em tempo real por satélite.

Minimizar a utilização de espécies arbóreas não adequadas ao nosso território é uma imposição indiscutível.

Na parte II, concluiremos que planificar devidamente a utilização do território representa a melhor forma de prevenir catástrofes.

Leia também: Albufeira: criminalidade, insegurança… ou a qualidade da gestão urbanística | Por António Nóbrega

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