Mosca da fruta: “Não há uma solução mágica” contra uma nova praga, mas já é possível tornar pomares mais resistentes

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Qualquer um de nós pode já se ter deparado com fruta picada ou até com moscas da fruta que invadem a cozinha. Ao longo dos anos, agricultores e cidadãos já se habituaram a conviver com pragas, mas a espécie Drosophila suzukii, que ataca os frutos saudáveis, tornou-se uma verdadeira praga nos pomares. Para mitigar os efeitos, um projeto português tentou encontrar a melhor forma controlar esta espécie de mosca da fruta.

Oriunda do Japão, esta praga tem impactado a agricultura na Europa desde 2009 ao provocar perdas na produção entre 20 e 50%. Em menos de dez anos, causou perdas de mais de 40 milhões de euros na Itália, por exemplo. Alimenta-se, sobretudo, de pequenos frutos, como mirtilos, morangos ou uvas. “Quando há disponibilidade de alimentação e o clima é propício, a propagação e o desenvolvimento [da Drosophila suzukii] é exponencial”, afirma João Cardoso Lopes, responsável pela Quinta da Enxertada.

Para tentar combater esta problemática, a exploração agrícola, em conjunto com a Universidade do Porto e o Instituto Politécnico de Viana do Castelo, desenvolveu o projeto STOP.SUZUKII, apoiado pelo programa Norte 2020 através do qual recebeu cerca de 625 mil euros, dos quais 464 mil euros provem do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER).

Devido aos poucos conhecimentos sobre esta praga na Europa, a investigação testou várias soluções possíveis, desde armadilhas até à utilização de predadores da Drosophila suzukii. João Cardoso Lopes alerta que não descobriram uma “fórmula mágica”, mas uma forma holística de os agricultores se adaptarem à sua presença. Conceberam “uma variedade de soluções que devem jogar em concorrência, de forma a tentar diminuir os efeitos, que não são passíveis de ser extintos”.

Qual era o objetivo do projeto STOP.SUZUKII?

O que pretendíamos era tentar entender melhor este flagelo, mitigá-lo e combatê-lo. Portanto, [entender] o que é esta praga, que está em elevada expansão pelo país e pela Europa com profundos impactos. A nossa ideia era entender melhor o animal em questão, a Drosophila suzukii, formas de mitigar, de combater, de manter a fruta mais resistente tanto no campo como no pós-colheita e no transporte para os consumidores finais que estão espalhados um pouco por todo o mundo.

Quais são os impactos desta Drosophila suzukii?

Não é nada que seja diferente das outras drosófilas, [mas] tem as suas particularidades e, como não tem predadores tão habituados nem conhecimento dos agricultores para as combater, torna mais difícil o combate e mais rápida a sua propagação.

Ela tem um ciclo de vida curto, mas um ciclo de reprodução extremamente rápido. Uma drosófila pode dar milhares de drosófilas num espaço de poucos dias. Portanto, quando o ataque começa no campo é devastador. A drosófila começa por picar a fruta, larga os óvulos, que por sua vez darão uma pequena larva, e essa larva no espaço de dois ou três dias começa a degradar o fruto, fica mole, sem consistência, apodrece, e passados uns dias, essa larva cai ao chão e o ciclo da drosófila continua.

Portanto, é como a mosca da fruta, também já estamos habituados e sempre vimos fruta picada, seja ela qual for, mas, atendendo à novidade no terreno, esta consegue causar um problema muito mais grave que as outras às quais já estávamos habituados.

Que métodos desenvolveram para combater esta praga?

Nós fizemos vários testes, desde logo fazer coberturas, umas que excluíam completamente a possibilidade da entrada da mosca Drosophila suzukii dentro da área de testes, outras com outro tipo de redes que permitiam a entrada, mas diminuíam a capacidade da mesma de circular. Testámos sebes naturais que com odores poderiam repelir um pouco a suzukii de estar naquela zona. Fizemos também testes de armadilhas com diversas gamas de luz porque a drosófila tem períodos de atividade maiores sobretudo de manhã e ao final do dia, e nós tentamos com recurso essas armadilhas captar ou recolher drosófilas à noite. Portanto, fomos um pouco à procura de testar várias soluções.

Qual foi a solução mais eficaz?

Não excluímos nenhuma das práticas, mas, infelizmente, não há uma solução mágica. Portanto, é utilizar uma diversidade de boas práticas, sendo que, neste momento, aquela que mais advogo é manter armadilhas no campo. Armadilhas que são pequenos recipientes que têm um atrativo lá dentro, no nosso caso é vinagre com açúcar e uma gotinha de detergente, e isto atrai a drosófila, que bebe esta poção e morre de seguida.

Portanto, antes da produção começar é fundamental ter as armadilhas colocadas, monitorizar, e mais ou tão importante colher a fruta momento certo. Se houver um atraso de alguns dias, a drosófila começa a expandir-se, porque são centenas de milhares, milhões até, de pequenas bagas. Havendo muita disponibilidade de fruta no seu estado ótimo, o campo não estando limpo, não havendo armadilhas suficientes, permite que no espaço de poucos dias, o que pode ser uma incidência de 1 a 3%, aumente para 30 a 50%, o que inviabiliza a comercialização desse fruto. Esse ataque massivo implica a destruição de fruta e a limpeza completa do pomar, utilização inseticidas, o que, sendo agricultores de agricultura biológica, não é fácil recorrer, só em situações drásticas.

Quais foram as vantagens deste projeto?

Não posso dizer que tenha sido um momento eureca que altera a minha empresa de mirtilos ou que altere também a fileira, mas estamos mais capacitados e também era esse o objetivo que se pretendia. Nós sabíamos que, à partida, era muito difícil conseguir encontrar uma ferramenta que eliminasse o problema. Se não muito difícil, até mesmo impossível. O que se pretendia era entender melhor a problemática e encontrar formas de lidar com ela. Nesse sentido, estamos muito capacitados e muito mais resistentes ou resilientes, como é a palavra da moda agora.

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