
Após as invasões napoleónicas, no século XIX, cresceu a atenção dedicada à defesa militar do território europeu. Essa preocupação estratégica teve impacto direto na escolha de localizações para várias estações ferroviárias, sobretudo nas zonas fronteiriças. Um dos casos mais representativos encontra-se em Espanha, próximo da linha que separa o país de França.
Uma estação grandiosa em terreno instável
A estação ferroviária de Canfranc, localizada na comunidade autónoma de Aragão, foi inaugurada em 1928, assumindo-se à época como um marco da engenharia modernista. Com uma fachada que inclui mais de 150 portas e 350 janelas, o edifício destaca-se na paisagem pirenaica. Hoje em dia, foi convertida num hotel de luxo e é frequentemente citada como uma das estações ferroviárias com pior localização no mundo.
A construção teve lugar numa zona onde convergem cinco ribeiras de escoamento torrencial que desaguam no rio Aragão. Esta área é particularmente sensível a fenómenos naturais como deslizamentos de terra e avalanches, o que a torna vulnerável a catástrofes naturais. Ao longo do tempo, a necessidade de enfrentar estes riscos levou ao desenvolvimento de diversas obras de mitigação.
Adaptação às novas exigências climáticas
De acordo com o portal Tempo.pt, o aumento de fenómenos meteorológicos extremos relacionados com as alterações climáticas, como chuvas intensas e localizadas, tornou premente a procura de soluções sustentáveis.
A região de Canfranc foi, por isso, alvo de um plano abrangente de engenharia florestal com o objetivo de reduzir os riscos naturais e proteger tanto a população local como os milhares de viajantes que atravessam aquela zona fronteiriça.
Entre as medidas adotadas destacam-se a reflorestação das encostas com espécies vegetais adaptadas ao clima de altitude, com o objetivo de estabilizar os solos e diminuir os efeitos da erosão. Foram também implementadas estruturas como muros de contenção, diques e acumuladores de neve, para reforçar a segurança.
Decisão militar com custos naturais
A planície de Arañones, onde se encontra a estação, foi escolhida com base em critérios de defesa militar, por oferecer vantagens estratégicas. No entanto, essa decisão implicou a edificação numa área de risco elevado. A engenharia procurou, desde então, minimizar os impactos, reforçando a segurança sem comprometer o enquadramento paisagístico.
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Antes das intervenções de estabilização, as encostas envolventes encontravam-se cobertas por detritos soltos que frequentemente causavam acidentes. Nas primeiras décadas do século XX registaram-se diversos deslizamentos que atingiram habitações e infraestruturas essenciais. Estes episódios foram determinantes para a implementação de um plano de resposta estruturado.
Investimento contínuo na prevenção
As obras de engenharia florestal e hidráulica realizadas em Canfranc contaram com um investimento público expressivo. Durante anos, o orçamento destinado à manutenção e a novas intervenções ultrapassava anualmente um milhão de pesetas, permitindo testar soluções inovadoras para prevenir catástrofes naturais.
O engenheiro Benito Ayerbe desempenhou um papel central no desenvolvimento destas estruturas. Mais recentemente, o engenheiro Ignacio Pérez-Soba tem analisado estas intervenções, considerando-as exemplares num contexto de agravamento das alterações climáticas e de aumento da frequência de fenómenos extremos.
Alternativas integradas na natureza
Segundo Pérez-Soba, muitos dos problemas actuais exigem uma conjugação equilibrada entre a engenharia civil clássica e a engenharia biológica. Esta abordagem propõe soluções que respeitam a morfologia natural e trazem vantagens sustentáveis para o ambiente e para a segurança das populações.
Atualmente, existem mais de 500 estruturas de proteção em torno da estação de Canfranc. Estas continuam a desempenhar um papel essencial na proteção da área, funcionando como referência em situações semelhantes, como as recentes inundações em localidades do Mediterrâneo espanhol, nomeadamente em Paiporta, na província de Valência.
Estratégias aplicáveis noutras regiões
Apesar das diferenças entre os Pirenéus e as zonas mediterrânicas, os princípios implementados em Canfranc são considerados replicáveis noutros contextos. A reflorestação das zonas altas e intermédias dos cursos de água é uma das estratégias recomendadas, uma vez que as árvores absorvem parte da água da chuva e atenuam o impacto das enxurradas.
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