Nuno Correia, FPAS: Panorama das exportações Portuguesas

Exportações crescem e chegam aos 191 milhões de euros no final do ano passado. Com 2021 a prometer bater novos recordes, entrevistámos Nuno Correia, diretor da FPAS, para desenhar o cenário do setor num ano de pandemia.

A contrariar a tendência dos mercados face à crise do covid-19, o número das exportações cresce e regista máximos de 191 milhões de euros em 2020. Cerca de 30% da produção nacional foi exportada, o que traduz 6,7% do valor das exportações do setor agroalimentar no último ano, atingindo valores na ordem dos 191 milhões de euros (30,6% da produção suinícola nacional).

De acordo com dados do INE, as exportações de suínos entre janeiro e setembro de 2020 apresentaram, face ao período homólogo, um aumento no volume de suínos vivos exportados (cerca de +54,3%) e de carne de porco (cerca de +45%), em particular para países asiáticos.
China e Angola continuam a ser os principais países importadores fora do mercado europeu, seguidos pelo Reino Unido. Com a meta de atingir cada vez mais o mercado internacional, a aposta dos produtores nacionais continua sobretudo nos mercados asiáticos, com a mira em países como o Vietname e Filipinas.

Face a estes números, Nuno Correia, diretor da FPAS e administrador da Agrupalto, salienta o esforço conjunto de toda a fileira no sentido de alcançar cada vez mais uma maior notoriedade e presença no comércio internacional. Em entrevista, explica à revista Suinicultura como perspetiva o ano de 2021 e com viveu o último ano de pandemia.

Qual o balanço que faz das exportações portuguesas nos últimos anos?

Podemos considerar os últimos três anos como muito positivos para a suinicultura portuguesa. Inicialmente, demos um grande salto no envio de animais vivos para Espanha, e nos últimos dois anos demos um grande salto com as exportações para a China.
Deve dar que pensar como um país deficitário se torna exportador em grande escala. A resposta é simples: nos últimos dez anos os compradores de carne em Portugal concentraram-se bastante e Espanha teve um grande crescimento em produção e capacidade de abate assente numa produção verticalizada. Se considerarmos os dois países juntos, somos excedentários em mais de 130 por cento. Como tal, os empresários portugueses foram à
procura da concentração na oferta e na verticalização do negócio e, desta forma, conseguiram de forma espetacular encontrar a dimensão necessária para lutar com as mesmas armas dos nossos vizinhos espanhóis e ser competitivos perante os nossos compradores.

Quais os maiores desafios em 2020 face à pandemia e todos os constrangimentos sentidos no último ano?

Tivemos de lutar com uma amplitude em variação de vendas ao longo de todo o ano, tanto no mercado nacional como no de exportação. No nosso caso,
da Agrupalto, tivemos de fazer um grande esforço financeiro pela congelação de carcaças, cerca de 4.000 por semana durante três meses, arriscando na incerteza. Podemos dizer com orgulho que conseguimos, ajudámos a produção nacional ao retirar esses animais do mercado nas alturas críticas e correu bem, porque o mercado de exportação acabou por absorver todo o nosso stock. Só se consegue com muita resiliência e sócios muito fortes que acreditam nos projetos.

Como ultrapassou a dificuldade de transporte e decréscimo de mão de obra em 2020?

Podemos dizer que temos pessoas extraordinárias a trabalhar dentro do grupo e foram elas que, quando todos estavam confinados, trabalharam e lutaram pelas nossas empresas e por ter alimento no prato dos portugueses.
Nos transportes, a nível nacional, não tivemos qualquer problema. Mas a nível da exportação, em determinada altura existiam vendas mas não tínhamos contentores para transportar a mercadoria, pelo simples facto de todos os portos na China estarem bloqueados pela Covid-19 e não poderem libertar os mesmos. Mas tudo se ultrapassou.

Quais as previsões de números para 2021?

2021 vai ser um ano de grande mudança. As exportações de animais vão aumentar ainda mais para satisfazer o grande crescimento das unidades de abate em Espanha, que necessitam de animais para poderem trabalhar. Este fenómeno vai fazer com que cada vez venham menos animais vivos de Espanha para cá, e valorizem melhor os porcos em Portugal para os captar para Espanha.
Irá nascer também a maior unidade de abate de animais em Portugal, a Maporal, com capacidade de abate de vinte mil animais por semana e totalmente verticalizada, com uma produção que deixará de colocar esses animais vivos no mercado.
Assim, avizinha-se um ano de grande procura de animais por todas as unidades de abate em Portugal que, como se sabe, têm uma capacidade de abate superior à produção nacional disponível.

Quais as maiores dificuldades atualmente para fazer crescer ainda mais as exportações?

Como é que podemos crescer na exportação se não crescemos na produção? Continuamos a demorar três a cinco anos para legalizar uma unidade de produção em Portugal.
O nosso crescimento tem sido nulo nos últimos dez anos, ao contrário dos espanhóis que, apoiados com uma estratégia vertical do governo espanhol, tornaram-se os maiores produtores de carne de porco na Europa e o país está entre os cinco maiores produtores do mundo.
É uma pena que toda essa riqueza fique em Espanha e que Portugal continue a importar cada vez mais.

Quais são as queixas principais dos produtores nacionais?

Há burocracia excessiva e falta de estratégia política para a produção nacional. Temos muito terreno e zonas áridas em Portugal a precisar de matéria orgânica.
Temos de criar riqueza nas zonas do interior do país e a agricultura e a pecuária são o único caminho. Temos de nos saber defender e ser respeitados como produtores de alimentos – esse será o grande desafio dos próximos anos.

Que iniciativas estão a ser tomadas para solucionar o problema das exportações para o Vietname e Filipinas?

É uma situação complexa. Temos falta de representação diplomática nas Filipinas, o que dificulta a comunicação. Penso que só quando pudermos retornar as viagens poderemos perceber melhor quais os passos a seguir. Falta também algum acompanhamento mais acima, pelas entidades responsáveis por este processo, mas sem dúvida que são mercados de grande oportunidade.

Quais os novos mercados em mira?

Se conseguirmos Vietname e Filipinas será muito bom, de resto já existe muito mercado aberto.

Quais os principais apoios/incentivos do governo português às exportações nacionais de porcos e quais os que gostaria de ver em prática?

O governo atribui apoios para as empresas exportadoras em geral e penso que deve continuar a fazê-lo, a apoiar os empresários em geral, que se arriscam na aventura da exportação e que saem da sua zona de conforto. O estado deve continuar a fomentar os projetos de investimento, aprová-los, cumprindo as condições e libertar verbas mais cedo. Deve apoiar as tesourarias das empresas exportadoras, já que necessitam de mais stock permanente. Deve fomentar o aumento de plafons de seguros de crédito, porque sem eles é difícil de concretizar negócios.

Qual o papel da FPAS na abertura do mercado chinês?

A FPAS tem contribuído muitíssimo para a abertura de todos os mercados, onde se inclui a China. Esta direção e o seu presidente deixam a sua marca na história da Suinicultura nacional – os números e as conquistas falam por si.

Até que ponto a Peste Suína Africana (PSA) tem beneficiado as exportações portuguesas?

A peste suína criou um grande desequilíbrio no mercado mundial pelo facto de ter dizimado cerca de 40% da produção chinesa. Não nos podemos esquecer que este país é o maior produtor mundial. Sozinha, a China produz mais do que toda a Europa, Estados Unidos, Brasil e mais 10 países a seguir juntos. E mesmo assim não deixa de ser o maior importador mundial. Este desequilíbrio trouxe vantagens para todos os países que exportam, incluindo Portugal.

Há receio de que a PSA se possa disseminar em Portugal?

O Estado e os produtores têm aqui um papel fundamental na implementação de regras de biossegurança para que a PSA não chegue ao nosso país. Sempre que a Peste Suína Africana chega a um país, o risco do desaparecimento é de 30 a 40 por cento da produção. Por isso, seria bom que o Estado e os produtores levassem este assunto mais a sério.

Como perspetiva o papel da FILPORC no mercado das exportações?

A FILPORC é muito mais do que as exportações. A FILPORC tem de ser a entidade que defende toda a fileira da suinicultura. Acredito muito nesta estrutura, que vai ser de referência. A união entre produtores, matadouros e comércio tem de estar representada e temos de perceber que é fundamental estarmos de mãos dadas. Quem não perceber esta realidade dificilmente estará no mercado. Pelas exportações, pelo restabelecimento da imagem da fileira perante a opinião pública, pela defesa sanitária, pelo equilíbrio de forças no mercado, a FILPORC tem de estar sempre presente, com força e peso institucional.

O artigo foi publicado originalmente em FPAS.


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