O centenário do Parque Nacional da Peneda-Gerês, no dia do seu 50.º aniversário – Miguel Dantas da Gama

A Peneda-Gerês anda frequentemente nas bocas do mundo, mas raramente para sobre ele se tratarem as questões com cujo debate se reconheceria estarmos perante um verdadeiro parque nacional, a mais importante das áreas protegidas da rede nacional, que carece de projetos de preservação da natureza ao nível do que de melhor se faz na Europa.

O Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG) nasceu há cinquenta anos, pela mão de quem nele conferiu um conjunto de valores, principalmente naturais, que importava conservar. O conceito de parque nacional originário dos EUA (Yellowstone, 1872) implicava a sua adaptação a um território parcialmente habitado por comunidades humanas herdeiras de uma presença antiga, autora de um património cultural também valioso. Quem com ele sonhou, avançou ideias para que se convergisse num objetivo que teria que ser desejado e assumido pelas populações residentes. Foi-lhes apontado um papel participativo, decisivo para o alcance desse sonho.

Logo à partida reconheceram-se danos que importava enfrentar e corrigir. Meio século depois, estamos longe da meta desejada e os passos mais recentes apontam mesmo um afastamento do foi sonhado em 1971. Problemas de fundo mantiveram-se, o projeto afastou-se do carácter nacional que à nascença lhe foi atribuído. Perdeu autonomia, meios humanos e materiais. Ignorou-se o requisito maior que a natureza do PNPG impõe. Uma estratégia global para salvaguardar o seu território como um todo.

Para as próximas cinco décadas, tantas quantas as que o PNPG completa neste 8 de maio, enderecei esta semana aos seus órgãos gestores, uma extensa reflexão, que este artigo resume, na esperança de que o resultado esperado das medidas propostas possa ser apreciado no dia do centenário do nosso único parque nacional, em 2071. A natureza em geral, a do Parque Nacional em particular, requerem tempo para recuperar.

Conhecer para proteger

É um facto que só se valoriza e protege aquilo que se conhece. Mas tal principio não pode levar a que a usufruição do património se transforme no principal objetivo. O investimento deve concentrar-se na proteção e na recuperação do património, no restauro dos ecossistemas, das populações de flora e fauna e não no seu consumo. Tal pressupõe o reconhecimento de que o estado geral do Parque Nacional é de grande fragilidade. Por mais que encantem as paisagens belas do seu singular relevo serrano.

Impõem-se desde logo medidas que o protejam e reforcem o ordenamento do território nomeadamente restrições ao trânsito motorizado em vias que ameaçam espaços prioritários para a conservação da natureza. De entre elas destaca-se a necessidade de interditar definitivamente o trânsito motorizado na estrada da Geira Romana, um condicionamento eficaz nos acessos em torno do vale do Ramiscal e, nos períodos de maior pressão, entre as Portelas de Leonte e do Homem, com a tomada de medidas concertadas a partir da vila do Gerês ou mesmo da entrada do Parque em Rio Caldo. As cascatas do rio Homem e a mata de Albergaria não podem continuar sujeitas a uma pressão humana intolerável que viola a Área de Ambiente Natural e fragmenta a Área de Proteção Total.

A caça no Parque deve caminhar para a extinção. Até lá importa limitar o seu exercício aos que nele residem, também para uma melhor gestão do relacionamento entre a população e os predadores naturais. Algo semelhante se aplica ao pastoreio. Num futuro próximo o território do PNPG deve ser apenas usufruído pelo gado pertença de residentes, em condições que impeçam a violação das zonas naturais mais sensíveis. A preservação da natureza tem que

Miguel Dantas da Gama

Membro do Conselho Estratégico do Parque Nacional da Peneda-Gerês em representação das ONGA.

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